Incompetência: uma fonte de desperdício no Brasil

A incompetência se consolidou como uma das maiores fontes de desperdício no Brasil. O que se perde em função da rede de distribuição precária das concessionárias de água e de energia elétrica daria para atender todo o país sem a necessidade de novos investimentos. Em valores financeiros, as duas atividades desperdiçam, juntas, pelo menos R$ 28 bilhões por ano. O montante seria suficiente para construir quase três hidrelétricas de Jirau (RO), com potencial para gerar quase 10 mil megawatts de energia.

“Somos um país privilegiado. Temos abundância de recursos naturais, mas, ao mesmo tempo, a cultura do desperdício”, resume o coordenador do programa Água para a Vida do WWF-Brasil, Glauco Kimura de Freitas. “A maioria dos brasileiros tem consciência de que a água será um problema no futuro, mas não adota precauções para evitar a escassez. O desperdício é subestimado”, completa.

Especialista em redução de perdas de água e energia, o consultor Airton Sampaio Gomes alerta que o desperdício de água varia de 350 a 400 litros por ligação diária, volume quase seis vezes maior do que a média dos melhores sistemas da Europa. Gomes lamenta a falta de maior engajamento do governo e do meio acadêmico na busca de soluções para reduzir o desperdício.

“Na Europa e no Japão, as universidades estão muito mais voltadas para isso. Existe, de fato, uma preocupação. Por aqui, ainda é preciso muita conscientização”, avalia Gomes. “As pessoas reclamam da falta de recursos, mas jogamos bilhões de reais no lixo com o desperdício de água. Se as companhias fossem mais eficientes, seria muito mais fácil universalizar o acesso à água”, acrescenta.

Gesner Oliveira, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e sócio da consultoria GO Associados, explica que as perdas das distribuidoras, por ineficiência, equivale em dinheiro ao que elas demandam, atualmente, de investimentos. “Temos um potencial enorme naquilo que jogamos fora. Se conseguirmos minimizar as perdas, poderemos atender parte das nossas necessidades”, afirma.

O desperdício de água no Brasil ocorre em todas as etapas, desde a distribuição até o consumidor final. Redes e empresas de saneamento mal geridas, principalmente as que atuam em nível municipal, são as maiores fontes de prejuízos. A região Norte registra as maiores perdas: 53,2% de toda a água distribuída se esvai. O Amapá tem o pior índice do país, 74,1%, e o Distrito Federal, 23,1%, um dos menores da federação.

Os hábitos domésticos — com chuveiros, torneiras e mangueiras — também são uma fonte de desperdício e, para evitá-lo, propagam-se medidas como calcular o tempo de banho e fechar a água ao escovar os dentes. O engenheiro agrônomo aposentado Wilson Nakamura, 63 anos, calcula que o consumo da família vai de 800 a 900 litros de água por dia. Ele ressalta que foram várias as tentativas de reduzir esses números. “Somos cinco pessoas. Temos muitas plantas e dois carros de passeios, que são lavados a cada 15 dias”, relata. Quando começou a construir a casa onde mora, no Guará, Nakamura tinha a intenção de montar um sistema de captação da água da chuva. “Fiz todos os cálculos: demoraria 10 anos para reaver o investimento. Não valia a pena”, lamenta.

Fonte: Correio Braziliense

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