Houve um tempo em que foi necessário fazer a crítica ao meio espírita na conduta de seus ícones e seguidores quase autômatos, e focar o olhar para perceber onde caberia análise e questionamentos, pois era a efervescência da política em meio ao golpe, e a exibição revoltante da plataforma genocida que se estruturava com a aquiescência do espíritas instigou posicionamentos.
As expressões dos desencontros e incoerências nas casas espíritas, falácias em grandes congressos e nas redes sociais ganharam merecidas linhas com toques analíticos e críticos, à luz do Evangelho que é amor, posto no paralelo ao armamento e toda sorte de pulsão de morte trazida por Bolsonaro, o político envolto em lendas e mistificações de responsabilidades ampliadas no coração do meio espírita brasileiro.
O médium Divaldo Franco recebeu críticas duras, e nosso canal de expressão não se omitiu em declarar repúdio a muitas declarações feitas por ele para o público espírita, anestesiando a razão dos que permaneceram no automatismo das bolhas.
No entanto, precisamos ir além deste ato. Se a crítica a Divaldo Franco e outros médiuns de elite agregou grupos contrários a Bolsonaro e sua necropolítica, a função justa deste movimento contribuiu para o aprimoramento das concepções àqueles que se abriram ao pensamento libertário da raiz kardeciana, que é progressista.
Como resposta às necessidades novas que revolveram o meio espírita brasileiro surgiram grupos denominados progressistas e sob influência declarada do espectro político à esquerda, avolumando adeptos sequiosos de representação e espaços para efetivação do debate societário, político e humanitário.
Estive como participante deste processo com imensa alegria, pois a novidade tem sua cota de euforia a impulsionar audácias. Foi válido.
No entanto, não encontro hoje nenhuma razão mais para gastar tempo repetindo o repúdio por Divaldo Franco, pois esta etapa já demarcou território de entendimento a partir do rompimento com os ditames hegemônicos. Que Divaldo use seu arbítrio e nós usemos os nossos, pois a partir do momento que mostramos a face publicamente assumindo um perfil como espíritas progressistas, o arcaísmo elitizado de quem segue à direita se tornou pauta ínfima.
Explico: o movimento espírita progressista agora carrega a responsabilidade da coerência que pregou lá atrás, e como nasceu de uma aglomeração repentina obviamente agregou perfis distintos, com formas também diferenciadas de vivenciar o Espiritismo.
Entre os que almejam justiça social e políticas humanitárias também se encontram outros mais audaciosos e até apressados na perspectiva das lutas sociais, inclusive luta de classes. Estes são desafiados pelo mesmo amor evangélico que prega o perdão e orienta ao pacifismo. Lutas violentas podem ser pregadas no seio do meio espírita progressista?
O viés da intelectualidade é ponto nevrálgico, atiçador de egos, celeiro de arrogantes aparições a rondar os palestrantes progressistas que com outro timbre discursivo podem cair na tentação das célebres personagens da direita espírita.
Até mesmo a ética conviviológica está para ser aprimorada a partir de eventos que sustentam grupos, líderes e seguidores, em linear expectativa de gostos e atitudes. Onde estará o espaço para a liberdade? Para as diferentes concepções dentro do próprio (e híbrido) movimento progressista?
Qualquer temática social que se pretenda posta com ganchos na perspectiva espírita gera um elo com a ética e a moral contidas nos princípios do Evangelho Segundo o Espiritismo, logo entendemos que a caridade, piedade, amor ao próximo estarão nas bases destas relações.
Trago então a reflexão: aqui tocaremos fogo nos racistas? Nós espíritas progressistas seremos assassinos de fascistas? Neste terreno deixaremos que prolifere por vingança ou omissão o linchamento virtual e o cancelamento de pessoas?
Vejam como existem pontos a serem debatidos sobre o próprio umbigo deste movimento.
Por estas razões, consideramos que a fase de criticar Divaldo Franco já está superada e o instante da autocrítica chegou, em benefício do amor maior ao próximo como a nós mesmos.