Quem será maior ou menor culpado?

Ana Cláudia Laurindo fala do desabafo do secretário de Defesa Social, coronel Dário César, sobre a prisão de um menor acusado de decapitar uma dona de casa, no conjunto Carminha

Ana Cláudia Laurindo- Cientista Social

Eis que o contexto da indignação toma corpo em Alagoas, ganha os átrios institucionais, se esparrama na mídia e levanta considerações acaloradas sobre direito e justiça! Representantes dos Direitos Humanos participam do debate.

Em meio a todos os riscos que possam envolver as expressões do pensamento que, como cientista social e cidadã eu expresse, a mãe de Alexystaine estará falando aqui, mais uma vez.

A turbulência e a dor não significaram jamais o aparte da lucidez, fincada no chão das responsabilidades sociais que cumpro e no exercício da cidadania que exijo, ainda que sob penalizações severas, do ponto de vista da indiferença e impunidade que obtive como resposta à luta empreendida. Ficando em muitas situações, frente a frente com a violência institucionalizada, estatal, medindo forças comigo.

Quem ganhou ainda não sei.

Já escrevi antes sobre a ingenuidade das propostas de ressocialização de menores, quando afirmo que os mesmos estão socializados, sob outros parâmetros de socialização. Se a sociedade burguesa não modificar os conceitos excludentes que legitimam os acessos de alguns aos mecanismos de poderes, continuará a ver o impasse crescendo.

Mas pretendo focar o debate em Alagoas, nas análises sociológicas de alguns jornalistas e no desabafo do secretário por uma justiça que não poderá ser efetivada porque o matador tem 17 anos.

Está há um ano de distância da maioridade penal brasileira, mas talvez tenha crescido envolto nos valores que regulam o mundo do crime, e sabe que até lá poderá contar com um manto de proteções legais criado pelos padrões burgueses de aplicação da lei, segundo alguns bem intencionados operadores do direito e representantes de segmentos civis.

Não estou discutindo o certo e o errado, insisto na defesa do debate amplo, sem ofensas pejorativas aos divergentes, sem acusações de senso comum a quem ousa assumir o que pensa publicamente, pois todas essas reações definem coerção, o que não caracteriza um elemento saudável de construção do pensamento social.

Volto ao caso de Alexystaine, o vejo aos 12 anos de idade perdendo todos os referenciais de menino de classe média alagoana numa trágica noite de tortura por agentes de segurança pública, motivada pelo arremesso aleatório de uma pedra usada para consertar uma corrente de bicicleta, que atingindo o carro da guarda-municipal de Matriz de Camaragibe, em 30 de agosto de 2007, não gerou nenhum dano material.

Desde perseguição e atropelamento, agressões físicas, algemas com os braços para trás e revolver na cabeça, à passeio de camburão e prisão em cela de adultos mais ofensas graves por parte do delegado, configurando violência bárbara por mim denunciada aos órgãos que se apresentam como competentes para o caso.

Não tenho sequer uma linha escrita com pronunciamentos dos órgãos representantes dos Direitos Humanos locais, embora tenha as cópias de todas as denúncias protocoladas. Será que essa indiferença foi aleatória também? Ou será que agiram dessa forma por envolver agentes de segurança pública, entre eles nomes conhecidos por históricos de tortura e outros males?

Eis a questão que põe muitos discursos na berlinda. Não há vigor de enfrentamento das estruturas, os males são conhecidos pela maioria, mas há um acordo tácito para a preservação do erro, do mal institucionalizado.

Como cientista social percebo as cortinas de fumaça e a fragilidade das falácias politicamente corretas, que tem servido para muitos representantes dos Direitos Humanos locais ocuparem cargos reverenciados pela sociedade e pelos poderes.

Indico, inclusive, que possam atuar mais amplamente, pois não são apenas as discussões que envolvem o sistema prisional objetos de atuação do direito do ser humano.

Voltando à história de Alexystaine, faço um rápido registro da procura que fiz ao Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, saindo de lá com uma enorme lista de documentos que precisava levantar para poder acionar o conselho, o que na circunstância tornou-se inviável, e para este órgão nada aconteceu, mesmo eu tendo levado as denúncias protocoladas e até um artigo publicado em semanário local.

Se for interessante tentar desqualificar esse registro chamando de desabafo, que assim o façam, contudo, reafirmo que não será por melindre pessoal que deixarei de pontuar os desafios que a sociedade brasileira e alagoana precisa vencer para ter o vigor de falar em justiça, sabendo bem o que está dizendo, a partir do que esteja fazendo.

Como cidadã, reitero que para nossas famílias desfalcadas o que menos importa é o brilhantismo dos discursos improfícuos, enquanto nossos filhos e filhas estão sendo assassinados e a impunidade prevalecendo.

Quanto ao distinto secretário, compreendendo seu afã por justiça, faço votos de que consiga empenhar-se também naqueles outros casos de crimes e injustiças que conhece e tem poder de intervir, fortalecendo inclusive a corregedoria da polícia civil, que deve ir além do corporativismo para que a sociedade seja verdadeiramente protegida do crime.

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