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‘Atual direção da Adufal ajudou a derrotar Valéria na Ufal’. Aliado de reitora abre o jogo e mira comando de sindicato

Tiago Zurck, 39, é duro ao se referir à atual direção da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Alagoas (Adufal): “A diretoria ajudou na derrota de Valéria nas eleições da Ufal”.

Valéria Correia, atual reitora, foi a mais votada há 4 anos atrás na disputa pelo comando da maior universidade pública de Alagoas, com o terceiro maior orçamento no Estado. Valéria derrotou Rachel Rocha, apoiada pelo então reitor Eurico Lôbo e Ana Dayse Dórea, ex-reitora e atual secretária municipal de Educação na capital alagoana.

Apoiada pela esquerda, ela assumiu com a esperança de dar uma guinada na gestão da universidade. Em 2019, porém, ao disputar a reeleição, ficou em segundo lugar na consulta pública, perdendo para Josealdo Tonholo, apoiado por Rachel Rocha e Ana Dayse.

Em março, a direção da Adufal pediu a prisão de Valéria Correia. Motivo é que ela não estaria respeitando que determinava o pagamento de rubricas judiciais aos professores da universidade.

Sindicatos ligados à universidade reagiram, chamando o pedido da Adufal de “desproporcional” e “descabido”. Após repercussão, a associação recuou no pedido, responsabilizando os advogados da entidade sindical que, segundo a direção, “agiram à revelia”.

Tiago, que é assessor de gabinete de Valéria, procurador Educacional Institucional e coordenador do 1º processo de recredenciamento da Ufal que resultou no conceito 4 da universidade, é o principal nome de Valéria para a disputa das eleições na diretoria da Adufal, que acontecem nos dias 21 e 22 de novembro.

Vai enfrentar Jailton de Souza Lira, que disputa a reeleição.

Ele nega que a escolha esteja ligada a revanchismo. ” Ao contrário, há um histórico de debates no âmbito do movimento docente na UFAL, mais recentemente a partir de 2010 e que toma corpo com a histórica greve das federais de 2012″.

Com a palavra, o professor do Centro de Educação da universidade, formado em História, com mestrado e doutorado em Politica e Planejamento Educacional.

Você entra na disputa como oposição à atual presidência da Adufal. Nas eleições para reitor da universidade, integrantes da diretoria do sindicato votaram em Josealdo Tonholo e você fez campanha para Valéria Correia. Sua decisão em disputar as eleições na Adufal é revanchismo?

Primeiro, é importante esclarecer que não há decisão sobre a disputa da direção da ADUFAL.

Talvez, meu nome circule no debate em razão de ter sido diretor do ANDES-SN, ter participado de composição de chapa, encabeçando-a, quando disputamos por duas vezes a direção da ADUFAL e por ser um professor que sempre estive atuante nas discussões da pauta docente na universidade.

Também é importante dizer que hoje estou contribuindo na gestão da universidade junto à professora Valéria e que, com satisfação, apesar das agruras e das contradições que o espaço nos coloca e do momento histórico que passamos, temos colaborado para implementar parte da agenda do movimento docente, especialmente a que foi construída no documento da greve de 2012, quando estudantes, docentes e técnicos da universidade apresentaram uma pauta local ao então reitor, mas que foi desconsiderada.

Quanto à definição sobre composição de chapa e disputa, isso é, antes de tudo, um debate coletivo.

Esclarecido isso, digo que, caso esteja na disputa das eleições da ADUFAL, não será por revanchismo.

Ao contrário, há um histórico de debates no âmbito do movimento docente na UFAL, mais recentemente a partir de 2010 e que toma corpo com a histórica greve das federais de 2012.

Tal debate problematiza o papel do sindicato e sua forma de atuação junto às pautas, às lutas e à organização da categoria na UFAL, bem como a atuação e articulação com os movimentos da classe trabalhadora.

Esse debate, do qual compartilho, tem a leitura de que o sindicato deve ter como sua principal bandeira a luta na defesa das pautas do trabalhador e a organização e formação política de sua base; nesse sentido, as direções devem ter suas atuações na construção desse modelo de sindicato.

A leitura que parte da categoria docente na UFAL tem é a de que, contraditoriamente, o grupo que há décadas dirige a ADUFAL com mudanças aqui e ali tem se prestado a construir um modelo de sindicato que não é de lutas e organização da categoria para os momentos de enfretamentos; na nossa leitura esse tipo de sindicalismo contribui, localmente, ainda mais para a desmobilização docente.

