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Psicólogos: a história não redime responsabilidade

No século XIX a Psicologia chega ao Brasil entrelaçada com os dogmatismos europeus e embalada no colo dos filhos de latifundiários escravagistas. Aqueles que sempre traziam as boas novas europeias, com tons de modernidade e crescimento, para a terra brasilis incivilizada e redoma de atrasos.

Sob o porrete da ordem, o conhecimento psicológico, tal como a época sugeriu, apregoava disciplina, norma e moral.

Afinal de contas, era convenção manter as correntes e o pouco avanço para entreter as classes dominantes com os alienados, doentes da alma. Os estudos reuniram força entre os ricos que, donos da higiene mental, rogavam a pureza de espírito aos loucos.

O espectro elitista da Psicologia dourou na panela da academia e o século precisou caminhar para que os psicólogos se revoltassem contra a ordem ascética estabelecida nas instituições.

Novos ares surgem antes de 1964 e se escondem, assustados, até a metade dos anos 70.

O recomeço, o progresso, os sonhos e a utopia retornam a vida estudantil que anuncia o nascer do sol da democracia. Esquerdistas, progressistas e feministas assumem os debates das humanidades e cresce forte os brotos da revolta contra a ordem.

Chegamos aos 80. Efervescências intelectuais dão as mãos para uma nova Constituição. Nela, os psicólogos fariam parte dos debates sobre saúde e direitos civis. Avançamos. Nos profissionalizamos. Tomamos as instituições e nosso lugar ao lado do povo.

Será?!

Hoje o presidente diz que esquerdistas não são “normais”, evocando a ideia de patologia e desvio para subtrair o livre pensar e a iniciativa fortalecida da classe trabalhadora.

O que temos a ver com isso?

As energias intelectuais de 80 agora fazem parte daqueles que se levantam para proteger o que já foi construído. Com a retórica dos lutadores, alguns levantam o punho e dão as mãos em torno dos direitos adquiridos pela persistência.

A força e a robustez ideológica do poder dominante até agarrou alguns colegas de profissão que chegam a pedir cura para o que não é doença e mandar para a “terapia” os ruídos da crítica.

Nossa terapia é outra. Uma terapia que não cala, mas escuta. Que não reprime, mas liberta.

Se conseguimos crescer em meio as contradições marcantes da formação social deste país e desenvolvemos, aqui mesmo, com Silvia Lane e outros teóricos, uma retórica anticolonial, latina e brasileira, então temos mãos e ideias para emancipar as pessoas deste sofrimento histórico.

As contradições da história não diminuem nossa responsabilidade de reverter um quadro de discurso hegemônico que pesa contra a liberdade e o bem-estar psicossocial da maioria da população brasileira.

*Fontes:

ANTUNES, M. A. M. A Psicologia no Brasil: Um ensaio sobre suas contradições. Psicologia: Ciência e Profissão, 2012, vol. 32, n. 1, p. -44-65. (Disponível em plataformas de pesquisa online).

ALBERTI, S. História da psicologia no Brasil – origens nacionais. Mnemosine, 2004, vol. 1, n. 0, p.149-155. (Disponível em plataformas de pesquisa online).

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