Mês do Orgulho LGBTQ+ e as armadilhas da identidade em Maceió

Por Silvio Rodrigo

É importante o alerta: o movimento LGBTQ+ está em disputa em Maceió. Como nada escapa à expectativa midiática e eleitoreira em tempos de campanha, não é estranho perceber que os projetos de emancipação sexual e de gênero sejam alvos de oportunismos políticos e narrativas que comprometem e reificam o dia a dia da comunidade.

São feiras temáticas e empreendedoras, palcos festivos que comemoram expressões artísticas, tendas coloridas que afagam vivências dolorosas e realidades duras de exclusão, discriminações e preconceitos. Tudo parece caminhar para um universo mais inclusivo, mas será que ações pontuais e festivas são o suficiente dentro do nosso contexto?

Eis a grande contradição e talvez a mais fundamental para o homossexual na província alagoana: a identidade é armadilha quando o real se sobrepõe ao festivo. São sorrisos e comendas, grandes salões e fotos programáticas, mas a ação política dos governantes busca esconder os julgamentos efusivos nas câmaras e assembleias.

A juventude LGBTQ+, sobretudo as das classes mais vulneráveis, entra de forma subalterna no mercado de trabalho incipiente e compõe o setor de serviços com seus requintes precários de crueldade trabalhista. O telemarketing e empresas desalmadas adoecem a comunidade, no controle das necessidades fisiológicas, no assédio moral e ameaças, fora as extensas negligências trabalhistas que assolam a comunidade.

O setor de turismo, dono de um lobby poderoso na capital, planeja votos de inclusão aos recém-casados da comunidade gay, sob a venda de pacotes exclusivos de promessas “sem violência”, numa cidade perigosa a qualquer casal que ouse aparecer de mãos dadas nas ruas.

Na capital da província, o prefeito provinciano/religioso não mede esforços para acenar ao conservadorismo lgbtfóbico e fundamentalista evangélico. No mês do Orgulho, por que João Henrique Caldas, o JHC, não aparece em vídeo dizendo que é contra a homofobia?

Por que a Prefeitura de Maceió não estampa a bandeira da diversidade em sua conta de marketing oficial?

Por que JHC não aparece nos eventos bondosamente cedidos à comunidade LGBTQ+?

Para bons entendedores, as evidências são claras.

No campo progressista, outra mistificação acontece: “a plenitude do amor vai vencer o fascismo”. Apesar do efeito catártico da frase, a realidade não funciona desta maneira. Na dureza da política oligárquica alagoana e a disputa material pelo poder, qualquer violência – quando se torna necessária – tem o aval das famílias pretensamente senhoriais do estado.

Não há dúvidas, então, que o contraponto crítico deve se manter aos limites do amor político e da supremacia dos livros ao invés das armas. Ter a coragem de politizar o movimento gay é o mínimo que deveria ser feito neste momento histórico de tentativas de cerceamento das liberdades democráticas.

Mas o projeto político da identidade, o anseio pelas representações e por ocupar lugares nos limites da institucionalidade burguesa nos relegou órgãos sem orçamento no município, dentro do baluarte bolsonarista no Nordeste brasileiro e nos rendeu a promessas falsas de empreendedorismo social.

Em Maceió, só este ano, os assassinatos a homossexuais nos entristecem e nos causam revolta, fato que parece não abalar o sentimento narcísico do prefeito de Maceió e os órgãos públicos. Os tristes episódios e dores da comunidade gay de Maceió não podem passar sem repúdio.

Ainda mais grave, no entanto, é a tentativa oportunista da Prefeitura bolsonarista de Maceió de cooptar lutas e bandeiras políticas, suavizar aos olhos lgbtfóbicos a bandeira de cores vivas que representam a luta de trabalhadores e trabalhadoras da comunidade.

No mês do Orgulho, vale almejar um movimento contestatório da ordem heterossexual compulsória, de crítica ao modelo de sociedade que reafirma as opressões contra a comunidade, que precariza nossos trabalhos e vende nossa dignidade ao capital.

Não só de amores vivem os lutadores, então que a coragem que não nos falta seja o motor para se posicionar, para não entregar nas mãos do liberalismo cínico a direção política do Movimento LGBTQ+ em Maceió.

 

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