Marcelo Henrique: Opino eu, Opinas tu, Opinemos todos!

Marcelo Henrique

Foi uma conquista árdua e dolorosa. O direito de opinião é um direito, pois, absoluto. Ou seja, todo ser pensante tem a garantia de expressar-se com liberdade, em face da sua adstrição à liberdade de consciência, o reduto impenetrável para os tiranos de todos os tempos. A livre formação da opinião decorre do próprio amadurecimento do ser, em suas andanças e a sua manifestação, igualmente livre, sustenta um dos direitos subjetivos que as legislações intentam preservar – embora nem sempre o consigam.

A jogadora de vôlei Carol Solberg é o exemplo do momento e o contexto de sua manifestação, na forma de opinião, deve servir-nos de alerta e de bandeira.

Voltando à liberdade, necessário se faz buscar suas raízes filosóficas, erigidas sobre a condição de realização individual do homem, em termos de sua integridade espiritual e intelectual. Em consequência, atesta-se a impossibilidade de ingerência ou limitação externa, tanto do pensamento quanto de sua exteriorização, garantindo-se, então, a imunidade de seu signatário, a pessoa humana. Inexiste, portanto, controle externo do pensamento e de sua manifestação.

E é por sua natureza que o indivíduo alcança o status de poder e força impressionante, onde a liberdade é plena garantia da existência. E, ao comunicar o seu pensar a outrem, expande-se, por encontrar ressonância em outros que pensam de modo similar – e, talvez, não se expressem por receios ou timidez, mas que se sentem representados no ato divulgatório. Se temos a realização da personalidade em face daquele que se pronuncia, muitos outros também se realizam nesta representação, coletivamente falando.

O opinar diante da Sociedade, ainda que o substrato social possa ser pequeno, como um ambiente familiar, de trabalho ou lazer, um bairro, uma cidade, etc., isto é, o fazer-se ouvir pelo(s) semelhante(s), amplifica o direito subjetivo e gera a saciedade que pode até estar limitada a poucos segundos, mas que materializa, no dizer de Benedetto Croce, o “ideal moral da humanidade”.

E quais seriam os limites? Um velho mestre da faculdade de direito, nos primeiros albores da Constituição da República (1988) teria reforçado para nós, recém-saídos da adolescência e (quase) imberbes, o mesmo que nossos avós e pais já teriam, sem a estatura jurídica, mas com o conteúdo real de juridicidade, “a liberdade de um termina onde começa a de outro”. Porque o campo da liberdade individual de A pode invadir o de B, podendo ocasionar mutilações, injustiças ou danos morais ou materiais, passíveis de serem aquilatados e indenizados.

Contudo – e é isto o mote principal deste ensaio – a alegada agressão ao direito pessoal não pode ser exercitada com base na “liberdade do mais forte”. Muito menos albergada sob a justificativa de um papel social-legal, que não se traduz em imunidade absoluta, ou deificação político-social de quem ocupe determinadas funções públicas, porquanto essas tenham sido delegadas pela coletividade dos indivíduos livres, na democracia de nossos dias.

Direitos e deveres equilibram os pratos da balança, convergindo para o ideário (e a garantia) de que a livre-expressão seja requisito essencial à mantença da sociedade tida como democrática. E a liberdade de manifestação do pensamento – sobretudo quando caracterizada no inconformismo diante do status quo governamental – constitui a vera garantia do instrumento de controle pública da vida e dos atos da administração pública, que não pode ser cerceada, inclusive pela edificação de um pilar, o do controle social, entre os outros dois controles (interno e externo) que são pertencentes aos órgãos e poderes do Estado. Quis o legislador constituinte que o cidadão, livre, pensante e manifestante, pudesse atuar com total liberdade para denunciar, bradar, reclamar e colorir o seu pensamento vivo e visível aos demais.

Pois que da publicidade dos atos estatais evoluímos para a sua transparência e para a ampliação dos controles, aspectos que definem o Estado brasileiro do Século XXI, impondo a necessidade da gestão democrática, com controle popular e de postura estatal garantidora do exercício da liberdade de pensamento e dos direitos de informar, mas, também, opinar.

Não havendo, pois, pelo ato de desabafo, que bradou “fora!”, qualquer abuso de direito, impele considerar todo e qualquer ato de opressão, ainda que posterior à manifestação, direcionado à sua subscritora, como uma ameaça ao Estado de Direito e uma violência aos princípios de liberdade de expressão, publicidade e transparência da Administração Pública.

E porque é preciso repetir, para que a História não nos conceda o desagravo da repetição de dias nublados: “Amanhã vai ser outro dia!”.

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