Terrores desterrados

Droga mesmo é acreditar que tudo isso é efeito apenas do uso de drogas

Ana Cláudia Laurindo- Cientista Social

Estarei sempre no meio, jamais na margem ou no muro, porque conheço o gosto amargo de ver e não poder registrar, saber e não poder acusar, entender e ter a paciência de dosar, para não acelerar a força da violência institucionalizada que se veste de branco, como os túmulos aos quais se referiu um certo Galileu que dividiu a história.

Sim, há algo mais do que os olhos alcançam, atuando celeremente em nossa mortífera sociedade alagoana, como a frase de Hamlet, afirmando que “há algo de podre no reino da Dinamarca”, poderia nos fazer pensar.

Contudo, o jeito prático de resolver assuntos desagradáveis fica por conta da imprensa também prática que temos. Os vencidos viram cadáveres! Os vencedores viram doutores! Simples assim, como se os conglomerados rurais e urbanos não fossem compostos por vidas humanas, a lhes qualificar.

Como essas vidas não representassem também as cifras que se deslocam de cofre a cofre na parafernália socioeconômica que justifica tudo; desde as representações legitimadas ao crime encoberto e a pena simplificada. O Estado não poderia justificar a si mesmo sem sociedade.

Assim sendo, para além das ideologias humanistas das quais comungo, existem razões de ordem prática para se valorizar e prezar pela vida humana em todas as sociedades.

Quando a morte estampa a página espúria da notícia banalizante, na qual a polícia contaminada pelo descaso do poder tem voz, o alerta volta a soar: Alagoas continua matando seu futuro!

Não importa se alguém falou que a causa de todas as mortes está no uso de drogas. A visão precisa focar a má qualidade de vida da nossa população. As moradias desumanizantes, construídas com detritos sobre outras tantas sobras. Qual é a política de habitação que existe aqui?

Além de não existir escola para todas as crianças, as que existem estão caindo sobre as suas cabeças. Qual política educacional séria existe aqui?

O grande produtor de miseráveis precisa elaborar e efetivar estratégias de assistência, para muito além de usar a máquina pública para empregar indicados. Qual política de assistência existe aqui?

Sem moradia, educação, assistência, como ter saúde? Sem conseguir sobreviver aos infelizes índices, que de tão divulgados foram banalizados pela ausência de efeitos, como vencer ou ser doutor em Alagoas?

O abismo geralmente tem boca larga, a tudo traga. A violência que nos assola é abissal; cada vez menos sobreviveremos. E tudo está intimamente relacionado à ausência de políticas públicas, seriedade dos órgãos de controle e eficácia dos poderes constituídos.

Droga mesmo é acreditar que tudo isso é efeito apenas do uso de drogas!

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