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Vender a Casal pode deixar metade dos alagoanos sem água para sempre

Odilon Rios/ Especial para o EXTRA

A três meses do leilão da área metropolitana da Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal)-  o “filé mignon” da arrecadação da estatal- não se sabe ao certo qual o futuro do restante da companhia que fica de fora da transação nem como o sistema vai arcar com os custos para levar água ao sertão e às outras regiões.

Em um ponto o Sindicato dos Urbanitários e o vice-governador Luciano Barbosa (MDB) concordam: o fim do subsídio cruzado pode inviabilizar o funcionamento do que sobrar do leilão da Casal.

Subsídio cruzado é quando um município maior e mais rico- como Maceió- ajuda a pagar os custos da água em cidades menores e mais pobres. Sem o subsídio, os mais pobres jamais teriam água da Casal em casa porque o valor da tarifa seria altíssimo.

Segundo o IBGE, Alagoas é o segundo Estado com maior percentual de pessoas em situação de pobreza: 48,9% da população. 570 mil alagoanos são extremamente pobres.

Quem comprar a área metropolitana- que vai à leilão no dia 30 de setembro- vai reajustar o valor da água, em busca de lucro. O que sobra da Casal- e fica com o Governo- terá de aumentar o valor da tarifa ao consumidor, sob o risco de fechamento da estatal.

“Não podemos abrir mão do subsídio cruzado”, resume o vice-governador. “Não tem condições de suprir as necessidades para pagar a água e a gente atender ao filé, como você falou, dos melhores bairros ou o bairro onde está situada a classe média alta e entregar ao setor privado esse ouro, digamos assim, e deixar o Estado com o resto. Se fizermos isso, vamos estar pesando para o Estado, que vai ter de assumir a responsabilidade com as comunidades mais carentes sozinho e vai abrir mão do subsídio cruzado porque não está tirando de onde antes tirava para poder suprir esta dificuldade”, explicou.

“No caso da Casal, no caso de abastecimento de água da Casal não existe formulação de se privatizar a Casal, o abastecimento de água, sem que você faça o subsídio cruzado”, reforçou Barbosa.

Opinião semelhante é de Dafne Orion, presidente do Sindicato dos Urbanitários. O prefeito de Maceió, Rui Palmeira, defende o fim do subsídio cruzado para que o dinheiro arrecadado na capital fique nos investimentos a serem feitos na capital.  “Como a Casal vai conseguir se sustentar para levar água para o sertão, para a região serrana? Essas perguntas não são respondidas. Por que este projeto não começou no sertão ou na região serrana? Porque ele começa onde dá lucro”, analisa.

E sentencia: “Sem o subsídio cruzado, não tem água nas cidades do interior alagoano”.

Números

Há quatro anos seguidos, a Casal dá lucro. Ano passado, fechou em R$ 65,8 milhões. Segundo o edital de leilão, o lance inicial de venda da área metropolitana atendida pela companhia é de R$ 15 milhões. Em 35 anos, a empresa vencedora terá de investir R$ 2,6 bilhões- R$ 2 bilhões em até 8 anos, divididos assim: universalizar o abastecimento de água em seis anos e rede de esgoto para 90% da área leiloada até o 16º ano do contrato. 1,5 milhão de pessoas devem ser atendidas. Alagoas tem 3,3 milhões de habitantes.

Cálculos do Sindicato dos Urbanitários mostram que, neste período, quem comprar e administrar o “filé mignon” da Casal vai lucrar R$ 29 bilhões. “Comprou por R$ 15 milhões, vai lucrar R$ 29 bilhões e vai investir R$ 2,6 bilhões”, resume Dafne Orion, presidente do sindicato.

O vice-governador pensa diferente, ao fazer a defesa do leilão da Casal: ele diz que não adianta o lucro da estatal e a  maior parte das pessoas não ter saneamento básico. “Lucro desse jeito é muito bom. Você fornece um serviço que não é de qualidade e ainda cobra por ele. Dessa forma você tem lucro. Mas nós precisamos de investimento alto, pesado, não só em Maceió mas no Estado como um todo”

30% dos alagoanos ainda não têm acesso a água tratada. Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que Alagoas investe 1/3 da média do Brasil em saneamento. Significa que a universalização do saneamento básico, neste caminhar lento de investimentos, só daqui a 100 anos.

“Há uma necessidade de investimento do setor privado na área de saneamento. Por isso que o Brasil está muito atrasado em saneamento, o Nordeste está muito atrasado em saneamento. Maceió está muito atrasada em saneamento. A gente praticamente não vê saneamento nas segundas maiores cidades do Brasil e no caso do Nordeste isso é gritante e precisamos fazer isso. O Estado não tem recurso para fazer. O Estado precisa buscar em algum lugar. Ou toma emprestado e aí é preciso que o banco queira emprestar. Ou ele então vai ao setor privado e faz uma oferta”, resume o vice-governador.

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