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Associação Médico-Espírita e o aborto legal

Como espírita brasileira um dia já senti muito orgulho da força de representação que esta associação carregou em momentos históricos nos quais a medicina se afirmava como ramo da ciência em comunhão com as dádivas invisíveis oriundas do mundo espiritual em benefício da vida , inclusive em seu aspecto fenomênico, aliviando as dores humanas através da admissão dos recursos trazidos pela espiritualidade, em expressão pura do amor divino, sempre tão presente em nossos caminhos.

Porém quando as representações espíritas brasileiras passaram por sua prova no ano de 2018, e muitos médicos do meio aderiram à arma em vez do amor, o timbre do amadurecimento foi organizando impressões em seus lugares devidos, com as merecidas ressalvas aos que individualmente optaram pela fidelidade à cultura de paz.

Contudo, é neste dado instante em que o Brasil lida com suas mazelas intestinas, partes das estruturas de poder, mando e usufruto do território alheio em forma de corpos – mesmo que sejam corpos infantis – que o posicionamento oficial desta associação através de uma nota pública, revela o obscurantismo presente nas convicções dos senhores médicos  e senhoras médicas que se afirmam espíritas.

A polida fala introdutória sobre o duplo crime (pedofilia+estupro) que resultou no engravidamento de uma infante aos 10 anos de idade se transforma em verve renhida na acusação de que o caso aberrante  “esteja sendo usado como lobby ideológico por grupos defensores do aborto.”

A  defesa da vida intrauterina a qualquer custo, sobre qualquer circunstâncias, tem sido feita como se esta etapa da encarnação fosse a única que tivesse valor de proteção e defesa. O caso em pauta trazia sérios riscos para a vida da menina-mãe, mas o trecho abaixo mostra que para a AME a questão seria resolvida com acréscimos materiais, algo muito em voga no senso de caridade do espírita médio.

” Informações relatam que médicos que acompanhavam o caso pelo noticiário entraram em contato, disponibilizando gratuitamente serviço e toda infraestrutura para pré-natal, parto e pós-parto, visando dar opção à gestante e sua família de não matar o bebê.” Este trecho aponta o desamor inflamado no trato com o caso da menina-vítima, aqui transformada em assassina, pois quem “mata um bebê” não é mais do que isso para a linguagem corrente.

No final da nota, o recurso de intenção punitiva, que há milênios corrobora para o medo, obscurantismo e atraso humanitário, utilizando frase do Livro dos Espíritos – que entra em consonância com o aborto legal, mais um acessório de crueldade trazido das falas de Emmanuel:

“Conforme o Livro dos Espíritos (Questão 359) o aborto só se justifica quando a gravidez gerar risco à vida da mãe.”

“Lembramos a afirmativa de Emmanuel, no livro Leis Morais, capítulo XI: “O aborto provocado, mesmo diante de regulamentos humanos que o permitem, é um crime perante as Leis de Deus”.'”

Tal nota merece nosso repúdio, pois corrobora com as manifestações de intolerância religiosa que escandalizaram o país nas últimas horas.

Nós espíritas que tantas vezes enchemos os pulmões de ar nos arrogando racionais e esclarecidos, agora estamos sendo confundidos com crentes medievais por causa de manifestações assim.

Como Livre Pensadora Espírita, não coaduno com este posicionamento e expresso apoio e solidariedade à vítima do duplo crime, que ora também se tornou vítima do fundamentalismo religioso que sustenta o comportamento fascista em nosso país.

