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Tráfico entre jovens: nossa queda social

Hoje deparei-me com aquela cena perturbadora em que a polícia encosta os jovens na parede, ajoelhados e com as mãos na cabeça. Não sou contra a polícia nem a repressão que muitas vezes coage os abusos e violências. A cena é que choca!
São nossos jovens, aqueles que esse sistema perdeu para aquele outro, que ganha as ruas e não respeita muros; retratando a tragédia capital de um tempo que paga com vidas o preço do tráfico. Esses jovens estavam fazendo a intermediação do repasse em áreas do bairro da Jatiúca, abastecendo o amplo comércio que a classe média sustenta.

O perfil quase uniforme de meninos da periferia, pelo traje, pela cor, pela postura de quem vive sem ter o que conquistar do lado de cá, encontrando lá, a ilusão do acesso ao atraente dinheiro “fácil”.
Não há ilusão também aqui. Quando esse sistema desigual e desumano perde essa juventude por não lhe oferecer o direito de sonhar, aquele outro traga e não devolve vivo. Destitui as noções de família, de felicidade e sobre o soterramento daquilo que chamamos de valores constrói outros códigos.
Não é apenas porque não tem vergonha que um jovem cai nessa armadilha, é porque não tem moradia digna, escola decente, assistência médica pontual, auto-estima trabalhada para o exercício da cidadania, com perspectivas de futuro. É porque não tem lugar para eles nas poltronas do sistema que nos ilha, nos bloqueia, nos corrompe em mundos particulares entre a lei da força e a força da lei.
A cena degradante não atiça em mim a revolta comum contra os ilegais servidores do tráfico, mas o lamento profundo, porque essas perdas são societárias. Entre eles pode estar uma inteligência promissora, um futuro cidadão desviado do caminho, ou apenas um menino que perdeu a infância sem saber o que era brincar de viver. Agora prestes a compor as fileiras dos aprendizes de bandido que desde então vão esfriando a alma.
Por essa razão eu não acredito em ressocialização. Compreendo a sociabilidade dos dois lados do sistema, o de cá, onde tentamos cumprir um programa de sobrevivência na dialética da sociedade do consumo e seus valores; e aquele sistema gerenciado pelo tráfico, dando respostas imediatas na promessa de uma vida fugaz, corrompendo e armando nossa juventude.
Não há ninguém bonzinho ocupando as principais cadeiras nos dois lados da sociabilidade! A corrupção e a violência grassam e esbajam sangue em todas as relações desiguais, onde há exploração e lucro de uns sobre o suor e as lágrimas de muitos.

SOBRE O AUTOR

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