Disputar ou não as eleições da ADUFAL não retira a crítica que temos feito ao grupo político que tem dirigido localmente nosso sindicato.

A atual composição da Adufal chegou a pedir a prisão da reitora. A atual direção da Adufal ajudou na derrota de Valéria nas eleições da Ufal?

De imediato, respondo à pergunta dizendo que sim! A diretoria ajudou na derrota de Valéria nas eleições da UFAL.

Dito isso, início dizendo que estamos numa conjuntura totalmente diferente de outras da nova república.

Em 2018, por exemplo, o país elegeu um presidente que tinha um discurso fascista e e que prometia cortes e reformas contra a classe trabalhadora.

Embora já tenhamos passado por momentos difíceis, essa é uma conjuntura, radicalmente, de desmonte dos serviços públicos, com uma agenda ultraconservadora que avança, não apenas contra o orçamento das universidades, contra direitos, mas, inclusive, com perseguição ideológica aos servidores e reitores das universidades.

Como parte da estratégia, o ataque é, também, a quem constrói e faz funcionar tais serviços: os servidores.

O episódio do pedido de prisão da reitora tem relação direta com essa conjuntura.

No caso das rubricas salariais que culminou com o pedido de prisão de uma reitora de esquerda, eu preciso ratificar o papel dos sindicatos na defesa intransigente dos trabalhadores.

Como disse anteriormente, sindicato é para lutar! Portanto, não tenho qualquer questionamento e discordância sobre o papel do sindicato na luta pela garantia da manutenção das rubricas dos professores servidores diretamente atingidos, especialmente nas incursões jurídicas que precisou adotar, salvo quanto ao pedido de prisão.

Numa conjuntura de ataques à imagem das universidades públicas, de desqualificação dos professores, técnicos, estudantes e gestores das universidades e de cruzadas constantes contra a esquerda e às pautas progressistas, o pedido de prisão de uma reitora de esquerda foi o ápice do descalabro da atuação da direção do sindicato, tanto é que a diretoria, de certa forma, recuou com a repercussão que o caso tomou nacional e localmente, incluindo as críticas de professores da base de apoio da própria direção.

Curiosamente, não foi a direita quem pediu a prisão de uma reitora de esquerda, mas, contraditoriamente, uma parte da esquerda na UFAL.

Minha leitura é de que a direção da ADUFAL, estrategicamente, buscou um “bode expiatório”, mirando as eleições locais para a reitoria na UFAL.

Não é de desconhecimento da universidade e parte daqueles que acompanham o debate político na UFAL que membros da diretoria integram a base de apoio do grupo que é oposição à gestão atual da universidade e que ganhou as eleições.

Até então, nada contra, são docentes tanto quanto eu e têm o direito e a liberdade de atuação política nas pautas e organização dos grupos na universidade; a discordância é quando a luta pela defesa dos direitos dos trabalhadores passou a ser, no sindicato, instrumento da oposição para as eleições da UFAL.

Um episódio, dentre vários, para mim é emblemático: quando a direção reuniu os ex-reitores em sua sede e redigiram uma carta que, para simplificar, “colocava nas mãos da reitora a tesoura” e a opção de cortar ou não as rubricas.

E por que emblemático? Porque mesmo diante dessa conjuntura de ataques, cortes, bloqueio orçamentário, intervenções nas universidades, ameaças de paralisação de serviços, os ex-reitores, junto com a ADUFAL, nunca vieram a público manifestar à sociedade alagoana a defesa da universidade pública, gratuita e democrática.

A direção abriu mão de fazer o franco debate junto à categoria sobre a conjuntura, construindo a narrativa de que a culpa pela retirada dos direitos não era do TCU, mas da reitora (de esquerda) da UFAL.

A estratégia política adotada resultou em uma despolitização eficaz da categoria; construiu uma representação social de referência de que era a reitora a mão de tesoura e inimiga dos servidores e não os governos que estão em cruzada permanente contra direitos dos servidores; deslocou um debate nacional e o isolou localmente fazendo o caso das rubricas uma “bolha”.

De quebra, também, contribuiu para o fortalecimento do discurso da direita na UFAL contra a reitora de esquerda.

O fato é que a retirada das rubricas, mesmo com suas especificidades, nunca foi uma questão local, mas nacional.

