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‘Paranóia’ que assume Brasil em 2019 ameaça existência de serviços públicos

Josiane Calado

O Supremo Tribunal Federal (STF), em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), desenvolveu o VICTOR, ferramenta de inteligência artificial, que separa e classifica as peças do processo judicial, e identifica os principais temas de repercussão geral. Um serviço que durava 30 minutos ao servidor, é executado pelo VICTOR em cinco segundos. Para debater o futuro das carreiras do Judiciário Federal e a intervenção da categoria nesse processo, o Sindjus-AL convidou como palestrante do 5º Congresso Estadual dos Servidores do Poder Judiciário Federal (Congrejus), o servidor do TRE-SP Démerson Dias, então dirigente do Sintrajud-SP, que já auxiliou sindicatos e a Fenajufe na formulação e no debate de propostas para o Plano de Carreiras dos servidores do PJU. Ele alerta que a inteligência artificial, no caso do Judiciário, vai substituir praticamente toda a cadeia hierárquica, inclusive a magistratura. Veja abaixo a entrevista com o servidor:

*Que impacto implicará a inteligência artificial no trabalho dos servidores do PJU?*

Toda mudança ocorrida em termos de novas tecnologias implica em redução de salários, direitos e de postos de trabalho. No mundo do trabalho, quando começa a modernização através do uso de computadores, havia o digitador que era serviço especializado, trabalhava menos horas com salário geralmente superior ao antigo auxiliar de escritório. Hoje, passamos mais tempo digitando e ganhamos proporcionalmente menos.

Em toda a história da revolução industrial, existe um abismo entre as promessas e as realizações.

*A inteligência artificial vem para ajudar ou piorar a relação do trabalho?*
Nenhuma modernização melhora as relações de trabalho. Quando inventaram a linha de montagem, os trabalhadores tiveram que se adaptar à velocidade da máquina ou da produtividade. O que tende a melhorar é a organização, velocidade e margem de erro dos procedimentos.

*As carreiras dos servidores correm o risco de acabar?*

A primeira grande ameaça de extinção de carreiras ocorreu via terceirização. Mesmo com os alertas que fizemos, os próprios trabalhadores acreditaram que isso só ocorreria com os cargos que supostamente tinham menos complexidade. Deixamos de notar que toda mudança dentro do modelo capitalista é uma forma disfarçada de apropriação de riqueza. É preciso ter em conta que não se trata mais de risco e sim de promessa.

No caso do Brasil, a paranóia que deve assumir a condução do país em janeiro tem como premissa a desestruturação do serviço público, e isso deve ameaçar até mesmo a existência dos órgãos. A reforma trabalhista do Temer também é uma promessa de perda da importância da Justiça do Trabalho. Mudanças nas demarcações de terras, desmatamentos, proteção a grupos envolvidos em tráfico de drogas e até ameaças ao rito democrático apontam para um cenário de obsolescência de todo o Poder Judiciário.

Não sabemos em que prazo se darão essas mudanças, mas é certo que as carreiras ou os quadros que sobrarem terão importância e valor bem diferentes.

*Como deverão ficar os cargos de técnicos e analistas com a implantação da inteligência artificial?*
O CNJ projeta para 2025 o início da implementação dos modelos de inteligência artificial. É o ritmo e sucesso dessa implementação que vai definir o impacto real sobre os cargos. A atual geração de servidores já conviverá com a “concorrência” dos algoritmos de processamento.

*Por que é tão importante discutir a inteligência artificial no Judiciário?*

Estamos diante de um processo irreversível. Esse debate, embora importante, é inviável diante da velocidade dos avanços. O que é preciso antecipar é a forma como esses processos ocorrerão, e preservar ao máximo os direitos e interesses da categoria. O que nunca é discutido nessas horas é que com a redução de custos, esses avanços deveriam reverter também em benefício de quem trabalha, por exemplo, na redução de jornada. Mas o capitalismo trata a tecnologia como guilhotina.

O aspecto mais grave a meu ver é que somos convidados a trabalhar pela extinção dos nossos postos de trabalho. E alguns ainda consideram que fazer parte desse processo é um privilégio.

No caso do Judiciário, a inteligência artificial vai substituir praticamente toda a cadeia hierárquica, inclusive a magistratura.

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