Por que o Vera Arruda virou o corredor da discórdia?

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E abriu um debate sobre uma cidade que se recusa a discutir um novo plano diretor

A questão do trânsito e da mobilidade urbana na capital é um recorte estrutural do que ocorre em uma lógica de infraestrutura neoliberal, com o enfoque de um controverso “pragmatismo” urbano onde mais vale a circulação de mercadorias e serviços que qualidade de vida e locais de convívio social.

A Prefeitura de Maceió anunciou na manhã desta quinta-feira (23) as possíveis intervenções que serão realizadas no Corredor Vera Arruda, no bairro da Jatiúca.

Os moradores e frequentadores do Corredor estão se opondo às mudanças propostas pela Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito (SMTT).

A decisão é autoritária. A SMTT abriu consulta pública sobre o assunto e mesmo antes do resultado sobre o que pensa a população, avisou quais ruas serão abertas atravessando de um lado a outro o Corredor.

A solução é paliativa. Problemas estruturais são evidência de que a decisão é “chover no molhado”. Na realidade, qualquer um prefere a locomoção via carro ao invés de utilizar um transporte público sem qualidade, desconfortável e, na maioria das vezes, lotado.

Uma escolha diretamente proporcional: mais carros, mais dificuldades no trânsito e isso em uma cidade que precisa atualizar seu plano diretor à beira dos 20 anos.

Decisões deste tipo só demonstram que a racionalidade por trás delas está em gestores que tratam a cidade como uma empresa pessoal, onde bairros viram setores de investimento. Aqui vale a metáfora da política pública do “como fazer reforma em casa”, que acaba se sobrepondo ao diálogo com a população.

Comparada a Recife (PE), Maceió é uma capital com menos opções de transporte público. Em 2020, mais de um quarto da população utilizava transporte público para se locomover pela cidade. O meio de transporte mais utilizado é o ônibus, diz pesquisa da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Segundo informou a SMTT de Maceió, em média, 240 mil passageiros utilizam diariamente os ônibus do Sistema Integrado de Mobilidade de Maceió (SIMM).

Aqui não há metrô e a malha ferroviária do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) não alcança regiões onde o fluxo de pessoas é maior, pois utiliza uma estrutura do século 19 quando nem de longe se pensava na explosão demográfica acompanhada de desorganização ao se ocupar espaços.

Há 200 anos atrás, Maceió era uma pequena província. Uma outra cidade e uma massa de trabalhadores circulando de forma bastante diferente deste século 21.

A capital cresceu, os bairros mais populosos mudaram sua localidade e ainda temos o desastre do afundamento do solo causado pela ação da BRASKEM que obrigou o deslocamento de milhares de pessoas e também mexeu nas linhas do VLT.

O prefeito JHC (PL) esteve com o Superintendente de Trens Urbanos em Maceió, Carlos Jorge, em 2021. Na ocasião foi discutido um projeto para aumentar a malha ferroviária do VLT. A intenção era que o veículo chegasse ao Maceió Shopping.

Na época, o prefeito disse que “a mobilidade urbana é um assunto urgente. Por isso, é tão importante esse contato. A CBTU nos apresentou uma proposta de expansão da malha ferroviária até o Maceió Shopping e, no futuro, a parte alta da cidade. Ela terá 3 novas estações, garantindo acesso de mais 40 mil passageiros, gerando emprego e renda. Algo muito importante para Maceió”.

O projeto, no entanto, ainda não saiu do papel. Aliás, nunca saiu porque esta ideia sempre embalou a classe política principalmente nas campanhas eleitorais.

E ela não parece exequível. Quando Benedito de Lira era senador, ele também era ‘dono’ das indicações na CBTU nacional. Também prometeu um VLT cortando a cidade, passando na frente do Maceió Shopping e até um modelo férreo subindo para o Tabuleiro dos Martins, primeiro rasgando o Vale do Reginaldo pelo extinto prédio da escola municipal Maria José Carrascosa, no bairro do Poço.

Como esta proposta era absurda (afinal para onde seriam realocados os 40 mil moradores do Reginaldo?), defendeu um trem saindo da praça do Centenário pelo canteiro da avenida Fernandes Lima até o Aeroporto.

Bastava derrubar a escola estadual Tavares Bastos. Sorte que ela permanece de pé. E e VLT fantasma virou anedotário local.

Estrutural

O problema urgente na mobilidade urbana permanece. A questão é estrutural e por isso difícil de se resolver. A abertura de mais vias, neste caso, é uma solução simplista.

Enquanto isso, as empresas de ônibus lucram sobre o mal-estar generalizado de trabalhadores e trabalhadoras. Será que melhorar as opções de transportes coletivos e investir em qualidade é impossível aos sonhos neoliberais?

Entre canetadas e tecnicismos puros e simples, os espaços públicos seguem sendo invadidos e deixam de lado todo e qualquer afeto humano pelo lugar. O espaço público é das pessoas e por ser das pessoas é necessário considerá-las na integralidade de seus aspectos.

A praça não é um cenário “sem serventia” é onde se desenvolvem relações sociais, onde se estabelecem modos de sociabilidades saudáveis longe do trabalho. A praça tem um potencial de produzir saúde mental e física, onde monumentos e simbolismos sociais recheiam o ambiente daquilo que compõe a subjetividade de quem vive e dá funcionalidade ao lugar.

Procurada pelo Repórter Nordeste, a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) de Maceió explicou o projeto de expansão do VLT. Confira a nota na íntegra:

Sobre o projeto de expansão do VLT até o bairro de Mangabeiras, o qual inclui um acréscimo de 3,7 km de nova malha ferroviária, e três novas estações, a CBTU – Companhia Brasileira de Trens Urbanos de Maceió informa que esta proposta faz parte de uma estratégia maior que envolve a criação de um grande anel ferroviário, atendendo a toda a região de Maceió.

O projeto de expansão até o Maceió Shopping foi concluído e está como proposta no processo judicial no qual a CBTU está reivindicando da mineradora Braskem compensação pelos danos causados para a operação da ferrovia com o afundamento de bairros, o que gerou sérios problemas ao usuários de trem com a interrupção da circulação do VLT na região do Mutange, em Bebedouro, uma das áreas afetadas pela destruição do solo em cinco bairros de Maceió, de responsabilidade da referida mineradora.

Maceió, 24 de março de 2023.
Superintendência de Trens Urbanos de Maceió

2 respostas

  1. Alguns poucos moradores do bairro Jatíuca estão querendo barrar um projeto de melhoria do trânsito de Maceió dizendo que o Corredor Vera Arruda é o coração de Maceió. Comparam até com Central Park de New York. Menos gente. Bem menos. Baixem a bolinha. Esses poucos moradores não compraram a área verde do Loteamento. Compraram frações ideais correspondentes aos apartamentos onde vivem. Pensem na cidade e não apenas em um lugar que serve para cachorros fazerem cocô e xixi.

  2. A província de Maceió continua se mostrando como a cidade do atraso. Enquanto o Mundo investe em espaços públicos de qualidade (leia-se Noruega, Dinamarca, Holanda…), reduzindo o fluxo de automóveis em suas cidades, Maceió segue o caminho inverso. Pior! Com projetos antidemocráticos que o prefeito JHC tenta nos enfiar goela abaixo, baseados no achismo e na mediocridade do seu secretariado. #NãoMexamNoVeraArruda

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