Nações mais ricas, armadas e endividadas perdem a guerra para um vírus

José Menezes Gomes (professor da UFAL, coordenador do Núcleo alagoano pela auditoria cidadã e membro da Rede de Cátedras sobre dívida pública)

Neste momento marcado pela eclosão de mais uma etapa da crise capitalista, onde a ocorrência da pandemia dá um contorno ainda mais dramático do que a crise de 2008, temos um grande paradoxo: as nações mais rica do mundo, mais armadas e mais endividadas passam a ser recordistas de morte pelo coronavírus. Aqui veremos com mais detalhes o fato dos Estados Unidos possuírem o maior orçamento militar do planeta e o maior número de bases militares nos mais variados países, além do domínio sobre os principais meios de comunicação do mundo, enquanto ocupa o primeiro lugar em mortes.

Vale lembrar que este vírus teve incio na China e rapidamente se propagou pelo mundo, especialmente nos países que resistiram em colocar em prática o isolamento social.

Todavia, o combate ao vírus não se faz apenas com a declaração do isolamento social, mas da eficácia das politicas sociais, com destaque para a politica de saúde pública adotada ou não.

Na China tivemos a combinação da politica de isolamento social com a intervenção de politica de saúde pública, que acabaram gerando meses de paralisação econômica e de controle da pandemia, que resultou num número de 81.953 infectados e 3.350 mortos, numa população de 1,400 milhão de habitantes.

Na primeira semana de abril a China começou a flexibilizar a quarentena, mesmo com o risco de nova contaminação, especialmente dos vindos de fora do país.

Enquanto isso, os EUA, que num primeiro momento tinham resistido a adoção da quarentena, assumem o primeiro lugar no número de mortos de 18.961 de um total de infectados de 503.177, mesmo tendo feito teste em 2.538.888,00 habitantes, de uma população de 328 milhões. É importante lembrar que a maioria dos mortos são negros e latinos americanos pobres. O segundo lugar, vem da Itália com 147.577 infectados e de 18.849 mortos de uma população de 60 milhões de habitantes e com 906.864 de testes realizados.1

O terceiro lugar, vem da Espanha com 161.852 infectados com 16.850 mortos de uma população de 47 milhões de habitantes, com 355.000 testes realizados.

Em quarto lugar, temos a França com 124.869 infectados com 13.197 mortes numa população de 67 milhões de habitantes, onde 333.807 fizeram o teste.

Em quinto lugar temos a Alemanha com 122.855 infectados e 2.736 mortos numa população de 83 milhões habitantes, onde 1.317.887,00 foram testados. Entre os mais atingidos não estão os países mais populosos, mas os países que fazem parte do G 7, países ricos do mundo e que juntos concentram grande parte do PIB mundial e dos gastos militares.
Especialmente nos países que compõe a União Europeia, com a exceção da Alemanha2, temos os países que são praticantes da politica de austeridade que fundamentou a criação da União europeia e do Euro. Enquanto seus vizinhos, Itália, Espanha e França, ultrapassam os 10 mil mortos cada, a Alemanha chegou a 2.500.

Por outro lado, os Estados unidos, que gastam por ano acima de US$ 700 bilhões ou R$ 3,6 trilhões com o orçamento militar e gastaram trilhões de dólares com a salvação de grandes empresas e grandes bancos na crise de 2008, não tem o desejo para bancar um sistema saúde pública, nem mesmo para 29 milhões de americanos que não dispõem de plano de saúde privado e que estão ainda mais vulneráveis a propagação dessa pandemia.

Dessa forma, a vulnerabilidade estadunidense no sistema de saúde pública acaba por fragilizar a sua gigantesca máquina de Guerra, como ocorreu com o Porta aviões nuclear Theodore Roosevelt 3 quando 550 militares foram contaminados. Neste episódio o Comandante foi destituído da função, porém aplaudido pelos ex-comandados, por ter autorizado a evacuação imediata de todos os tripulantes. Tal contaminação também ocorreu num Porta aviões Frances, neste mesmo período.

Este país que se caracteriza pelo extremo neoliberalismo e gasta do seu orçamento grande parte dos recursos com a corrida armamentista e com o pagamento do serviço da dívida da maior dívida pública do mundo com 100% do seu PIB, enquanto permite a saúde ser um grande negócio, o que compromete um efetivo combate ao coronavírus.
Neste momento é importante perguntar a serviço de quem estão essas máquinas de guerra que podem destruir o planeta 17 vezes? Historicamente sabemos que as respectivas máquinas de guerra estão a serviço das grandes corporações monopolistas, que usam seus respectivos estados nacionais e o dinheiro público para a disputa pelo mercado mundial, enquanto negam a maioria da população os direitos mais básicos, especialmente na fase neoliberal. Foi assim na Primeira e Segunda Guerra, durante a Guerra fria e nos dias atuais.

No caso estadunidense esta máquina de guerra sempre esteve na organização e de apoio a golpes militares, especialmente na América latina, para imposição de governos comprometidos com a opressão dentro de cada país e da transferência para os grandes grupos monopolistas de parte a riqueza aqui extraída.
Todavia, apesar dos países do G 7 terem um elevado gasto militar trata-se de uma tendência mundial. Segundo o Instituto de Pesquisa sobre a Paz Internacional de Estocolmo, o gasto militar mundial em 2015 foi de US$ 1,7 trilhão ou R$ 8,5 trilhões. Este valor era muito próximo do PIB de US$ 1,6 trilhão ou R$ 8,3 bilhões, quando o Brasil era a sexta economia do mundo. Estes valores se referem a soma anual de tudo o que os países gastaram não apenas com guerra e aquisição de material militar, mas também na manutenção de pessoal – incluindo pensões, que ocupam uma grande parte dos orçamentos militares4. Segundo esta mesma fonte se esses governos destinassem 10% dos gastos militares anuais para o combate à pobreza e à fome, os problemas estariam resolvidos até 2030, com as metas da ONU sendo atingidas. 5

Na pandemia atual para ser combatida com eficácia precisamos analisar porque uma grande parte da população mundial, independente de ser país desenvolvido ou subdesenvolvido, não dispõe de alimentação, habitação (para o isolamento social) e especialmente de água e sabão para que se possa lavar aos mãos e principalmente de um sistema de saúde pública que permita um acesso universal? A resposta a esta questão vem da própria lógica capitalista de enriquecimento privado e do empobrecimento social, somada ao processo de privatização de todos os serviços públicos, enquanto priorizou o pagamento das respectivas dívidas públicas e do crescente gasto militar. Se os países mais ricos estão assim, imaginem como esta tragédia poderá ser ainda mais amplificada nos países subdesenvolvidos?

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