Pensar o Brasil parece coisa do passado. Já não oferece nenhum tipo de status, ao mesmo tempo sugere tantos desenganos que as vozes comuns passam a temer o adoecimento, o isolamento, e ninguém quer clamar no deserto. A voz ululante do consumo via internet distribui determinismo alienante e também sugere que isso nos basta.
Mas não é verdade. Todo determinismo é feito de más intenções. Precisamos enfrentar essa onda e pensar nosso país enquanto estamos nele.
Neste momento histórico, em viagem pelo Sul do Brasil, posso me qualificar como testemunha do evento da última hora, aquele que chamaram de extremismo climático. Quando em uma tarde passeava por uma avenida de Florianópolis, capital de Santa Catarina, e na outra a vi em forma de rio caudaloso, apresentando pontos com redemoinhos fortes.
Além de acompanhar as diferentes reações da população local, percebemos que muitos estudiosos de diferentes áreas se pronunciam nas redes sociais associando o caos climático ao fazer humano e suas escolhas de fundamento capitalista também extremo.
Como não levar o pensamento para o Nordeste?
Como não lembrar que a distopia sobre a função do poder assola também nossa capital alagoana, Maceió, e todos os municípios do estado?
Como esquecer que a maioria dos prefeitos alagoanos vendeu a concessão da distribuição de água para as torneiras dos munícipes e com isso adquiriram bens valiosos, segundo comentam as próprias vítimas, em estado de admiração? Como esquecer que essa água não está chegando nas torneiras?
A democracia frágil e ferida que temos em vigor no país permite que qualquer pessoa complete os mínimos requisitos para se apresentar como representante de um povo e dominar histórias com acesso a fundos públicos. Não há um rigor que exija formação séria, histórico de envolvimento com pautas comunitárias, e neste vácuo, o que cresceu como condição mor foi ter dinheiro para comprar votos.
A própria justiça eleitoral ajuda a manter esse processo transformando o tema em tabu, fingindo que isso não acontece enquanto fecha os olhos para os fatos. Falar sobre isso é arriscado, porque não há nos poderes constituídos uma seriedade capaz de levar a justiça a considerar as variáveis que mantém a prática funcionando com pleno vigor.
Pessoas sem escrúpulos e desprovidas de senso comunitário estão assentadas em tronos de poder, tomando decisões que as beneficiam e condenando as populações do nosso grande Brasil a pagar o preço da disfunção pública que exercem.
Vereadores que mal sabem soletrar o próprio nome aprenderam a enriquecer pelas vias da política apoiando prefeitos que descaracterizam a democracia e transformam os espaços públicos em empresas familiares. Nestes ambientes pobres de políticas para as cidades e seus moradores não existe a mínima possibilidade de discutir casos relacionados ao clima.
As enchentes se transformaram em certeza de dinheiro novo, sem muita burocracia, vindo nas ondas da calamidade pública, e os prefeitos desejam que estes eventos periódicos possam acontecer em suas gestões. Não importando considerar nenhuma política preventiva.
A seca de água provocada pela venda de concessão pública da distribuição do líquido essencial não foi ruim o suficiente para evitar a reeleição dos vendilhões da paz familiar.
O país conta com uma leva imensa de péssimos prefeitos reeleitos.
A crise climática não é pauta de nenhum tipo de governo no país.
Os efeitos destas crises estarão maior a cada tempo. Alcançarão todas as vidas. Não serão contidos pelas barreiras de classe em todas as ocasiões. Somente aí perceberemos que a existência terrena precisa se tornar um grande acordo comunitário?
Pensar nosso lugar de morada será essencial para podermos viver nele e acreditar que os nossos descendentes terão chances de prosperar. A Terra não é um produto. A vida não é uma mercadoria. Se pela política tudo se ameaça, pela política tudo poderá ser ressignificado e quiçá, salvo, um dia.