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Mulheres de lágrimas a sorrisos

Me saltam aos olhos outros rostos. Olhares distantes. Diferentes e tão iguais aos meus. Minhas ancestrais.

Sem direito ao corpo, dele retirado o gozo e a escolha.

Sem direito ao sonho, dormindo e acordando para cuidar do mundo.

Carregando em si as dores da vida.

Choramos juntas nas esquinas do tempo. Violadas na carne, no sentir, no querer. Mortas pelo ódio, pelo mando da força.

Nós mulheres, choramos lágrimas iguais neste rio sem fim.

Não subir na goiabeira, nem brincar na gangorra! Desde cedo carregando a responsabilidade de cruzar as pernas, de fechar a descoberta, de obedecer ao dono.

Amarrando um fiapo de pano para esconder os seios indesejados, para adiar as brincadeiras libidinosas dos adultos encarniçados. Menina-mulher sem bonecas. Promessa de brincadeiras vivas, choronas, famintas, encerrando ciclos incompletos de nossas vidas. Seguem lágrimas iguais em rostos sem fim de mulheres!

Estupros sempre temidos. Olhares direcionados, e as partes íntimas sempre definidoras de trajetos, no risco do sexo, o medo do julgador, entre poucos encontros furtivos com um príncipe escrito à mão nas seculares vias de manipulação dos destinos femininos. O homem solucionador de solidões e gerador de traumas pode ser o porto das agonias ou o finalizador de todas elas. Por isso choramos nós, mulheres ontológicas, as mesmas infinitas lágrimas!

Mesmo o macho moderno não quis aprender respeito. Não fez a lição direito e vomitou a rejeição. Matou quem lhe fez carinho. Com tiro, faca ou espinho, foi somente um passarinho na gaiola do poder aquela que lhe amou, diminuiu suas febres, mas não apagou a brasa que o machismo inflamou. Nos rostos destas mulheres as lágrimas são muito iguais nestas histórias sem fim.

Corpo que dói, que contorce. Mulher-menina assustada, primeira menstruação é ciclo de imposição que a meninice rechaça. Mas se não colocar o absorvente entre as pernas  o sangue escorre e o circo se monta, descredenciando com adjetivos perversos a maturação dos destinos do mundo. Chorar tem sido recurso de silêncio que todas nós mulheres um dia conhecemos com promessa de infinitude!

Que se encerre a complacência!

Que se quebre a paciência!

Que enxugue a lágrima secular e neste lugar sagrado seja o sorriso erguido!

Nós mulheres somos todas auroras de liberdade e nossos corpos são matérias da nossa própria integralidade.

Nesta luta nossos sorrisos são irmãos na infinita assunção do que somos.

 

 

SOBRE O AUTOR

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