TJ: pagamento de 'precatórios ilegais' deu prejuízo de R$ 1 bi a Alagoas

Tribunal diz que lei editada há nove anos privilegia e causa rombo nos cofres; PGE defende 'saída jurídica'

Dados do setor de precatórios do Tribunal de Justiça indicam que os cofres públicos de Alagoas perderam, em nove anos, mais de um bilhão de reais com pagamento de créditos, sem nenhum controle, mas amparados pela lei 6.410/2003- a lei criada na era Ronaldo Lessa para, segundo discurso da época, legalizar a situação dos créditos que não viraram precatórios e atrair “dinheiro novo”, de indústrias, com descontos no Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS).

Por outro lado, a Procuradoria Geral do Estado trata a edição desta lei como a solução de parte das dívidas do Estado com servidores públicos. E Alagoas assiste a valores assustadores de créditos, pagos a funcionários: alguns na casa dos milhões de reais. A própria PGE admite que os cálculos destes valores não são feitos por ela, mas pelas secretarias da Fazenda e Gestão Pública.

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Os dois órgãos têm as fichas funcionais dos servidores- ou seja, tudo o que eles receberam do Estado em determinado tempo de trabalho.

A partir desta ficha é calculado o crédito ou o precatório- o crédito transitado e julgado nas estantes da Justiça. Difícil não acreditar que o pagamento destes créditos- algo blindado de informações e quase sem nenhum questionamento jurídico ou chances de transparência- não dê espaço a casos de corrupção.

Só que a forma como Alagoas resolve suas pendências com os créditos, que sequer viraram precatórios, despertou o interesse do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Graças ao péssimo exemplo que Alagoas ofereceu ao Brasil- milhões de reais pagos a servidores públicos que, mesmo que trabalhassem 200 anos nunca deveriam receber, por exemplo, R$ 4 milhões- fez o juiz responsável pelo setor de precatórios do TJ, Diógenes Tenório solicitar informações sobre pagamentos em duplicidade destes valores.

“É possivel, sim, que Alagoas tenha pago a servidores até duas vezes. E isso é ilegal. Créditos que viram precatórios só podem ser pagos uma vez”, disse Tenório.

É possível que membros da magistratura tenham recebido estes valores duplicados? “É possível, mas não temos como dizer quais são os casos”, respondeu o juiz, que também é auxiliar da Presidência do TJ.

O assunto voltou às rodas de conversas dos corredores do Tribunal de Justiça esta semana. Em artigo escrito na Gazeta de Alagoas, o desembargador aposentado Antônio Sapucaia da Silva quer receber, em vida, dinheiro de créditos a que tem direito.

Procurado, Sapucaia não quis conversar. Mas, nos bastidores do TJ sabe-se que ele, assim como milhares de servidores- serão obrigados a aderir à lei imoral de 2003 para receber seus créditos. Ou seja, bater na porta de grandes empresas, vender os papeis, ter um deságio de 70% e receber 30% dos valores.

Neste jogo, é claro, prevalece a cruel desigualdade: o prestígio do cargo conta na hora da negociação dos créditos. Um professor ou um policial militar não tem o mesmo mérito, ao bater nas portas de multinacionais como OI ou TIM, por exemplo.

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