Marcelo Henrique: Reeleição e Honestidade

Marcelo Henrique

Na recente história política de nosso país, estaremos às voltas, mais uma vez, com a possibilidade de reeleição de administradores públicos, a nível municipal. Trata-se da viabilidade de recondução de prefeitos, sem a necessidade dos mesmos se desincompatibilizarem dos cargos de mandatários do poder executivo que já ocupam.

A situação fática envolve no âmbito da fiscalização dos entes e gestores públicos que, a nível local (municipal), situa em posição de primazia o Poder Legislativo a quem compete o controle externo brasileiro. Mas, como este não se encontra aparelhado, suficientemente, para esta missão, se vale dos Tribunais de Contas dos Estados e, em alguns entes federados, dos Municípios. Assim, no exercício do conjunto de atribuições constitucionalmente a ele delegadas, se verá diante da situação de examinar atos administrativos e contas públicas de pessoas físicas que, estando na atividade executiva, tentarão um novo e subsequente mandato.

Deste modo, as atenções devem ser totais para que não ocorra a utilização (indevida e ilegal) da máquina administrativa em seu benefício, na tentativa de cabular votos.

Portanto, a observação por parte dos cidadãos acerca da conduta gerencial dos administradores públicos é de capital importância, visando coibir qualquer atitude que, seja em nome próprio, ou sob a identificação do Poder Executivo Municipal, possa configurar o chamado abuso de poder econômico ou político, isto é, a utilização de pessoas, material ou órgãos e repartições públicos com o fito de obter vantagens eleitorais.

Assim sendo, o gestor público – isto é, o prefeito municipal – encontra-se submisso à força legal que lhe prescreve um comportamento obrigatório, lícito, franqueando-lhe determinadas condutas e proibindo outras.

Como é presente que a Constituição Federal, ao autorizar a reeleição para o período temporal subsequente ao atual mandato dos agentes políticos, em especial, para os Prefeitos e Vice-Prefeitos, permitiu aos mesmos a assunção de dois papéis diferenciados: a de atuais administradores públicos, titulares da chefia do Poder Executivo e a de candidatos para o próximo mandato, sem a necessidade (ou obrigatoriedade) de desincompatibilização dos atuais cargos.

Referida concessão constitucional implica, necessariamente, num sistema de contrapesos, fincado sobre um rol de proibições legais, capazes de, em tese, garantir que o administrador-candidato não se locuplete da função/cargo por ele exercida na atualidade como um trampolim político-eleitoral para alcançar um novo mandato.

A priori, poder-se-ia mencionar o cuidado do legislador em impedir que os administradores ímprobos ou incompetentes sejam reconduzidos ao cargo em disputa. Desta forma, a norma complementar definiu a inelegibilidade dos atuais mandatários, para os casos em que existir uma das seguintes situações:

a) a representação contra sua pessoa julgada procedente pela Justiça Eleitoral e transitada em julgado, no caso de processos de apuração de abuso do poder econômico ou político;

b) uma condenação criminal com sentença transitada em julgado, na prática dos delitos contra a economia popular, a fé pública, a administração pública, o patrimônio público, o mercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais;

c) o parecer sobre suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível do órgão competente, até 5 anos da data da decisão, salvo se a questão houver sido ou estiver sendo submetida à apreciação do Poder Judiciário; e,

d) um processo, com sentença transitada em julgado, contra os detentores de cargo na Administração Pública Direta, Indireta ou Fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econômico ou político.
Importante contributo à democracia e à legalidade do processo eletivo é dada, assim, pelos Tribunais de Contas, quando disponibilizam à Justiça Eleitoral, por força de dispositivo legal, a relação daqueles que tiveram suas contas (relativas ao exercício de cargos ou funções públicas) rejeitadas, por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível (no âmbito do Tribunal), ressalvados os casos em que a questão estiver sendo submetida à apreciação do Poder Judiciário, ou, que haja sentença judicial favorável ao interessado.

A prescrição legal tem o escopo de evitar que o mau gestor seja até mesmo candidato ao pleito eleitoral, abrangendo não somente os atuais mandatários que concorrem à reeleição como qualquer administrador ou responsável pela coisa pública de galgarem postos eletivos. Evitar referidos abusos é a valorosa missão dos Tribunais de Contas.

Vale lembrar, também, que, em suas atividades cotidianas de fiscalização dos entes e administradores públicos, como as inspeções ordinárias ou especiais, atos de ofício ou provocado por informações (até mesmo as originárias dos meios de comunicação de massa) e através de denúncias, as Cortes de Contas devem contribuir para a lisura do processo eleitoral, inscrevendo seu nome na história de nosso país, como um dos galardões da democracia.

Por fim, na iminência de mais um pleito eleitoral, o apogeu do nosso regime democrático, mas, ainda, em vias de ser aperfeiçoado, a honestidade na conduta dos administradores é o que, efetivamente, precisamos, face à permissibilidade da reeleição. E que os desonestos sejam alijados da disputa, porquanto já demonstraram, por suas atitudes, que não são dignos de figurarem como representantes do povo, eletivamente.

.