Como melhorar o trânsito a custo zero (ou quase)

Mas quero falar apenas das microssoluções, que, individualmente, parecem pífias, mas o seu somatório pode aliviar o trânsito. Vejamos algumas ideias, engendradas na monotonia dos congestionamento

Cláudio de Moura Castro- Estadão

É fácil fazer uma revolução no trânsito de  qualquer cidade. Basta copiar o que fez Haussmann em Paris. Ou seja,  demolir, para abrir grandes avenidas.

Tecnicamente é fácil, mas na  prática é impossível. Vejam só, em 50 anos Belo Horizonte só fez duas  avenidas, à la Haussmann. E já abriu o bico, sem fôlego para outras. Daí  que devemos pensar em outras soluções.

Há muitas. Mas quero falar  apenas das microssoluções, que, individualmente, parecem pífias, mas o  seu somatório pode aliviar o trânsito. Vejamos algumas ideias,  engendradas na monotonia dos congestionamento.

Vias de acesso – Em  certas horas do dia algumas ruas e avenidas concentram o trânsito,  ficando congestionadas. A primeira providência, se já não foi tomada, é  mapear quais artérias cumprem esse papel e em que horários isso ocorre.  Conhecendo esses parâmetros, há muito a fazer.

Eliminar o  estacionamento nessas artérias e nessas horas. Não tem sentido poucas  dúzias de veículos atrasarem a vida de milhares de pessoas, como vemos  acontecer.

Coibir severamente tudo o que retarde o tráfico nessas  vias, incluindo não apenas o estacionamento, mas as paradas (caminhões  descarregando, etc.). Portanto, patrulhá-las mais intensamente e criar  um 0800 para avisar que alguém está parado ou estacionado nelas.

Criar  um sistema diferenciado de perícia e reboque, para reduzir  dramaticamente o tempo em que a via permanece obstruída. Nessas vias,  acidentes têm preferência no atendimento e haverá formas rápidas de  liberar a rua.

Remanejar paradas de ônibus, de forma a evitar os locais mais congestionados ou criando reentrâncias no passeio.

Encontrar  soluções para saídas de colégio em artérias movimentadas. Em alguns  casos, proibir o estacionamento próximo nas horas críticas de embarque e  desembarque. Se isso não for possível, reservar ruas de pouco movimento  nas proximidades.

Semáforos – Permitir a conversão à direita com o  sinal fechado. No Brasil já foi assim e hoje todos os Estados  americanos adotaram a prática. Por que não?

Utilizar a prática  (também americana) de pôr o semáforo piscando em horários noturnos. Com  ou sem justificativas de segurança, a partir de certa hora quase todos  avançam o sinal. Se todos são pecadores e não há como coibir, é melhor  eliminar o pecado. Reduzirá o número de acidentes? Se não há  estatísticas sobre esse assunto, deveria haver.

Estudar  cuidadosamente o fluxo de veículos e pedestres nos cruzamentos e  otimizar o tempo de duração para cada rua. Há ruas de pouco movimento  com tempos excessivos. O somatório de esperas desnecessárias deve ser  substancial. Ondas verdes, com sinais sincronizados, são ainda melhores,  mas aqui falamos de custo zero.

Acesso diferenciado a linhas  preferenciais – As faixas privativas para ônibus foram um avanço. Mas é  pouco. Considerando que os carros andam com lotação média de 75% da  capacidade, a solução mais radical seria dar acesso às vias  preferenciais apenas a automóveis com sua lotação completa. Assim, de  cada quatro carros, três a menos estariam na rua! Vizinhos que trabalham  perto teriam boas razões para viajar juntos (estimulando o conhecido  carpool). Oferecer caronas na rua, para entrar na privativa, alivia os  ônibus.

Essas medidas se aplicariam também às grandes vias de  acesso, onde, em certas horas, só se permitiria circular com lotação  maior no carro. Quem tiver bancos vazios ou vai outra hora, ou usa vias  menos convenientes.

Fiscalização aleatória em todas as ruas da  cidade – Mesmo nos países ditos civilizados, boa parte do cumprimento da  lei resulta do medo de ser apanhado desobedecendo-lhe. Como sabemos  onde há guardas e onde não os há, sabemos também onde obedecer às leis  do trânsito e onde não fazê-lo.

Portanto, a solução óbvia é fazer  com que jamais possamos ficar sabendo em que esquinas haverá guardas  fiscalizando. Basta um programinha de computador, mandando  aleatoriamente os guardas disponíveis para alguma esquina, digamos, por  uma hora, passando depois para outra. Como ninguém saberá onde estão,  aumenta o medo da multa. Naturalmente, locais onde acontecem mais  acidentes serão mais sorteados.

Políticas de redução dos  deslocamentos – Por que todos vão para o escritório à mesma hora e  voltam também à mesma hora? Em alguns casos, há boas razões. Em outros,  por que não encorajar grandes empresas a mudarem os seus horários de  entrada e saída?

Motocicletas – Comparadas com automóveis, motos  ocupam menos metros quadrados por pessoa no trânsito. O mesmo sucede no  estacionamento, pois cada automóvel ocupa um espaço em que pelo menos  oito ou dez motocicletas podem ser estacionadas. Com o crescimento da  frota de motos, é preciso aumentar os estacionamentos privativos para  elas. E também permitir que parem nos intervalos deixados pelos carros  estacionados.

A proibição de estacionar sobre o passeio é sem  sentido, sempre que não prejudique o fluxo de pedestres. É curioso, na  Alemanha, França, Suíça e nos Estados Unidos esse estacionamento é  permitido, liberando espaço para automóveis. Por que o purismo?

Abusos  com motos são frequentes, os maiores pecadores sendo os motoboys. Mas  estatísticas da Universidade do Sul da Califórnia dão algumas pistas bem  úteis. Motociclistas com até seis meses de carteira têm 50% mais  acidentes do que aqueles com mais tempo (o índice de acidentes cai de  1,4 para 0,96). E a partir dos 18 anos vai caindo a frequência de  acidentes. Portanto, faz sentido exigir mais experiência.

Quem  aprendeu com amigos e parentes tem um índice de 1,56. Quem fez curso  sério de direção defensiva tem 0,46. Ou seja, cairiam os acidentes se  fossem oferecidos bons cursos de direção defensiva, em vez inventar  jalecos ou outras bobagens.

Que me perdoem a audácia os engenheiros de trânsito, mas aí estão meus palpites de leigo.

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