Eis a nota da AME:

http://Nota da AME-BRASIL sobre a notícia da menina grávida de 10 anos Estamos acompanhando o noticiário sobre a menina de 10 anos que engravidou em decorrência de estupro. Além da necessária punição aos responsáveis pela inaceitável violência sexual e emocional que a criança vinha sofrendo, lamentamos que o seu caso esteja sendo usado como lobby ideológico por grupos defensores do aborto. Informações relatam que médicos que acompanhavam o caso pelo noticiário entraram em contato, disponibilizando gratuitamente serviço e toda infraestrutura para pré-natal, parto e pós-parto, visando dar opção à gestante e sua família de não matar o bebê. Conforme o Livro dos Espíritos (Questão 359) o aborto só se justifica quando a gravidez gerar risco à vida da mãe. Lembramos a afirmativa de Emmanuel, no livro Leis Morais, capítulo XI: “O aborto provocado, mesmo diante de regulamentos humanos que o permitem, é um crime perante as Leis de Deus”. Diretoria da Associação Médico-Espírita do Brasil

18 respostas

  1. Essa interpretação livre do espiritismo está parecendo o que o STF tem feito afirmando coisas diametralmente oposta ao texto constitucional. Parece claro as duas orientações:

    “Conforme o Livro dos Espíritos (Questão 359) o aborto só se justifica quando a gravidez gerar risco à vida da mãe.”

    “Lembramos a afirmativa de Emmanuel, no livro Leis Morais, capítulo XI: “O aborto provocado, mesmo diante de regulamentos humanos que o permitem, é um crime perante as Leis de Deus”.’”

    O caso em questão deveria ser decidido com a avaliação técnica dos médicos, inclusive considerando acompanhamento psicológico para que junto aos responsáveis e a vítima possa ser feita a melhor escolha para esta.

    Por fim, o espírito é relativamente livre para pensar e agir, mas a codificação não pode ser adaptada e relativizada ao sabor das circunstâncias. A lei de causa e efeito submete todos indistintamente.

  2. Como espírita que sou, embora afastado do Centro Espírita por intolerância política, fundamentado no Tríplice Aspecto da Doutrina Espitita, digo que:

    1) Ao “meu ver”, os casos de estupro, risco de vida para a mãe e ou criança e criança anencefálica seriam justificativas para o aborto.

    Porque seriam “provas” pelas quais os(as) envolvidos teriam que passar.

    Existem tantos maneiras de se tratar a mãe e a criança pré, durante e pós nascimento.

    E os casos de anencefalia em que a criança nasce, vive um período e depois desencarna pela “vontade de Deus”?

    2) Entretanto, a “Justiça Divina” tem por essência as infinitas oportunidades de reparação de erros!

    Assim sendo, o imediatismo não é caminho Cristão de soluções dos problemas HUMANOS.

    Sou contra o aborto!

    Sou contra também o sensacionalismo que o tema envolve.

    Isto posto, fundamentado nas mesmas três dimensões do Espiritismo há que considerar:

    a) O crime de estupro, que retém o homem (homem + mulher) em estágio embrutecido;

    b) As inúmeras mortes de mães e filhos em abortos clandestinos, inclusive por casais moralistas;

    c) As hipocrisias e incoerências de intolerância religiosa, que apregoa não ao aborto, mas sim à exclusão social e à pena de morte;

    d) O despreparo de serviços públicos e privados de assistir com os cuidados físicos, morais, legais e espirituais com as questões de origem da gravidez e sua conclusão, há que, em casos como este, se optar por:

    i) Responsabilizar o estuprador;
    ii) Respeitar a vontade da mulher, no caso específico da criança, que dizem incapaz, mas sabe manifestar suas angústias e repulsas;
    iii) Postergar as oportunidades de correção de erros, que certamente aconteceram e se assim não fosse não estaríamos diante de tamanho conflito.

    Assim, o procedimento abortivo se deu!!!

    E que tenhamos o necessário aprendizado de nos libertarmos de torturadores, genocidas, hipócritas e estupradores, enquanto Deus no dá esta oportunidade.

    Que assim seja!

  3. Concordo em parte com a AME no sentido de avaliação do caso em situações na vida de adultos, mas o caso de gravidez em crianças é especifico. Entendo que a defensiva da AME vem reforçar essa atitude dos criminosos. É preciso muita discussão, debates sobre o assunto em sociedade através da mídia, orincipalmente na tv aberta mais comum em todos os lares,com profissionais da Ciência e da Educação, legisladores pois entendo que o conhecimento vem de lá, mas a nossa evolução é de cá para lá.

