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Eduardo Tavares comenta acertos e erros da condenação de Lula

Eduardo Tavares- procurador de Justiça

É incrível como o julgamento e a condenação do ex-presidente Lula traz à baila discussões doutrinárias já tão ultrapassadas, seja do ponto de vista da condenação ou não.

Ora, desde cedo aprendi, e passei para os meus alunos, o entendimento de que o sistema processual vigente no Brasil não é o sistema inquisitorial, aquele em que o Estado Juiz concentra, em suas mãos, as atribuições de angariar provas, acusar, defender o réu e absolvê-lo ou condená-lo.

Ao contrário desse sistema, que encontra as suas origens na Europa e na igreja católica, o nosso sistema é o denominado de acusatório, com juiz, autor e réu.

A denúncia é promovida pelo órgão acusador, assim como as provas. A figura do juiz é dotada de total imparcialidade. Principios como os do devido processo legal, da presunção da inocência, do contraditório e o da paridade de armas, vigentes em nosso ordenamento jurídico, nos fazem afirmar que o sistema processual brasileiro está longe de ser o inquisitorial.

Conforme já disse, esse sistema, que busca inspiração na inquisição, tomou conta da Europa com o Concílio de Latrão, a partir de 1215. Por outro lado, hoje, o chamado Law and order nada mais é do que uma colocação ilusória para incutir nas pessoas a ideia de um estado forte e da existência do fiel cumprimento da lei.

Balela!

O que nos faltam são políticas econômicas, sociais e educacionais justas e acessíveis.

O sistema da lei e da ordem, tão defendido por parte da sociedade e da doutrina pátria, não tem evitado que o País seja campeão em reincidência.

Algo está fora dos conformes. O que está errado?

Voltando a questão: outro dia, assisti, num desses vídeos que a gente recebe todos os dias, uma entrevista do grande juiz inglês Geoffrey Robertson. Ele comentava sobre a condenação do Lula, alegando que, “in casu”, o juiz Moro produzia provas para ele próprio, no sentido de formar sua convicção.

Redondamente enganado o conselheiro da Inglaterra.

Ele está confundindo o sistema acusatório brasileiro com outros sistemas alienígenas, nos quais existem o juízo da instrução e o juízo da condenação.

Em nosso sistema, acho, inclusive, justo que o juiz, que condena ou absolve, acompanhe o caso desde o início.

A necessária convicção passa a encontrar guarida no conhecimento de causa, sem que o julgador personifique sua decisão.

Sem adentrar no mérito da decisão do juiz Moro (se o Lula é culpado ou inocente), penso que a produção de provas ocorreu na forma prevista no sistema processual brasileiro.

Confidencio, cá entre nós, sem adentrar em personagens, mas tão somente nos fatos historiados, que achei a reprimenda muito serena e logo afirmei: se não se atentar para o necessário aumento da pena, em segunda instância, ocorrerá a extinção da punibilidade em razão da prescrição da ação.

O Estado perderá o interesse de punir, pois em razão do fato do réu ser um septuagenário, o prazo da prescrição da pena, “in concreto”, se dará pela metade.

Com nove anos de pena só restaria ao TRF4 reconhecer a sua não aplicação pelas razões já narradas.

O réu estaria impune, pelo menos em relação aos crimes a ele imputados nessa denúncia.

Somente a titulo explicativo: a prescrição se dá em relação a cada crime de forma autônoma e não levando-se em conta o somatório delas (Concurso Material).

O juiz Moro, portanto, em meu modesto entender, pecou na dosimetria penal e permitiu especulações das mais variadas tais como: “o TF4 só aumentou a pena para evitar a prescrição” (e isso é verdade), o juiz Moro foi tímido, etc, etc.

No mais, tirando alguns abusos e espetaculismos, respeitamos todos os entendimentos jurídicos demonstrados aqui ou alhures mas, asseguro, não existe mínimo erro na decisão do TRF4.

Parabéns aos doutos julgadores!

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