PB: Juiz faz greve de fome na cadeia

O juiz José Edvaldo Albuquerque de Lima, preso em João Pessoa durante a Operação Astringere no mês de abril, afirmou nesta terça-feira (6) que iniciou uma greve de fome na prisão neste final de semana. O magistrado disse que  pretende ficar sem se alimentar até que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) faça uma correição em todos os processos julgados por ele. Edvaldo é acusado de comandar um esquema de fabricação de multas judiciais, em conluio com advogados, que funcionava no Fórum de Mangabeira. Ele foi denunciado por formação de quadrilha, corrupção passiva e abuso de autoridade.

José Edvaldo está preso no Centro de Ensino da Polícia Militar em João Pessoa e usando um  telefone celular deu entrevista ao G1. O juiz questionou o fato de estar preso, segundo ele, o esquema desmantelado pela Polícia Federal durante a ‘Astringere’ nunca existiu e as acusações imputadas não possuem fundamento. Edvaldo acusou o desembargador Joás de Brito, que conduziu o inquérito judicial que resultou na prisão, de perseguição pessoal.

“Iniciei a greve de fome para chamar a atenção para o fato de nunca ter sido ouvido. Fui o único juiz no Brasil a ser preso sem nunca ter sido ouvido no inquérito”, disse Edvaldo. Ele afirmou que começou a greve no último domingo (4) e que por orientações médicas está  ingerindo apenas duas bananas por dia, uma no início da manhã e outra durante a noite, para não ter uma paralisia intestinal. “O que eu quero é que o CNJ mande alguém aqui para fazer uma correição em  todos os meus processos, para mostrar se eu protegi alguém. Se for encontrada uma falha em um processo meu, eu peço demissão do cargo”, declarou.

Apesar de estar usando um celular na prisão, José Edvaldo disse que não possui nenhuma regalia na cela e está tendo suas prerrogativas de juiz desrespeitadas . “Estou numa prisão comum, estritamente fechada. Estou desprezado. Estou como um cachorro”, declarou. O  magistrado ponderou que tem o direito de não ficar trancando, podendo inclusive ficar em uma cela aberta e circulando pelo local da prisão.

Sobre o telefone, o juiz admitiu que está cometendo uma irregularidade. “Estou usando, mas é de forma irregular. Se um bandido do (presídio) PB1 pode, por que eu que sou um juiz de direito não posso?”, indagou. O magistrado disse que seu filho levou o aparelho para o Centro de Ensino da Polícia Militar para que ele pudesse falar com a família e com seu advogado.

Edvaldo culpou o desembargador Joás de Brito por sua prisão. “Estou sofrendo perseguição dele por inimizade. Nós somos inimigos”, disse de forma taxativa. A suposta rixa teria começado quando Joás estava disputando a indicação para o cargo de desembargador e pediu apoio a Edvaldo, que por sua vez negou. Depois, segundo Edvaldo, Joás teria atuado para impedir que o magistrado fosse alçado a um posto em uma turma recursal do Tribunal de Justiça

O juiz tratou o ato da sua prisão como uma “arbitrariedade”. “Ele (Joás)  mandou ofício para que  o comando da  polícia me trate como preso comum”, pontuou.

Edvaldo também fez acusações contra os policiais que fazem a segurança do Centro de Ensino. Segundo ele, em função da greve de fome ele passou mal na segunda-feira (5) e ninguém lhe prestou atendimento médico. O juiz disse que é diabético e não teve um problema pior porque se medicou por conta própria.

Direção do Centro de Ensino nega greve de fome
O vice-diretor do Centro de Ensino da Polícia Militar, tenente-coronel Joselito Alexandre, afirmou que não tem conhecimento que o juiz José Edvaldo esteja fazendo greve de fome. “As informações que repassam para nós, através dos oficiais do dia, é que ele está se alimentando normalmente. Todos o dia tem um oficial, um tenente aqui que tira serviço 24 horas e nenhum deles chegou para mim para dizer que está havendo greve de fome”.

O militar negou que os direitos do juiz estejam sendo desrespeitados na prisão. “Isso aí não é com o Poder Judiciário, não é competência nossa . Foi uma determinação da Justiça para que ele ficasse trancafiado aqui. Estamos cumprido determinação da Justiça”, ressaltou. Ele ainda explicou que José Edvaldo tem direito à visita em mais de uma dia da semana.

O tenente-coronel disse não ter conhecimento do uso de telefones celulares por parte dos detidos e que não é permitido que os presos tenham esse tipo de acesso a telefones. “Não sabia que isso estava acontecendo e vou mandar verificar”.

O diretor destacou também que o Centro de Ensino tem normas que são cumpridas por todos os presos da unidade. “Aqui nós temos normas, normas geral de ação, que são estabelecidas para, por exemplo, quando algum preso é recolhido, tem a que disciplina os horários de visitas, os horários de alimentação. Aqui tem dias de visitas normais, como em outros presídios”, disse.

Em momento algum, de acordo com o oficial, foi negado atendimento médico ao juiz. Segundo o tenente-coronel Joselito Alexandre, quando Edvaldo passou mal um enfermeiro lhe prestou atendimento.

Ainda conforme o tenente-coronel Alexandre, José Edvaldo está dividindo cela com o delegado Edílson Araújo de Carvalho, também preso durante a Operação Astringere , e com o fotógrafo
Gilberto Lyra Stuckert Neto, acusado de matar  a professora universitária Briggida Rosely, sua ex-mulher.

O G1 entrou em contato com o gabinete de Joás de Brito no Tribunal de Justiça. Por meio de sua assessoria, o desembargador informou que não vai se pronunciar sobre o caso de José Edvaldo fora dos autos judiciais.

Entenda a Operação Astringere
A Polícia Federal prendeu em 18 de abril, durante a Operação Astringere, dez pessoas em João Pessoa e Brasília suspeitas de participar de um esquema que “fabricava” astreintes, multas em dinheiro definidas pelo magistrado para que pessoa ou empresa citada em um processo cumpra uma ordem judicial. A Operação foi deflagrada após solicitação da Justiça Estadual.

Segundo as investigações, o juiz José Edvaldo favorecia os advogados liberando alvarás com rapidez e definindo multas em dinheiro para aqueles que não cumpriam a ordem, segundo a PF.

O esquema de alvarás e astreintes acontecia sem nenhum conhecimento da pessoa responsável pela ação judicial ou por meio de ações promovidas em nome de “laranjas”, pessoas que não sabiam que tinham seu nome usado para promoção de ações judiciais,.

Na época o então superintendente da Polícia Federal na Paraíba, Marcelo Diniz Cordeiro, disse que a quadrilha agia de maneira organizada, podendo ser considerado um “sindicato” do crime.

“O juiz concedia alvarás com muita celeridade para os advogados que faziam parte do grupo com a intenção de proporcionar astreintes para uma das partes. O dinheiro proveniente destas astreintes ficava quase em sua totalidade com o advogado, que, em alguns casos, repartiam com o juiz”, explicou.

Fonte: G1

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