Sair do sufoco para voltar a investir

Lucien Belmonte- Correio Braziliense 

Depois de a indústria amargar elevação de custos de mão de obra e de energia na ordem de 100% nos últimos 10 anos, não deveria surpreender a queda de 2,7% nos índices de produção em 2012, o pior resultado desde a crise internacional de 2009, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. A retração reflete as condições adversas enfrentadas em particular pelos setores intensivos em capital. Os fabricantes de vidro plano conhecem bem essa situação. Enquanto o preço final do produto diminuiu 11% desde janeiro de 2011, os preços médios de dois de seus principais insumos produtivos — gás natural e barrilha — tiveram aumentos superiores a 60% e 35%, respectivamente, na mesma base de comparação.

A indústria nacional não tem problemas de produtividade, de eficiência ou de qualidade. É forte e criativa para encontrar novas formas de se tornar mais competitiva. Opera, no entanto, em um país que não é para amadores: além dessa alta significativa de custos, tem sido obrigada a lidar com condições regulatórias altamente desafiadoras, que compõem um quadro dramático quando combinadas com o “salve-se quem puder” do cenário externo.

Indústrias de países competidores como o México e a Turquia contam com gás natural a custos da ordem de, respectivamente, US$ 5 e US$ 8,50 por milhão de BTU, contra a média de US$ 14 praticada por aqui. Pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) mostra que esse tipo de diferença tende a pressionar a balança comercial brasileira, para um deficit do setor de vidro da ordem de US$ 2,3 bilhões por ano. Por outro lado, a redução do preço médio para US$ 7 por milhão de BTU permitiria que o setor conhecesse um superávit de US$ 500 milhões.

A desvalorização artificial das moedas dos Estados Unidos, do Japão e da zona do euro também prejudica as exportações brasileiras. E, para completar, a China fecha os olhos para os impactos ambientais de suas indústrias, enquanto subsidia diversos setores produtivos, contrariando regras do comércio internacional.

Evidentemente que não defendemos a adoção de subsídios. Mas é importante ter em mente esse quadro para avaliar a situação do Brasil, pois compromete cadeias produtivas inteiras. Afinal, quando o fabricante de janelas opta por comprar vidro importado, acaba importando janelas completas, ameaçando toda uma cadeia industrial de agregação de valor e geração e de emprego e de renda que vai muito além da transformação de areia em vidro. Da fundição do alumínio à confecção das molduras, da produção de parafusos à de revestimentos de borracha e espuma, passando pela montagem e finalização, toda a cadeia fica comprometida.

Nesse contexto, a adoção de uma lista de exceções à Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul, com o aumento das alíquotas de importação para até 25% sobre uma lista de 100 produtos, e a redução do custo da eletricidade, que entra em prática este mês, são um alento para a indústria nacional. No primeiro caso, trata-se de legítima defesa comercial, uma vez que as medidas estão amparadas pelas regras do mercado comum e da Organização Mundial do Comércio (OMC) e podem, portanto, ser usadas para auxiliar a minimizar o desequilíbrio de competitividade aqui verificado.

Em relação à energia, o corte de encargos do setor elétrico e a redução dos custos de transmissão da indústria aliviam parcialmente as condições das fábricas. O custo do gás natural é outra frente que deve ser atacada. A retomada dos leilões de áreas de exploração e produção de petróleo e gás indica que pelo menos existe uma boa vontade de se buscar um aumento de competitividade nessa área.

Dentro de alguns anos, quando analistas e pesquisadores avaliarem a situação da indústria brasileira neste início de década, certamente reconhecerão a importância das medidas tomadas no último ano para estimular a recuperação industrial e, consequentemente, retomar o ciclo virtuoso da economia. A indústria brasileira demonstrou em diversas ocasiões que pode investir, inovar e melhorar sua competitividade em relação aos competidores internacionais. Mas, no momento de grave crise, primeiro precisa encontrar condições de sobrevivência.

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