BLOG

Luciana Caetano: Voto nulo?

Luciana Caetano- economista

No Brasil, até o fim do Império, o voto era censitário e apenas (“homens de bem”) 1,5% da população estava habilitada a votar. Mulheres, analfabetos, pobres, negros, militares, marinheiros e menores de 25 anos não estavam habilitados. Vale ressaltar que mais de 50% da população era constituída de mulheres e mais de 80% de pobres e analfabetos.

Em 1932, as sufragistas (movimento feminista) conquistaram o direito de voto, exercido em 1935 e interrompido durante a ditadura de Getúlio Vargas (1937-1945). Até 1988, analfabetos, soldados e marinheiros seguiam sem direito a voto. Na década de 1960, apenas 10% da população definiam as eleições no país.

Apesar de o sufrágio universal ter sido defendido na Declaração Universal do Direitos Humanos (1948) como um direito humano básico, o Brasil só o incorporou a partir da Constituição de 1988, há 32 anos.

Se descontarmos o tempo de regime autoritário, o Brasil tem pouco tempo de exercício de voto para grande parte da população, de modo que não me causa estranheza que mais de 1/3 dos habilitados a votar abram mão desse direito, especialmente, negros, mulheres e analfabetos. De tanto tempo cerceado, que importância tem isso agora?

O sociólogo alemão Wofgang Streack (2013), na obra O Tempo Comprado, mostra que a participação em eleições parlamentares nos países desenvolvidos (Alemanha, Dinamarca, EUA, Grã Bretanha, Japão etc.), após a implantação do neoliberalismo, caiu de 82,1% (1970) para 71,5% (2000-2011), majoritariamente, entre as comunidades mais afetadas por desemprego e benefícios assistenciais, fruto da ausência de perspectiva de mudança a partir da política. E acrescenta tratar-se de um projeto político do neoliberalismo alijar grande parte da população desse processo. Essa obra foi reeditada pela Editora Boitempo, em 2018.

Outro dado relevante para reflexão é que, em todo o país, não houve muita mudança na configuração dos grupos oligárquicos que dominam a política regional, tampouco seus perfis (conservadores, machistas, misóginos, racistas, homofóbicos, violentos na defesa de seu domínio e com horror a pobres). Todavia, as eleições de 2018 pariram um novo adjetivo que sintetiza tudo isso e, pasmem, como se fosse um elemento novo – OS BOLSONARISTAS.

Em nome do repúdio aos bolsonaristas, o voto nulo tem sido defendido como um ritual sagrado a partir do qual o eleitor se livra de todos os seus pecados e se torna uma pessoa pura e dotada de “novos princípios e valores morais”. Um detalhe precisa ser destacado: a ausência dos “puros” não livrará a cidade do que restou do 1º turno das eleições municipais.

Os argumentos mais lidos nas redes sociais são:

1 – “Não vou votar em bolsonarista”. Os mesmos partidos e grupos políticos estão na disputa política há décadas, quase sem alterção.

2 – “Quem defende vidas negras não vota em bolsonarista”. Os mesmos partidos e candidatos racistas, homofóbicos, misóginos e com horror a pobre disputam eleições há décadas, a cada dois anos.

3 – “Defendemos a classe trabalhadora e o projeto de governo dos dois candidatos não nos representam”. Maceió tem 485 mil pessoas na força de trabalho e 592 mil eleitores. Dos 381,8 mil votos válidos, apenas, 30,8 mil votos (8,1%) foram creditados à esquerda. Essa classe trabalhadora não pareceu interessada nos projetos da esquerda ou não está muito preocupada com isso.

Por fim, considerando que: a) a extrema direita vem desestimulando, através da imprensa, o interesse de cidadãos e cidadãs nas decisões políticas, apresentando a política como um instrumento inútil de lutas; b) que no primeiro turno já tivemos 36% de abstenções, nulos e brancos; c) que o direito ao voto foi uma conquista importante dos excluídos; d) que o voto nulo não evitará que JHC ou Gaspar assuma a prefeitura de Maceió; e e) que os adjetivos que sintetizados pela pecha BOLSONARISTA sempre estiveram presentes na composição política desse país, desse Estado e do município de Maceió, ….

REAFIRMO QUE NÃO VOTAREI NULO, AO MESMO TEMPO QUE RESPEITO TODAS AS DEMAS POSIÇÕES ENQUANTO DIREITO LEGÍTIMO E DEMOCRÁTICO, LAMENTANDO TODAS AS ABSTENÇÕES E TODOS OS NULOS E BRANCOS.

SOBRE O AUTOR

..