Repórter Nordeste

Por que Mácleim merece ser ouvido antes de virar estátua?

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Olhos fechados. Meditação. Quatro anos depois de lançar “Esses Poetas”, um Mácleim toca no CD do carro. Vai e vem. Termina e começa. Recomeça. É mascado como um chiclete. Não perdeu o sabor, não virou bagaço de laranja. Nem rolete chupado de cana.

Carrega sua delícia. Um viço. É como um som gostoso nas papilas gustativas. Coisa de poeta.

Ainda tem na pureza dos arranjos e no frescor das composições dos vivos e dos mortos um disco atual.

O quê se pode dizer quatro anos depois? Bem, Mácleim- hoje um bom burguês, no ótimo conceito de Hermann Hesse- está em vantagem. Os 30 segundos que abrem a primeira música “Poema Nº 36, de Arriete Vilela” são tão parecidos com o break de uma certa TV alagoana que Mácleim parece ter feito um acordo com a própria consciência: “Deixa assim”.

Deixou assim em “Senhora dos Prazeres”. A música popularizou o poema. Ali é Alagoas. Você pode morar em qualquer lugar. Vai assistir na tela mental a Catedral, o farol da Ponta Verde, as igrejinhas nos chapéus do Guerreiro, o Bala na bateria…

É um hino de Maceió- em tempos de gestores com seus projetos mirabolantes, caros e cafonas no Alagoinha para suas vaidades serem eternizadas por mais de um dia.

“Senhora dos Prazeres” pode ser cantado no assobio- como Gonzaguinha queria que sua música fosse conhecida. Transcendeu Mácleim. Virou seu Bolero, aquele de Ravel- e não adianta ouvir “Zumbi” e o desejo de ser negro de alma branca (pobre Jorge de Lima, seria processado hoje por racismo) ou o “Quem?”, de Sidney Wanderley, e dizer isso ou aquilo. A faixa 12 do “Esses Poetas” vai além do místico.

O Ronaldo de Andrade teve sorte…

Numa entrevista, disse Mácleim- talvez com o charme próprio dos jornalistas- falando sobre o Zumbi de Lima: “Pois bem, eu costumo dizer que essa foi a única música psisongrafada do Esses Poetas, pois veio inteira, prontinha, e eu sem acreditar no que estava acontecendo”.

Charme de quem tem pé para sambar na própria passarela…

Bem, e depois disso? Se Macleim não sair da “vida sem reservas, mas que continua dependente da burguesia por sentimentos infantis”, diria Hesse, nosso Baudelaire alagoano poderá morrer consagrado.

E virar estátua- coisa que Graciliano Ramos odiaria, mas não dá para retirar da nossa psicologia a mania de transformar um morto expulso desta terra em um frio pedaço de bronze na direção do Lopana.

Mácleim em seu silêncio está disposto a enfrentar seu bom burguês e voltar à sua “intensidade vital”? Ou virar uma estátua indo tocar seu bolero no insidioso substituto do Alagoinha?

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