Se eu não estiver correto, o próximo reitor eleito poderá restituir, imediatamente, as rubricas dos servidores.

Essa leitura não é de criminalização do sindicato, mas de crítica à estratégia política que a direção adotou. Em todas as universidades onde aconteceu o episódio de retiradas das rubricas, até mesmo onde as direções eram oposição à gestão, como no caso da AdUFRJ, a estratégia política foi outra: foi a de politizar a base, trazendo o real debate sobre a incursão do TCU sobre os direitos historicamente já garantidos.

E vale lembrar que, com exceção da UnB, todas as demais universidades federais já perderam essas rubricas.

Mais tentativas de desmontes estão em pauta; as estratégias do governo estão sendo anunciadas.

Por isso, é fundamental termos uma direção que atue para dentro (UFAL) e para fora (conjunto dos instrumentos da classe).

Nacionalmente, conversando com colegas do movimento docente, há a observação de uma desmotivação ainda maior da categoria; as exceções são nas universidades, onde as direções dos sindicatos têm um histórico de formação política, de diálogo e organização dos docentes.

As chamadas da Assembleia sem quórum, atividades realizadas sem a presença em massa da categoria são indicadores que reforçam a tese de que a ADUFAL precisa de uma direção que atue para reverter a desmobilização e organize a categoria para os momentos mais duros que teremos pela frente.

As diretorias são eleitas para dar direção.

Temos que apoiar todas as lutas empreendidas pelos sindicatos contra a retirada de direitos, mas não podemos acordar com ações e estratégias que culminam com a despolitização, com o “meio debate” e diretorias que atuam, através de suas narrativas e estratégias, para desmobilizar a categoria por interesses outros.

Na atual conjuntura, de ataques, avanço da narrativa conservadora, um sindicato forte se faz com base forte, organizada; com ações de luta, não pontuais e “burocráticas”, mas cotidianas, GTs em funcionamento, mobilizações constantes na universidade, trabalho de base.

Infelizmente isso, ainda, na história recente, não experimentamos no movimento docente da UFAL.

A vitória de Valéria foi bastante festejada porque significava a ascensão da esquerda no comando do segundo maior orçamento público em Alagoas, o da Ufal. Onde ela acertou e errou na gestão?

A UFAL, como disse, não é uma bolha, as rubricas, os cortes de bolsas de pesquisas, o aprofundamento da precarização das condições de trabalho e do estudo na UFAL são uma realidade, sobretudo nos espaços onde o processo de expansão não se efetivou nas condições ideais e, ainda, está por se consolidar.

Manter a UFAL com os serviços funcionando; ter ampliado a assistência estudantil, quando o número de entrada de estudantes com vulnerabilidade social aumentou, graças ao recém processo de democratização do ensino superior; colocar a UFAL no debate nacional de pautas progressistas, como contra a lei da escola “livre (?)”; ter levado ao CONSUNI posições críticas contra os cortes, a favor do Estado democrático de direito; ter aprovado resoluções, como a do uso do nome social, cotas na pós-graduação, etc.; ter desenvolvido ações que resultaram na retomada dos indicadores de qualidade da UFAL, culminando com a inclusão da universidade no ranking internacional, nessa dura conjuntura, são indicadores que considero acertados.

Onde errou?

Na medida em que não conseguiu ampliar a base de apoio dela. Mas, em boa medida, considero que isso foi resultante, também, do conservadorismo da universidade, muito ao contrário do modo como o governo aponta, como sendo as universidades um espaço para abrigo do “esquerdismo.”

O Andes diz que o “Governo Bolsonaro trata universidades como inimigas”. Qual a opinião sobre a atual política do Ministério da Educação?

Não tem como discordar da direção do sindicato nacional, o ANDES.

Desde que o atual governo assumiu o Planalto, sua cruzada tem sido de tentativa de deslegitimar, desmontar as universidades e a pesquisa no país. É uma cruzada pelo não-conhecimento e antidemocrática.

No caso da educação pública, a pauta é: desmonte da universidade e das escolas públicas como a construímos e a conhecemos.

Para isso são utilizadas diversas estratégias: desqualificação das universidades e dos pesquisadores; asfixiamento financeiro do orçamento das universidades e da pesquisa no país; retirada de direitos, mirando os salários de quem faz funcionar os serviços públicos e perseguição ideológica às pautas progressistas e críticas existentes historicamente nas universidades.

É a combinação da agenda econômica ultraliberal com a política-ideológica ultraconservadora.

