Usar reservas internacionais para abater dívida traz riscos e não ajuda a resolver crise, dizem especialistas

R7

Seria infrutífero usar as reservas internacionais para enfrentar a crise econômica no Brasil, como sinalizado pelo governo recentemente, segundo especialistas, que apontam ainda que tal movimento acarretaria não apenas em aumento do descrédito no País, mas também traria alta dos preços.

As reservas internacionais, hoje na casa de R$ 1,3 trilhão (US$ 370 bilhões), são consideradas um colchão de segurança em meio à rápida deterioração das contas públicas e mantêm o setor público brasileiro como credor líquido em moeda estrangeira.

Segundo o economista-chefe do Banco J.Safra e ex-secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall, o uso das reservas “não faz sentido” se não foi para pressionar o mercado de câmbio.

— Essa proposta não contribui para melhorar a credibilidade, ao contrário, aumentaria a incerteza e a insegurança dos agentes econômicos.

As reservas internacionais foram fortemente acumuladas pelo BC (Banco Central), seu gestor, ao longo do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e são apontadas como um dos poucos indicadores econômicos positivos do País. Elas são usadas para controlar a liquidez no mercado de câmbio.

A avaliação é de que o Brasil ficaria vulnerável no caso de fuga de capitais ou de um ataque especulativo, algo não completamente descartado neste momento de intensa crise política e após o país ter perdido o selo de bom pagador pelas três principais agências de classificação de risco.

O ex-diretor do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas diz acreditar que o uso das reservas para abatimento da dívida vai aumentar a desconfiança em relação ao Brasil.

— A consequência é que sobe juros, sobe dólar e podemos de novo chegar na hiperinflação da década de 1980.

Para Thadeu, sem uma trajetória sustentável de dívida, que seria alcançada através do ajuste fiscal, usar as reservas para diminuir a dívida bruta não passaria de “queimar dólares”. Hoje, a dívida bruta do País está em 67% do PIB (Produto Interno Bruto) e avaliações indicam que ela pode ir a 80% nos próximos anos.

Mesmo quem vê aspectos positivos desse uso das reservas, acredita que isso poderia ter efeitos nocivos.

O especialista em contas públicas e professor da PUC de São Paulo Waldemir Quadros, por sua vez, observa que usar uma parte das reservas internacionais poderia “dar mais tempo” ao governo, ao reduzir o endividamento e, assim, aliviar os cofres públicos. No entanto, ele ressalta que, dependendo de como isso fosse feito, poderia gerar pressão inflacionária por conta do dinheiro que seria injetado na economia.

Resistência interna

Dentro da atual equipe econômica, é praticamente unânime a posição contrária ao uso das reservas internacionais seja para abater dívida seja para ampliar investimentos, com o temor de que a confiança no País seja ainda mais abalada.

O tema é bastante delicado, devido ao cenário político conturbado que aumenta a pressão sobre a presidente para buscar soluções para reviver a economia em recessão.

Na semana passada, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, afirmou que o governo não tinha planos de usar as reservas internacionais, considerando importante mantê-las no patamar atual. O mesmo posicionamento do ministro foi reforçado pela presidente Dilma Rousseff nesta quarta-feira (16).

— As especulações sobre o uso das reservas internacionais só beneficiam os poucos que lucram com eles. Nós, que criamos, sabemos que isso significava como uma proteção.

A utilização das reservas internacionais para outros fins, que não o mercado cambial, também poderia afetar o setor externo brasileiro, que tem se beneficiado com o dólar mais elevado. Para o ex-presidente do BC Gustavo Loyola, haveria “efeitos monetários complicados” e, por isso, ele acredita que haveria alta considerável no prêmio de risco do País.

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