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Não assistir “Divaldo” é uma postura política válida

Antes de qualquer abordagem decidi não assistir ao filme sobre a vida de Divaldo Franco, como postura política consciente. Me permito guiar minhas escolhas neste sentido pela representação política, sim.

Desde o instante no qual ouvi o próprio louvar Sergio Moro e uma tal República de Curitiba, em uma palestra que lotou o centro de convenções em Maceió, que repudio suas aparições, pois as mesmas se tornaram símbolo do apoio conferido ao atual contexto de miséria moral que afeta o Brasil.

As opiniões de um verdadeiro influenciador (como Divaldo Franco foi tornado pelos espíritas personalistas) refletem e irradiam indução ao voto e pensamento político, sim. Deste modo, reconheço que estou entre aqueles que não abandonaram a compreensão histórica e humanitária no território da vivência de fé, o que significa rejeição a tudo que os ícones bolsonaristas apregoam, desde o golpe de 2016, perseguição e prisão política de Lula, culminando com o apoio insensato a um presidente que veio para destruir.

Justamente por ser tratar de uma exposição romantizada da ideia de “espírita”, que também fortalece um direcionamento de idolatria que cristaliza alienações entre os adeptos – considerando este momento no qual o nosso país sofre as consequências do voto mal dado em forma de autoritarismo, miserabilidade, ataques à cidadania e liberdade de expressão, minha ausência nas salas de cinema onde o filme esteja sendo apresentado, é protesto.

Quando um filme com este perfil é lançado, tenho que analisar quais são os interesses políticos que movimentam.

Toda arte cinematográfica é política.

Com a supremacia da inclinação direitista que risca o movimenta espírita brasileira, fazendo com que grande parte acredite que apenas os conservadores, tradicionais, afeitos ao patriarcado branco possuam legitimidade representativa, não posso me permitir adocicar posturas e análises, sendo firme em convicções, por amor.

Apenas por amor, nos deixamos guiar pela razão que nos capacita para escolher qual fileira merece nossa adesão consciente.

Como espírita progressista, prefiro assistir Kardec.

No atual momento brasileiro, como cidadã, prefiro assistir Bacurau.

Isto não é desmerecer nada do passado de Divaldo Franco, nem seu trabalho assistencial na Mansão do Caminho, mas reafirma a crítica a um movimento que luta para conservar estruturas arcaicas e se nega ao questionamento.

Por trás das falas românticas de muitos que se autodefinem cristãos espíritas no Brasil contemporâneo estão os gestos de arminha que agora sustentam o horror nas comunidades cariocas, enquanto a elite desfruta de conforto material e apaziguamento moral por suas omissões.

Quem sai das salas de cinema tocado emocionalmente pela história de um homem e de um cenário montado para convencer de que o “inimigo” está sempre desencarnado e obsidiando os “escolhidos”, tem forte tendência a evitar a compreensão do caos social como resultado do voto.

Não estarei na expectativa de apoio ou rejeição por parte dos leitores, quanto a esta decisão de caráter pessoal. Apenas a exponho com a convicção legítima de que tenho direito a me posicionar criticamente, e assim o faço.

Quero arte que alimente o ideal de um país que supere a necropolítica de Bolsonaro e nos abra a perspectiva da fé com justiça social, cidadania e amor.

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