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Já abriu o baú da saudade?

É mesmo bonito criar um dia para exibir a saudade!

Lembro de uma amiga italiana dizendo que não existia palavra mais bonita no português brasileiro do que saudade; para ela, aqui adquiria um sentido único, distante da nostalgia de sua própria língua.

De cá, olho para a saudade de soslaio. A vejo fantástica, como um imenso baú cheio de fumaça, que quando é aberto transforma tudo em rostos, sons, cheiros, sensações de pele a pele e sentimentos mistos.

Saudades podem ser piegas, dolorosas, cantantes, radiantes ou introspectivas, profundas e pantanosas ou ensolaradas e suadas de alegria. Campos livres!

A minha saudade é sem fim, como aquele baú que imagino, dentro qual armazeno o que fui, com quem vivi e tudo o que não pude reter, mas ainda assim, ficou comigo.

Só sentimos saudades do que foi bom, me disse um velho amigo. No entanto, até mesmo algumas coisas ruins estiveram imbricadas em contextos saudosos, logo imagino que podemos sentir saudades de variadas vivências, porque se tem uma coisa que falta à vida é simetria.

Escrever sobre o que não podemos tocar é exercício sensível, que facilmente pode nos fazer descambar para o sentimentalismo, mas neste texto nada é negado, porque já estamos equilibrando a escrita sobre ausências, e algumas delas machucam o sentir, pois algo nos faz pensar que perdemos.

Sobre a meia idade que me inspira, já acumulo muitas despedidas, mas reelaboro sensações de perdas, porque nunca possui o que acreditei ter, e somente amando pude mantê-los comigo, logo o estado de liberdade permite que voem para outras paragens sem que existam cisões.

Amo presenças ausentes, ou ausências que nunca me deixaram só.

Saudades, contudo, tem seu próprio lugar, quando no tempo das possibilidades caminhamos juntos na matéria, executamos tarefas e fizemos artes manuais, cuidamos da mesma planta e alimentamos o mesmo animal, isso é comovente demais.

Saudade faz chorar.

Saudade faz sorrir.

Eu amo estar sentindo esse baú abrir, deixando rostos saírem do lugar para onde um dia eu também irei, quando outras pessoas sentirem saudades de mim.

O baú das saudades não terá fim.

 

SOBRE O AUTOR

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