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O trágico amor do maceioense

A força do capitalismo todos os dias reafirma o quanto a vida, as pessoas e o próprio planeta valem pouco. Parece contraditório para qualquer mente ingênua, mas essa tem sido a régua que está medindo o avanço da riqueza de poucos sobre as dores e perdas de muitos, desde o princípio, quando esse sistema se autointitulou  invencível.

Estudiosos afirmam que o capitalismo é incorrigível, ou seja, não melhora através de reformas e negociações de bem estar, contudo, existem versões predatórias ainda mais cruéis do que outras, dentro do próprio sistema.

Hoje desejo contemplar a alvissareira Maceió, e refletir um pouco sobre ela, desde as memórias da minha juventude bronzeada, a estes dias de pouca esperança que conduzem todos os olhares para a orla marítima elitizada, como refúgio, em busca de algum bom gosto por morar aqui.

Sem saudosismo desmedido, aquela cidade onde um dia eu também sonhei futuro já cambaleava entre mãos espúrias, ditando um amanhã de riscos e afundamentos, que hoje se concretiza nas áreas afetadas pela mineração.

Nunca tivemos por aqui bons políticos, tendo uma história ligeiramente marcada por nomes e rostos um pouco mais progressistas, que na esquina da carreira política acabaram por render-se ao mesmo nível de balcão, negociando destinos que não lhes pertenciam, mas ainda hoje tratam como próprios: a história dos seus eleitores.

Nestas plagas ambíguas, entre a beleza e o desprezo, o capitalismo arcaico encontrou o fio solto, e refaz a rota do futuro desde o presente, deixando a população acuada nas incertezas, com parcas informações sobre si mesma, Maceió dificulta estudos, levantamento de dados estatísticos e esvazia tentativas de observação oficial em caráter público sobre seus problemas urbanos.

Os que brincam de gestores, sempre foram perigosos para alguém, para alguma iniciativa libertária, para aqueles que consideram adversários.

Nas tardes em tons lilases onde a juventude da minha geração esperava  ônibus na Praça Deodoro, uma reunião de rostos tarjados por sobrenomes conhecidos anunciava continuidades no mando, na politicalha longeva, mantida sobre crenças legitimadas, sobre quem mandava em Maceió.

Crescemos e nos tornamos adultos, a maldição se confirmou, o povo também se conformou.

De líderes estudantis a grandes caciques negociadores, Maceió também gerou.

Agora é o tempo dos herdeiros. Eles jogam com o poder. Nem sempre com inteligência, mas como fiéis seguidores dos pais, dos avós, dos padrinhos. O arcaísmo maceioense parece aumentar. A infiltração fascista na política driblou os caciques, aproveitou a fresta bolsonarista aberta nas tradições, no fanatismo religioso, no analfabetismo político moralista.

Uma câmara de vereadores amorfa, interessada no vil, na vilania, com pouca dissidência. Na prefeitura um jovem vestido de velho burguês, ávido por representar o antigo que sequer conhece, mas sabe que rende privilégios e perpetua acessos.

Na disputa, a velhacaria disfarçada de sorrisos, com histórico simplista de compra e venda, promessas não cumpridas, ilusões que não convencem.

Entre bambus e coqueirais, a brisa que vem do mar toca o rosto do maceioense. Esquecemos que votamos, que defendemos partidos, que fazemos parte da tragédia social, econômica e cultural do lugar que amamos, porque precisamos viver com pouco, cada vez menos, até que a substituição da presença se consume.

É trágico ser maceioense.

É maravilhoso amar Maceió.

SOBRE O AUTOR

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