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Quem vai salvar a educação brasileira?

A educação de uma nação é por certo, a pedra de toque do seu presente e futuro.

Tão importante para questões óbvias e fenomênicas, como civilidade, desenvolvimento, convívio social e preparo para o mercado de trabalho, tem imenso valor no lado invisível que permite aos sistemas políticos firmarem direcionamentos. O impacto ideológico.

Não foi por outra razão, senão esta última, que vimos no Brasil o crescimento de ideias que a princípio pareciam risíveis, ridículas, bobagens de gente esquisita, repentinamente, ganhar corpo discursivo na luta pela hegemonia de uma compreensão educacional que combate valores humanos e cidadania.

O imaginário do povo brasileiro estava sendo disputado!

O cenário para o balcão de negócios com as escolas públicas estava sendo construído.

Os artesãos da desdita eram políticos conservadores e líderes religiosos tradicionais, que na reversão dos dias, se alocaram nas fileiras bolsonaristas. Mas com este filão promissor, mesmo alguns políticos contrários aos clamores da extrema-direita, e, reconhecidamente liberais, também demonstraram largo interesse.

A privatização de escolas públicas e sua substituição por escolas cívico-militares se tornou realidade no Brasil.

Mas educação também não se faz apenas com prédios escolares, existem camadas de sustentação teórica orientando as práticas educacionais. E neste contexto político brasileiro malsão, os professores e pesquisadores seguem cumprindo a missão de oferecer o melhor em termos de conhecimentos, para favorecer o desempenho de professores e estudantes, na perspectiva de um país democrático.

Em uma rara oportunidade, no município de Maceió, pudemos ter na mesma mesa de debates educacionais dois nomes incríveis, duas pessoas com histórico de peso nas áreas das teorias educacionais brasileiras, José Carlos Libâneo (PUC-GO) e Marilza Vanessa Rosa Suanno (UFG), com a temática: Sete saberes, escola e pobreza na realidade brasileira: Que ensino? Que conteúdo? Que estratégias metodológicas?

O diálogo entre as duas celebridades acadêmicas foi fluido.

Libâneo explicava que “as articulações entre transformações sociais e pessoais são propostas pelo método dialético a partir das noções de procedimentos conceituais”, “reconstituindo passos de um processo investigativo, a desenvolver capacidades e modos de agir”.

“Didaticamente pensar, planejar, dialogar com uma criança que aprenda a produzir”. O conhecimento como rota de crescimento e apropriação dos saberes para a vida, a humanidade.

Para vencer a cegueira trazida pela ignorância ou pelo modo que utilizamos o próprio conhecimento, admite que os “limites disciplinares do currículo demandam a complementaridade do ensino transdisciplinar”.

Eles não concordam em tudo, mas também não precisavam concordar. O diálogo é ponte que une lados, cria conexões. Eles dialogavam sobre educação no país que está sendo atingido no cerne dos seus sistemas educacionais, e a plenária acompanhava, envolvida.

Marilza trouxe Edgar Morin em sua base teórica: “Morin concorda com o diálogo, com o pensamento crítico e dialético, mas propõe uma epistemologia da complexidade”.

“Extrair dos conteúdos as capacidades e habilidades que podem ser desenvolvidas”.

“Religar conhecimentos e pensar complexo. Produzir conhecimentos que gerem transformação na vida e nas pessoas. Não separar a necessidade de transformar a sociedade da necessidade de transformar a si mesma”.

Explorou aspectos que conseguem ir além do disciplinar: “autoformação, heteroformação e ethosformação”.

Ambos discorrendo sobre perspectivas nobres inseridas no fazer educacional, sob orientações que se pretendiam complementares, partindo da dialética e da complexidade de educar.

Sem dúvida, uma amostra do bom trabalho acadêmico na estrutura educacional brasileira.

Contudo, o ponto culminante deste encontro entre currículo, dialética e olhares multidimensionais foi a adesão de ambos a um repúdio ao momento conjuntural brasileiro que permite a negociação de escolas, a venda de prédios escolares estaduais, a destruição da identidade democrática das escolas públicas para torná-las militarizadas, por compreenderem a imensa ferida que estes gestos políticos autoritários e liberais causam no cerne da educação brasileira.

Sem educação pública de qualidade, democrática e acessível aos filhos dos trabalhadores brasileiros, o retorno dos processos escravagistas insinua outras formas de legalização da exploração humana, pela desqualificação da mão-de-obra e coerção histórica ao não-saber civilizatório e emancipatório.

A égide de um sistema teocrático, expandido em fundamentalismos tem sido parceira deste propósito.

Na história, o poder serve ao poder, e para manter tal conjuntura utiliza acessórios ideológicos.

Grande parte do povo que está perdendo direitos, está apoiando estas perdas, porque o terreno foi preparado com o ódio ao conhecimento, à escola e aos docentes.

No Brasil onde Libâneo e Marilza trabalham, inúmeros combatentes da educação libertária atuam diuturnamente no combate à educação.

E nós, onde estamos? Quais posicionamentos políticos adotamos? O que estamos fazendo para colaborar com este momento histórico?

Sigo escrevendo.

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