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Othoniel Pinheiro: Cultura empreendedora e um Brasil na direção do precipício

Othoniel Pinheiro- professor de Direito Constitucional

Ontem, na Rádio CBN nacional, ouvi um comentarista dizendo que o futuro do Brasil é a existência de trabalhos e não de empregos.

A afirmação foi elogiada e incentiva por outros interlocutores em uma mesa redonda que, com sua retórica e sem um contraponto, conseguia passar para os ouvintes que tal ideia seria ótima para o Brasil.

Afirmava também que o mundo seria do empreendedorismo.

Cheguei à conclusão de que realmente estamos em perigo, uma vez que se trata de um claro sinal que o golpe perpetrado por setores do financismo e da economia privada internacional pode ainda ser muito pior no Brasil.

Em primeiro lugar, quero deixar claro que o incentivo ao empreendedorismo, especialmente na classe mais economicamente pobre da população, é salutar, ou melhor, indispensável para o Brasil.

Porém, daí a propagar a ideia de que o Brasil deve ser um país exclusivo de empreendedores, com a não existência de empregos formais é embarcar numa furada.

Não fico apenas na afirmação.

Faço questão de explicar.

O direito do trabalho surgiu no bojo do constitucionalismo social justamente por que o mundo percebeu a falência de uma sociedade que somente considerava a existência de trabalhos e não de empregos. Isso se deu, inicial e timidamente, com a Constituição da França de 1848, e com mais ênfase nas Constituições do México de 1917 e de Weimar (Alemanha) em 1919.

No Brasil, o direito do trabalho chegou gestado pela Revolução de 1930, liderada por Getúlio Vargas, que empurrou também o voto secreto, o voto das mulheres e a Justiça Eleitoral em seus inimigos políticos: a elite paulista e o coronelismo.

Essa turma (a elite paulista e a cultura dos coroneis) jamais engoliu o direito do trabalho, o voto democrático, o voto secreto e o feminismo.

Então, já se pode perceber que a ideia de tornar todos os brasileiros empreendedores com a extinção de empregos formais encobre interesses nada republicanos e vai fazer a sociedade brasileira retroceder pelo menos um século no processo civilizatório.

Fico a imaginar como seria o cortador de cana empreendedor, o empregado doméstico empreendedor, o vigilante empreendedor, o cobrador de ônibus empreendedor etc etc etc.

Ou seja, as reformas estão dando sinal de que serão ainda mais ousadas, pois trabalhar em empresas passa agora a ser empreendendorismo com a total extinção de qualquer garantia de salário mínimo, jornada diária, férias, segurança jurídica etc.

A história e a realidade atual mostram a injustiça social provocada por esse cenário que, em curto prazo, irá afundar toda a economia brasileira, uma vez que concentrará ainda mais a riqueza nas mãos de poucos e o próprio capital pagará um preço muito caro por isso.

Esse cenário também é ruim para o pequeno e médio empresário, que está seduzido pelas retóricas que apontam soluções fáceis e rápidas para problemas complexos que, em verdade, em curto prazo, afundará toda uma economia nacional, levanto ele junto para o buraco.

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