E o mais grave: uma agenda estreita que não dialoga com o conjunto da comunidade educacional, que é diversa.

Na busca de objetivação dessa agenda, o MEC usa do espaço de poder que ocupa no anseio de construir consensos na sociedade de que as universidades são “antro de esquerdismo” e promoção de “balbúrdias”, com “pessoas nuas” andando pela universidade e “fumando baseado”.

A questão é que o MEC não consegue trazer dados, números que reforcem sua posição ideológica, até porque eles não existem.

Os dados mostram o contrário: as universidades públicas no Brasil são responsáveis pela produção da pesquisa no país, pela formação qualificada dos jovens que por elas passam; são nas universidades públicas que estão os quadros mais qualificados e com compromisso ético-político com a sociedade e a produção do conhecimento que busca soluções para os nossos problemas.

Os indicadores atestam que as melhores universidades do Brasil são públicas.

Isso mostra que as universidades têm correspondido com sua função social no ensino, na pesquisa e na extensão.

São diversas estratégias que o governo tem adotado. Cito algumas delas: mais recentemente, o MEC mirou os professores querendo construir um consenso de que nós somos “zebra gorda”.

Na agenda do governo, os principais agentes na contribuição da transformação de um país quanto à educação são, para o MEC, “inimigos”, portanto, eles devem ter seus salários cortados/reduzidos. Mais uma vez, o governo busca construir falsos consensos na população: “o professor é um preguiçoso que ganha 15 mil e só trabalha 8h”.

Ao contrário, o professor universitário para ganhar 15 mil já está caminhando para o final de sua carreira; precisa ter se qualificado e estudado em média 6, 7 anos para obter mestrado e doutorado, além da graduação; não pode ter outro emprego, pois ele tem que se dedicar exclusivamente à universidade; precisa desenvolver diversas ações no ensino – que não é só aula – é planejamento de aulas, correção de provas, orientação de TCC, iniciação científica, dissertações de mestrado e teses de doutorado; participação em colegiados de cursos, em comissões permanentes ou provisórias de avaliação; elabora projetos e relatórios de pesquisa e extensão; escreve artigos, resultados de suas pesquisas e os publica, etc.

Outra estratégia do MEC para implementar o seu projeto de educação é o recém “Future-se”.

O programa, apresentado pelo governo, sem nenhum diálogo com a comunidade universitária, além de apresentar aspectos inconstitucionais, é uma clara tentativa de desmonte completo da autonomia financeira e administrativa das universidades.

A única novidade do programa é essa, porque empreendedorismo, internacionalização, parcerias público-privado, captação de recursos as universidades já fazem.

Por último, na educação básica, a incursão do MEC para implementar o seu programa são as escolas cívicos militares.

Para o governo, a escola pública (espaço democrático) não serve! A salvação é um modelo onde as crianças tenham uma formação militarizada e que vai resolver o problema da violência nas escolas públicas e trazer “qualidade”. Nesse sentido, as escolas deverão estar sob uma concepção do controle da lógica policial e penal com regras e limites.

O curioso aqui é apontar que esse modelo não é para todas as escolas, mas apenas para as escolas públicas, que formam os filhos da classe trabalhadora, portanto os mais pobres.

As escolas privadas, que formam a classe média e rica do Brasil, não precisam desse modelo de escola.

Em todos esses casos citados e outros, mais uma vez, mostram a necessidade de que os sindicatos atuem no processo de formação política da base.

Sem a discussão crítica sobre o que está acontecendo, corremos o risco de ficarmos isolados na micro política e com a sensação de que nada pode ser feito.

Já passou do tempo de organizar a categoria e articulá-la aos demais espaços de luta da classe para os enfrentamentos presentes e futuros que precisamos fazer.

2 respostas

  1. A chapa que venceu as eleições para a reitoria terá que superar os números da gestão Valéria se quiser fazer uma gestão melhor. E não poderá colocar a culpa na falta de recursos, pois, a gestão Valéria fez mais que todas as outras durante a diminuição, bloqueio e descongestionamento de recursos. Nisso consiste a traição da atual diretoria da adufal, colocou o projeto carreirista de alguns membros acima dos interesses da universidade, e vai prejudicar a sua base. Provavelmente essa atual diretoria ganhe de novo porque está praticando o assistencialismo para cooptar os aposentados e uns poucos da ativa que aceitam essa situação.

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