Maceió: saúde mental virou desafio na rede pública; faltam profissionais

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Na Unidade Básica de Saúde (UBS) do conjunto José Tenório, uma psicóloga se desdobra para atender toda a população da região que precisa do sistema público de saúde para aliviar os sofrimentos emocionais.

Liguei para a UBS às nove da manhã do dia 24/1 (terça), simulando buscar um psicólogo.

A funcionária me disse que eu deveria comparecer pessoalmente na unidade na segunda-feira, 30/1, às sete da manhã para fazer o acolhimento, uma espécie de triagem para identificar as necessidades do paciente.

A partir daí, eu seria encaminhado para um psicólogo e outros profissionais caso houvesse necessidade.

Liguei para o CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) Infantil, também no José Tenório, o único de Maceió para atender todas as crianças com demanda em saúde mental. Uma mulher me pergunta a idade do paciente. Simulei um de 9 anos.

Ela respondeu que o atendimento vai das sete da manhã às cinco da tarde. Eu poderia procurar o CAPS em algum destes horários, a criança passaria por uma triagem.

Ela não me responde sobre a quantidade de psicólogos que atende na unidade mas disse que lá não se faz psicoterapia. A triagem seria feita por alguém da equipe técnica ou quem estivesse disponível.

Há uma carência explícita de psicólogos e psiquiatras nestes dois lugares e não é por falta de pacientes. Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) informou que “a UBS José Tenório conta com três psicólogos disponíveis para atender a população, porém a oferta está momentaneamente reduzida em virtude de férias e licença médica de dois profissionais”.

Uma pesquisa da Associação Brasileira de Psiquiatria diz que 59% dos associados registraram aumento de até 25% nas consultas. Os números são de abril de 2021, auge da pandemia.

O Ministério Público de Alagoas constatou a carência de psicólogos e psiquiatras em unidades de saúde de Maceió e recomendou a adoção de medidas para suprir as demandas em saúde mental da população.

Segundo dados do IBGE, Maceió tem 1.031.597 habitantes para 5 CAPS, um infanto-juvenil e 4 adultos. Todas as unidades de saúde estão em desacordo com norma do Ministério da Saúde que estabelece a presença de pelo menos um médico psiquiatra a cada 17.241 habitantes.

A Secretaria diz que há 28 psiquiatras e 92 psicólogos para toda a capital. E atribui a falta de profissionais da Psicologia à dificuldade em encontrar profissionais disponíveis para atendimento presencial.

O Sindicato dos Psicólogos de Alagoas (SindPsi-Al) nega essa dificuldade.

A vice-presidente do SindPsi Kátia Lins informa ao Repórter Nordeste que a carência de profissionais está ligada ao crescimento populacional e a falta de acompanhamento da infraestrutura em saúde.

Relacionou também a falta de concursos públicos para suprir a demanda crescente em saúde mental e regimes de contratações precários via PSS (Processos Seletivos Simplificados).

“Eu lhe garanto que se for aberto um edital com salario digno, vai chover inscrições de profissionais. O que mais temos são psicólogos precisando de um trabalho. O que a gente reivindica é que seja feito concurso público e que parem com os PSS, que são precários e não dão condições profissionais”, explica.

O crescimento do sofrimento psíquico é uma tendência mundial devido a pandemia de Covid-19. Por isso, ela diz, que os serviços de saúde precisam estar devidamente preparados para a receber a população. Lins também aponta para a precarização do trabalho do psicólogo no município e para contratações com salários abaixo da média do mercado.

“Contratações com salários baixos, com perda da capacidade de fala e de reivindicação, não há garantia que o que esta sendo recolhido no salario está indo para a previdência. Sem o concurso os colegas não tem garantia de permanecer no emprego. A gente não vê na gestão de JHC uma tendência a fazer concursos públicos”, afirma.

A SMS diz que tenta responder a demanda por serviços psicológicos com o programa Saúde da Gente, um serviço itinerante e que cada semana está em um bairro diferente. Ele oferece atendimento psicológico em psicoterapia. Sendo identificada a necessidade, as pessoas são encaminhadas para unidades de saúde mais próximas às suas residências.

Uma das estratégias para suprir esta demanda foi a implantação do teleatendimento em psiquiatria. A modalidade tem acontecido desde novembro de 2022, informa a SMS, sendo a Unidade de Referência em Saúde Dr. Hamilton Falcão, no Benedito Bentes, a primeira contemplada.

Para Kátia a precarização, terceirização e a privatização da saúde mental explicam o dilema que o município terá de enfrentar nos próximos anos. Em nome do SindPsi, ela pede um olhar sensível dos gestores e responsáveis pela pasta.

“A gestão precisa fazer um estudo e tomar uma medida, a pandemia nos gerou sequelas. Pânico, depressão e fobias aumentaram neste período. É preciso que o gestor tenha um olhar sensível. Recurso a gente sabe que tem”, conclui.

Confira a nota da SMS na íntegra:

“A Secretaria de Saúde de Maceió dispõe, atualmente, de 28 médicos psiquiatras e 92 psicólogos, atuando nos dispositivos que ofertam atendimento em Saúde Mental da capital. No entanto, o órgão tem enfrentado dificuldade em encontrar profissionais disponíveis para atendimento presencial nos equipamentos municipais.

Como estratégia para atender as demandas da população, a Gerência de Saúde Mental da SMS implantou, em novembro de 2022, o serviço de teleatendimento em psiquiatria, tendo como primeira unidade contemplada a Unidade de Referência em Saúde Dr. Hamilton Falcão, no Benedito Bentes.

Quanto à assistência em psicologia, a Saúde trabalha constantemente na criação de estratégias para aumentar a oferta de atendimentos na cidade, como a última contratação de 40 profissionais da área para prestar assistência à população no Saúde da Gente – programa itinerante que percorre bairros de Maceió com oferta de diversos serviços de saúde à população.”

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