Alegando foro íntimo, Renan nega assumir relatoria do caso Demóstenes

Senador tem pendências judiciais

Fernanda Krakovics- O Globo

Em uma sessão em que o acusado, Demóstenes Torres (sem partido-GO),  apareceu de surpresa, o Conselho de Ética do Senado viveu ontem uma  situação constrangedora: cinco senadores sorteados para a relatoria do  processo por quebra de decoro contra o parlamentar goiano recusaram a  tarefa. Após as negativas, o senador Humberto Costa (PT-PE) aceitou a  função. Apesar de ressaltar que respeitará o regimento do Senado e a  Constituição, o petista afirmou que o julgamento será político, e não  uma batalha jurídica.

Antes, o PMDB já havia se recusado a assumir  a presidência do conselho, o que lhe cabe por ser a maior bancada. O  senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) assumiu o cargo por ser o mais  velho e, enquanto estava como interino, decidiu aceitar o pedido do  PSOL e abrir o processo contra Demóstenes.

Usando seu domínio do  regimento interno do Senado e sua experiência de jurista, Demóstenes  questionou a legitimidade de Valadares, que não havia sido eleito.  Temendo uma posterior tentativa de anulação das decisões do conselho, os  senadores elegeram Valadares por 12 votos a favor e uma abstenção.

Após  semanas se escondendo, Demóstenes entrou no plenário do conselho com  aparência serena e sorridente; apertou a mão de cada um dos colegas,  embora não tenha encarado ninguém, de acordo com relato de senadores.

Em  poucas palavras, falando pela primeira vez desde o estouro das  denúncias, disse que é inocente e que se defenderá. Primeiro, por  escrito, no prazo de dez dias úteis, e durante o processo, fará  sustentação oral, no conselho:

– O que tem que ser feito  judicialmente será feito, mas aqui eu quero me defender no mérito. Quero  provar minha inocência no mérito. Até agora, não tive oportunidade de  me defender e o foro competente é esse. E eu o farei. Farei e provarei  que sou inocente.

Dos cinco senadores sorteados para assumir a  relatoria e que recusaram a tarefa, três têm pendências judiciais: RenanCalheiros (PMDB-AL), Romero Jucá (PMDB-RR) e Gim Argello (PTB-DF). O  cargo de relator do Conselho de Ética é considerado uma vidraça e também  uma função espinhosa.

O primeiro sorteado foi Lobão Filho (PMDB-MA), que está no exterior, mas seu líder, Renan, se apressou em defendê-lo:

– O senador Lobão Filho pediu para dizer, nessa hipótese (de ser sorteado), ele não quer, não aceita, declina.

O segundo escolhido ao acaso foi o líder do PTB, Gim Argello:

–  Por questão de foro íntimo, eu declino – reagiu, de imediato,  explicando mais tarde que teve embates com Demóstenes no passado e, na  sua opinião, não faria sentido julgá-lo agora, e ainda fazendo chiste: –  Prêmio de loteria eu não ganho!.

Na sequência, Ciro Nogueira  (PTB-PI), que não estava presente, foi escolhido relator. Contatado por  telefone, disse que não aceitava.

O sorteado seguinte foi Jucá, que também foi rápido na recusa, com o mesmo argumento de teve muitos embates com Demóstenes:

– Por questão de foro íntimo, eu declino. Eu me bati com ele o tempo todo. Poderia parecer retaliação.

Depois,  foi a vez de Renan, que repetiu o batido “por questão de foro íntimo,  eu declino”, alegando depois que também teve muitos enfrentamentos com  Demóstenes durante os processos que ele próprio enfrentou, por quebra de  decoro.

Finalmente o nome do petista Humberto Costa (PE) foi sorteado e aceitou a relatoria, minimizando a recusa de cinco colegas:

–  São pessoas que tiveram algum tipo de enfrentamento (com Demóstenes) e  qualquer atitude poderia ser encarada como retaliação. Outros, por  constrangimento.

O presidente do conselho afirmou que o colegiado agirá com seriedade, mas sem perseguição.

–  Aqui não é um tribunal inquisitório e o presidente nem o relator podem  ser considerados carrascos – afirmou Valadares. – Há um clima de total  frieza, constrangimento e decepção, uma vez que (Demóstenes) era uma das  figuras mais proeminentes do Senado, um homem acima de qualquer  suspeita.

Relator deixou ministério

em meio a escândalo

Ministro  da Saúde no governo Lula, Humberto Costa deixou o cargo em meio ao  escândalo da máfia dos vampiros, que desviou cerca de R$ 2 bilhões na  compra de remédios superfaturados. Acusado de formação de quadrilha e  corrupção passiva, foi absolvido pelo Tribunal Regional Federal da 5  Região por falta de provas.

Ex-líder do PT no Senado, Costa foi  cotado para concorrer à prefeitura do Recife, mas o partido lançou o  deputado licenciado Maurício Rands, que disputará prévias com o  prefeito, João da Costa, também petista.

O presidente do Conselho de Ética, pediu serenidade ao petista na elaboração de seu parecer sobre Demóstenes:

– O ser humano merece respeito, mesmo que tenha se desviado na conduta pública.

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