Um bom livro equivale a um abraço quente, trazendo ímpeto de resistência ao intelecto, e com isso capacitando o ser social para sobreviver aos processos de retirada de sentidos da nossa história, que também é parte do mundo.
Recomendo aos leitores convictos da necessidade de aprimorar as compreensões histórico/sociais a leitura da coletânea de artigos organizada por Aruã Silva de Lima e Osvaldo Maciel, professores da Universidade Federal de Alagoas, “Ditadura Empresarial-Militar em Alagoas – Trabalhadores, Poder e Cultura (1964/1988)”.
A riqueza das análises é inconteste!
Mas aqui faço recorte no artigo escrito pelo também professor da UFAL, Fernando Medeiros, que trouxe dois elementos de despertamento afetivo nesta leitora, o efervescente bairro de Bebedouro e o anarquista Nô Pedrosa, ambos assassinados pelas estruturas do poder opressor que atuam perto, muito perto de nós para serem ignoradas sem consequências drásticas.
O artigo que abre o livro traz o título: “Em Bebedouro…”(?) ou nos trilhos de outras histórias: trabalhadores, organização e resistência no contexto do Golpe Empresarial-Militar de 1964 em Alagoas nos apresenta a “turma da praça” como representação do fenomênico vestido de intenções comuns, e as histórias de resistência ao golpe, que desenrolaram outras energias políticas nos vagões da periferia, entre trabalhadores, intelectuais, estudantes e parcela organizada da sociedade civil maceioense.
Tratando de temas sensíveis ao presente, como a condenação do bairro Bebedouro pelo afundamento causado pela mineração da Braskem/Odebrechet o fio da história ligará o fato ao passado, interligando a antiga Salgema Indústrias Químicas S/A, estatizada pelo Governo Federal no período da Ditadura Empresarial-Militar e o processo de privatização que culminou no controle acionário que ora vige.
A interpretação analítica dos fatos históricos abre um manancial que dessedenta a ausência de conteúdo imposta pela contemporaneidade midiática, com suas lacrações e ódios comovidos.
Precisamos voltar ao regaço dos livros sérios, escritos para somar saberes e elencar problematizações pertinentes ao percurso das nossas vidas, que estão inevitavelmente ligadas aos acontecimentos, como a “perda do solo” onde se pisava e vivia para a mineração como uma das consequências da Ditadura Empresarial-Militar em Alagoas.
Uma das vias de sustentação do ideário empresarial do golpe em Alagoas, foi a junção do governo Luiz Cavalcante com a imprensa gerida por Arnon de Mello, mas a resistência esteve presente e combativa através do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), Diretório Central dos Estudantes (DCE), União Estadual dos Estudantes Alagoanos (UEEA) e importantes sindicatos.
Encontrar Nô Pedrosa nestas linhas de registro traz um sentimento misto de admiração por aquele homem com a tristeza do seu martírio.
Escritas como esta do professor Fernando Medeiros confere ao militante das causas da vida e da liberdade em Alagoas (Nô Pedrosa) o valor de sua existência e participação em momento de tensão histórica, que o transformou em um arquivo de memórias das lutas populares alagoanas.
Assim como Bebedouro sucumbiu à Braskem o anarquista tombou na noite de 23 de dezembro de 2017, com um tiro covarde no pescoço.
O artigo traz muitas outras informações, elementos e fatos ligados ao contexto do Golpe e desdobramentos que marcam a contemporaneidade, mas nossa pretensão foi instigar a leitura e fazer coro com a homenagem ao querido Nô.
Aceitem a sugestão. Leiam.