  4. Falar de lei de causa e feito no comentário acima é de entristecer
    Cadê o amor? Cadê a caridade para com a criança de 10 anos?
    Crianças não tem nem o corpo nem o psicológico preparado para serem mães, querer obrigar a criança a ser mãe é um absurdo.
    A vítima aqui é ela, mas o que mais vi é gente apontando o dedo para acusá-la.

  5. É lamentável ver espíritas indo a reboque do pensamento fundamentalista, desconsiderando a variável da reencarnação.

  6. Como Livre Pensadora Espírita, você tem todo o direito de se expressar contra a nota da AME. É o seu livre arbítrio. A sua escolha. No Supremo Tribunal Divino seremos julgados. Pelas escolhas…

  7. Que tristeza ver o dogmatismo ocupar o lugar da caridade e da empatia entre espíritas… Fora do dogmatismo não há salvação? Que momento triste…

    1. Lamentavelmente, existe um grupo dentro do Movimento Espírita que eu denomino de xiitas, os comentários, às vezes, podem até serem velados , mas estão carregados de um conservadorismo Medieval. Veja que eu falei em Movimento Espírita, que é coordenado por pessoas.Já a Doutrina não,ela é perfeita,ela é o Cristianismo redivivo, é o Consolador prometido.Essa criança correu risco de vida,seu corpo e seus órgãos são muito tenros ainda.Sua vida precisou ser salva.

  8. Muita decepção com a AME! E como fica a vida da jovem? Já deixei de acompanhar na redes vários palestrantes espíritas . Muitos ignoram a tragédia pela qual nosso país está passando. Muitos do conforto dos seus lares pregam o recurso da meditação! Acho ridículo isso! Deveriam se posicionar contra as mazelas que abatem nosso país, deveriam incentivar que nos unamos como comunidade e pratiquemos a caridade real, ou seja, entrar em contato com o nosso próximo de verdade, sem arrogância ou soberba parta ajudar materialmente e espiritualmente. Deveríamos ser um movimento de amor!.

  9. Quero me expressar, apenas no aspecto religioso, sobre o caso da menina do Espírito Santo, vítima de estupro, do qual resultou gravidez. Seus familiares pediram à Justiça autorização para a realização do aborto, no que foram atendidos. Alguns grupos espíritas se posicionaram contrariamente ao aborto. Não vejo, porém, fundamento para tal posição, com todo o respeito. Em O Livro dos Espíritos, obra básica da Doutrina Espírita, o aborto é admitido na hipótese em que a gravidez coloque em risco a vida da mãe (questão n. 359). Ora, uma criança de dez anos não está biológica e emocionalmente preparada para uma gravidez saudável, conforme vários médicos já se posicionaram. Impor a gravidez nesse caso seria um atentado contra a vida física e psíquica dessa criança. E o Espiritismo, como doutrina que pretende reviver os ensinamentos de Jesus, faz coro às palavras do Cristo: “Deixai vir a mim as criancinhas, porque delas é o reino dos céus.”. Negar o aborto, nesse caso, será condenar a menina ao “fogo do inferno”, aliás, um fogo onde ela provavelmente já se encontra. E a nós cristãos compete retira-la de lá, antes que as chamas a devorem por completo.
    José Carlos.

  10. Alguém sabe que livro de emmanuel é esse que a AME cita porque já procurei e não existe isso,Quem é espírita sabe se a menina corria risco de vida o procedimento foi correto.a AME está muito enganada.

  11. E Espíritas ou não deixemos dessa historia de Esquerda ou Direita, o que é correto é correto,Não tem partido;QUE COISA CHATA!

  12. Gostaria de observar que estamos esquecendo da mansidão e ternura ensinada por Jesus, diante da violência ou situações polêmicas.

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