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Justiça vai decidir se devolve (ou recusa) homenagem à líder negra Dandara

327 anos depois da morte de Dandara dos Palmares, o nome da líder negra do quilombo mais famoso das Américas ainda desperta ódio, preconceito e discriminação que parecem ser maiores em Alagoas, terra onde Dandara lutou e morreu em defesa do fim da escravidão.

O Ministério Público foi à Justiça após a Câmara de Vereadores de Maceió promulgar lei que altera o nome da praça Dandara para Nossa Senhora da Rosa Mística, localizada no bairro da Jatiúca, área nobre da capital alagoana.

Segundo o promotor Jorge Dória, da 66a Promotoria de Justiça da Capital, a alteração, além de ferir o Código de Urbanismo e Edificações do Município, é um caso de racismo ambiental, porque acaba “com um equipamento público que enaltece uma personalidade da cultura negra”. Algo que, segundo o promotor, “representa uma odiosa segregação e preconceito”:

A mensagem que se passa é que os negros não têm direito a cultuar seus símbolos e suas personalidades num espaço mais privilegiado da cidade, escreve o promotor.

O Código de Urbanismo e Edificações do Município proíbe que se altere o nome de ruas ou praças já definidos por lei.

A lei municipal 4473, de 12 de dezembro de 1995, também proíbe a substituição de nomes próprios em locais públicos.

E a lei federal 12.966, de 24 de abril de 2014, garante proteção à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos em ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais.

Para o promotor Dória, a promulgação da lei que destitui “a praça Dandara dos Palmares de seu nome, auxilia a relegar ao esquecimento uma das mais destacadas eminências negras do país, cujos atos de bravura e heroísmo inspiram gerações até os dias atuais na luta contra a opressão e pela liberdade”. Ainda de acordo com o promotor, tal ato vilipendia, de inequívoco modo, o direito social à cultura e menoscaba a luta secular pelo direito à liberdade e igualdade”.

Resistência

A mudança do nome da praça Dandara para Nossa Senhora da Rosa Mística foi oficializada em 21 de janeiro, no Diário Oficial. 24 horas depois, o nome da praça voltou a se chamar Dandara.

O projeto foi aprovado na Câmara e mandado a sanção ao prefeito JHC (PSB), que rejeitou a proposta. O projeto voltou a legislativo mirim, que derrubou o veto. E a praça voltou a se chamar Nossa Senhora da Rosa Mística.

Nesta semana, a Câmara oficializou a derrubada do veto. Só a partir disso é que o Ministério Público pôde entrar com a ação civil pública com pedido de tutela provisória de urgência, o que evita que se retirem da praça placas ou homenagens da Dandara.

“A mudança do nome, atenta contra o patrimônio histórico e cultural, contra o Estado Laico, bem como evidencia claro racismo estrutural e institucional”, explica o defensor público Othoniel Pinheiro.

Só que na Câmara de Maceió tramita, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), projeto cujo objetivo é derrubar a lei que proíbe a alteração de nomes de ruas ou praças. A pressão de extremistas religiosos e bolsonaristas é que se retirem nomes em homenagem a pessoas ligadas à esquerda ou o movimento negro de locais públicos.

Dandara

Dandara dos Palmares era esposa de Zumbi dos Palmares, último líder negro do Quilombo dos Palmares, erguido no topo da Serra da Barriga, que fica na cidade de União dos Palmares (Alagoas).

Segundo pesquisas, Dandara chegou criança ao Quilombo dos Palmares e dominava técnicas de capoeira e lutava ao lado de homens e mulheres nas várias tentativas de destruição do foco de resistência à escravidão que atraía mais e mais negros fugidos dos castigos e da rotina de esgotamento físico.

Com a invasão holandesa, o interesse pelas férteis terras do Quilombo além da resistência à escravidão fizeram aumentar as investidas para destruir a fortaleza, o que terminou acontecendo em 20 de novembro de 1695 pelas tropas do bandeirante Domingos Jorge Velho.

Dandara foi presa em 6 de fevereiro de 1694 e cometeu suicídio. Preferia a morte à escravidão.

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