Nem todo bandido bom era bandido morto

A questão é da nossa miséria, separando os criminosos em melhores e piores

Odilon Rios
Do Repórter Alagoas

A passagem de José Azevedo Amaral- o coronel Amaral- pela área burocrática dos governos Divaldo Suruagy e Guilherme Palmeira- é largamente conhecida nos corredores da Delegacia Geral da Polícia Civil. Mas, como convém a tantos assuntos dos governos, não é exatamente explorada para a construção de outros parâmetros, além do mito que envolve o homem da tese “bandido bom, bandido morto”.

É nas eras Suruagy/Palmeira que se iniciam as atividades da gangue fardada- a organização criminosa do ex-tenente-coronel Manoel Francisco Cavalcante, com vasta ramificação nos corredores da Assembleia Legislativa e no Palácio Floriano Peixoto- a então sede do Governo. Como surgiu exatamente o mito Cavalcante na era Amaral? Não se sabe. Ou não se diz.

A tese “bandido bom, bandido morto” não é exatamente um testemunho dos tempos do coronel. Assim como nem todos os bandidos eram mortos.

O passado não era menos violento que o presente. Uma entrevista, guardada nos arquivos da TV Alagoas- do ex-cabo da Polícia Militar, José Gonçalves, de 1992 (ele foi morto em 1996)- faz uma menção aos líderes do sindicato do crime no Estado. E eles são os mesmos naquela época e hoje. E os apadrinhados deles- em especial no Senado Federal- são os mesmos.

Os cabelos é que ficaram mais brancos.

Há o exemplo de um ex-prefeito de Novo Lino, que enterrava pessoas vivas no cemitério da cidade. À noite, o cenário era macabro: o terror em se passar próximo ao local onde a terra gemia- o submundo mais bruto e fraco do ser humano.

Ou outro caso contado pelo jornalista Ródio Nogueira, decano profissional do jornalismo policial- cuja missa de sétimo dia será nesta segunda-feira, às 19h30, na igreja de São Benedito, Centro de Maceió.

Um homem “bandido bom” foi morto com vários tiros. Levado ao Instituto Médico Legal, o diagnóstico: morreu de anemia, sem citar a perda de sangue das balas que vararam seu corpo.

Ou o carro do IML que recolhia os tantos corpos dos “bandidos bons” espalhados pelas ruas lavadas de sangue em Alagoas. E derrapou no Centro de Maceió, escancarando as portas e deixando escapar os mortos- imagem de que o passado não era tão heróico ou pacífico como os saudosos do nosso faroeste teimam em lembrar.

E se o “bandido bom” fosse “bandido morto”, o que dizer do deputado estadual que atirou no deputado Humberto Mendes- morto a tiros no plenário da Assembleia Legislativa em 1957? Mortas as testemunhas pela velhice, o deputado assassino ficou impune.

Estaria ele fora da lista “bandido bom, bandido morto”?

Os bandidos eram separados por categoria social ou econômica. Os “bons” ou despossuídos- em linguagem moderna- eram mortos; os “maus”- afortunados- celebravam nos corredores da Secretaria de Segurança Pública.

Porque até na morte a nossa miséria separa os melhores e os piores.

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