O caráter machista e misógino da proposta da reforma da Previdência

Flor de Mandacaru

O governo e sua equipe está veiculando na mídia a ideia de justiça por trás da atual proposta de reforma da previdência. Como se, sendo aprovada, ela fosse finalmente, fazer justiça para esse sistema previdenciário tão desigual.

O que o governo, sua equipe e a mídia não dizem, no entanto, é que, a reforma da previdência, se aprovada, não apenas, não acabará com a desigualdade, como ainda, aprofundará o abismo que existe no âmbito da questão de gênero. Não me refiro, ao fato de, as mulheres terem, no mínimo, uma dupla jornada em relação aos homens, mas àquele que é o grande apelo feito pelo governo para convencer a população a aceitar sua proposta: “para atender à questão de gênero, a idade mínima para os homens será de 65 anos, e para as mulheres de 62 anos”.

À primeira vista, parece que o governo está sendo bastante benevolente, apoiando um clamor do movimento feminista, afinal manteve a diferença de gênero para a idade mínima para homens e mulheres. No entanto, não é preciso ser especialista em previdência para que se perceba a grande falácia deste discurso, pois, basta um rápido olhar sobre os números para que se constate o contrário, a saber:

IDADE MÍNIMA

COMO É
MULHERES 60 anos de idade; 30 anos de contribuição HOMENS 65 anos de idade; 35 anos de contribuição

COMO SERÁ
(ACABA O TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO) 62 anos de idade 65 anos de idade

Percebem que apenas as mulheres tiveram um acréscimo na idade? E as mulheres que começaram a trabalhar muito cedo, com o fim do tempo de contribuição com certeza trabalharão bem mais. Imagine começar a fazer faxina aos 14 anos de idade, contribuindo para a previdência, por meio do pagamento do carnê, sem o tempo de contribuição, serão 48 anos trabalhando sem parar acumulando o cuidado com a casa e com os filhos. Os dois anos a mais que o governo apresenta como um presente, é na verdade um presente de grego.

TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO NA REGRA GERAL

COMO É – 15 anos
COMO SERÁ – 20 anos

Neste caso aumentou igual para os homens e mulheres, mas, não se pode desconsiderar o caráter machista e conservador da sociedade em que as mulheres recebem menos que os homens trabalhando na mesma função e que, na maioria absoluta dos lares, são responsáveis pela criação dos filhos, terão mais cinco anos para contribuir. Não resta dúvidas que este aumento de cinco anos pesará muito mais para as mulheres do que para os homens.

VALOR DO BENEFÍCIO

COMO É HOJE
Na aposentadoria por idade, o valor do benefício começa em 70% do salário de contribuição e soma 1% para cada ano de contribuição, até o limite de 100%. Quem se aposenta por tempo de contribuição tem o valor do benefício reduzido pelo fator previdenciário.

COMO SERÁ
Para quem ganha mais de um salário mínimo, o valor inicial do benefício é de 60% do salário de contribuição, subindo progressivamente (2 pontos percentuais por ano) até atingir 100% após 40 anos de contribuição (e podendo superar os 100%, no mesmo ritmo, a partir daquele patamar).

Também neste caso a lógica é perversa para ambos os gêneros, mas o registro é importante para a constatação de que todos trabalharão mais para ganhar menos ao final. Mas, não se enganem, em uma sociedade machista, a perversão é sempre maior para as mulheres.

APOSENTADORIA RURAL

COMO É HOJE

O morador de área rural pode pedir aposentadoria aos 60 anos, no caso de homens, e 55 anos, no caso de mulheres, cumpridos os 15 anos de contribuição mínima.

COMO SERÁ
Tanto homens quanto mulheres da zona rural poderão pedir aposentadoria a partir dos 60 anos de idade, com uma contribuição mínima de 20 anos. Entre os segurados especiais, o valor mínimo anual da contribuição previdenciária do grupo familiar será de 600 reais.

PROFESSORES

COMO É HOJE E COMO SERÁ
Professores têm redução de cinco anos nos requisitos de idade, e tempo de contribuição para se aposentar. Sendo 30 anos para os homens e 25 anos para as mulheres. Professores e professoras poderão se aposentar só depois dos 60 anos, cumpridos 30 anos de contribuição e desde que o docente esteja a 10 anos no serviço público e há cinco anos no cargo.

Novamente aqui, só as mulheres tiveram um acréscimo no tempo de contribuição.

POLICIAIS CIVIS, FEDERAIS E AGENTES

COMO É HOJE COMO SERÁ
Policiais se aposentam após 30 anos de contribuição (homens) ou 25 anos de contribuição (mulheres) e o tempo de exercício mínimo de 20 anos e 15 anos, respectivamente. Os agentes penitenciários e socioeducativos não têm um regime especial. Os tempos de contribuição permanecem os mesmos, mas passará a valer a idade mínima de 55 anos para homens e mulheres. O tempo de exercício progredirá até 20 anos para mulheres e 25 anos para homens. Para os ingressantes a partir da implantação da reforma, a remuneração seguirá as mesmas regras do regime geral. A mesma regra passará a valer para os agentes penitenciários e socioeducativos.

Aqui se mantém a visão de que as mulheres não precisam de tratamento diferenciado, afinal, desde a campanha o governo já afirmava que desigualdade de gênero é mimimi.

BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (BPC)

COMO É HOJE
É pago um valor de um salário mínimo a pessoas com deficiência e a idosos a partir dos 65 anos que comprovem não poder se sustentar (é considerada uma renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo).

COMO SERÁ
Não muda para os deficientes. Para os idosos, a proposta é que recebam 400 reais a partir dos 60 anos e que essa renda suba até atingir um salário mínimo a partir dos 70 anos. A comprovação de miserabilidade também levará em conta o patrimônio inferior a 98 mil reais (a faixa I do Minha Casa Minha Vida).

Neste quadro é importante destacar o caráter de esmola do benefício, não apenas pela dificuldade maior para a aquisição, mas também, por não ser um percentual, mas valor ínfimo fixado a ser corroído pela inflação.
Por fim fica evidente, deste modo o caráter machista e misógino da reforma se revela quando se observa que serão as mulheres a principais prejudicas, e por serem as mulheres fruto de uma “fraquejada” não há problemas, na lógica empregada pelo governo, que elas sejam consideradas o elo mais fraco e principal responsável pelo déficit da previdência, já que são elas que estão sendo penalizadas por esta proposta.

.