Marcelo Henrique: A arte de negociar (na vida)



A vida é um grande cenário em que interesses se perfilam e se contrapõem e os interlocutores (nós) de uma relação humana precisam valer-se do diálogo para avançarem no campo de seus interesses. Neste contexto, a negociação é o instrumento em que, diante das preferências distintas das partes envolvidas requerem a tomada de decisões conjuntas.

Os especialistas da Ciência da Administração costumam perfilar algumas características para o processo de negociação: 1) o envolvimento de, ao menos, duas partes; 2) a existência de manifesto conflito de interesses, em um ou mais tópicos ou temas; 3) o estabelecimento de um relação voluntária entre as partes, dentro do processo; 4) a tentativa de solução, entre as partes ou seus representantes, de um ou mais assuntos; e, 5) a apresentação de propostas ou demandas, de forma sequencial e não necessariamente simultâneas, com avaliações recíprocas, permitindo-se o surgimento de contrapropostas que serão analisadas e, ao final, se poderá ter um bom desfecho, em que se acham presentes algumas concessões.

O elemento preponderante é, tanto para indivíduos quanto para organizações, aprender a lidar com os conflitos, já que estes envolvem uma gama de desejos, de valores e/ou de necessidades, de uns e de outros. A negociação pressupõe a inexistência de qualquer hierarquia, naquele momento de tratativas, superando-se qualquer tendência de dominação e de supressão. Lembremos, ainda, que a relação, em uma negociação, é sempre horizontal e não vertical, em que as fases do processo permitem avanços e recuos, em nome do resultado e dos objetivos finais, com a consciência de que, nem sempre, tais objetivos, em totalidade, serão alcançados.

A negociação comporta um cenário com três características marcantes e inafastáveis:
a) a existência prévia de um conflito de interesses (entre o que uma e outra parte desejam);
b) a inexistência, até então, de parâmetros (regras e procedimentos) fixos voltados à resolução de conflitos; e,
c) o interesse por acordos, superando a luta aberta e evitando que uma autoridade (nomeada pelas partes ou judicialmente prevista), distante dos interesses em jogo, seja chamada a solucionar os conflitos.

Em uma negociação muitos pontos podem ser identificados e, por isso, o processo de comunicação nela embutido se caracteriza como complexo e dependente da percepção de cada uma das pessoas envolvidas. Na negociação é imperioso ouvir, e ouvir atentamente a outra parte, como, também, absorver as informações passadas. O ato de ouvir exige acurada reflexão, atitude de questionamento e poder de síntese em relação a tudo o que esteja acontecendo.

Retomando conceitos acadêmicos, altamente úteis e necessários para a vida social da atualidade, em distintos campos da atuação humana, desde a familiar até a empresarial ou da Gestão Pública, tem-se a chamada Gestão da Negociação, que comporta quatro etapas: Planejamento, Organização, Direção e Controle (PODC). Planejar é olhar para o futuro, antes dos eventos ocorrerem, para a visualização dos cenários, a definição dos objetivos e a análise das alternativas estratégicas. Organizar pressupõe a análise dos recursos existentes (humanos, materiais, financeiros, tempo) bem como a distribuição dos mesmos para alcançar os fins a que se destina. Dirigir é conduzir o processo com base na experiência adquirida, em que a motivação dos participantes é elemento essencial. Controlar, finalmente, é a etapa conclusiva, de verificação do que já foi executado, aferindo se os objetivos foram ou não alcançados, inclusive com efeitos em situações futuras.

Atributos como a competência do planejamento, o conhecimento do assunto a ser negociado, a habilidade para pensar clara e objetivamente, inclusive em situações de pressão e incerteza, além da qualidade na expressão verbal, do requisito de saber ouvir, da habilidade no julgamento das situações e da inteligência em fazer proposições, completam o quadro que pode resultar em um “final feliz”.

No curso do tempo e prevendo-se que, na vida, outras situações que são passíveis de negociação irão ocorrer, a experiência será sempre o melhor recurso, para o melhor equacionamento de situações similares. Considerando erros e acertos, a bagagem intelectual e a profissional são elementos importantes para encarar novas (ou similares) situações, prevendo-se melhores desfechos. A maturidade, derivada da participação em situações de negociação, gera o aperfeiçoamento da comunicação e a possibilidade de utilização de técnicas apreendidas nas experiências, podendo desembocar em resultados cada vez melhores.

Somente a experiência em negociações levam o indivíduo a ter um conhecimento melhor do aspecto humano, no que tange às emoções e a forma de comunicação, enquadrando melhor elementos como a sinergia, a empatia e a subjetividade, presentes naquele episódio, podendo delimitar com mais clareza e proveito os limites entre razão e emoção e as falhas comunicativas. Infere-se, disto, mais e mais aprendizados, que terão enorme validade para outras situações, pessoais ou profissionais, certamente.

Espera-se, em cada negociação, que o problema seja resolvido, os objetivos se configurem alcançados e a qualidade do relacionamento anterior reste preservada.
Por fim, a vida – e suas relações – se reveste de muitos aprendizados. A formação técnico-profissional é um elemento importante, mas nada substitui o conjunto das vivências, em qualquer ramo da existência. Profissionalmente, a formação se alia à experiência, e os fatos anteriores são importantes para as decisões futuras.

Que tal, então, começar a negociar, ao invés de impor seu pensamento e interesses?

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