Heloísa foi barrada por Lula em avião da FAB, dizem documentos

Reportagem da Folha de São Paulo mostra a então senadora Heloísa Helena, então do PT, foi vetada em uma viagem do então presidente Lula a Alagoas, no avião da Força Aérea Brasileira (FAB). Em novembro de 2003 seria lançado, no Estado, a política nacional de igualdade racial. Dois meses antes, no Senado, Heloísa havia feito críticas ao Governo.

Abertos à consulta pública, pela primeira vez, documentos da Presidência da República revelam como funcionava o filtro usado pelo governo para barrar aliados infiéis ou desafetos nas viagens do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em seu primeiro mandato (2003-2006).

Os papéis também mostram o tamanho das comitivas e o costume de autoridades e parentes de pegar carona nos voos presidenciais. Documentos chegaram em março ao Arquivo Nacional de Brasília após pedido realizado pela Folha.

O material evidencia que de 2003 a 2004, o então assessor do ministro José Dirceu na Casa Civil, Waldomiro Diniz, na condição de subchefe de assuntos parlamentares do órgão, era o principal consultado na hora de o cerimonial colocar ou retirar parlamentares da lista de convidados.

Diniz deixou o governo no início de 2004, após a revelação de um vídeo no qual discutia recebimento de dinheiro do empresário de jogo Carlinhos Cachoeira, escândalo que gerou a CPI dos Bingos.

Até então, mostram os papéis, Diniz era ouvido a cada viagem. A resposta quase sempre era a listagem com os nomes dos parlamentares acompanhados de sinais de “s”, de sim, e “n”, de não.

Um dos documentos diz que Diniz orientava diretamente o cerimonial: “Esclareço que atendendo orientação do senhor Waldomiro, o deputado Paulo Rocha informou e orientou os seguintes convidados”, e segue a listagem.

Com a saída de Diniz, o trabalho passou a ser feito por outros servidores da Coordenação Política e Assuntos Institucionais do Planalto.

E-mails de Fredo Ebling Júnior, cujo papel era coordenar as assessorias parlamentares dos ministérios, demonstram a preocupação do governo com a CPI dos Bingos. Nos preparativos para uma viagem de Lula ao Acre, Ebling Júnior informou: “O senador Geraldo Mesquita (PSB) assinou requerimento a favor da CPI no Senado e anunciou que deixaria a base do governo. […] Nossa opinião aqui no ministério é a de que ele não deveria fazer parte da comitiva, mas vale uma consulta ao governador.”

Ao vetar o senador Magno Malta (PL-ES) para viagem a Araras (SP), o assessor comentou que “há constrangimento em função da atitude dele na CPI dos Bingos”. Malta apoiara a comissão. Nove anos depois das viagens, ouvido pela Folha, Fredo Ebling Júnior disse que o objetivo era evitar constrangimentos. “Talvez uma foto do presidente com o Demóstenes (Torres, então senador pelo PFL) pudesse ter sido explorada politicamente.”

Papéis que discriminam número e atividade de militares sob ordens do Gabinete de Segurança Institucional que acompanharam Lula nas viagens têm tarja de “reservado”.

Algumas viagens empregaram dezenas de servidores públicos, deslocados em aviões separados, um Boeing 707 e outro 737. A viagem que Lula fez ao Japão e à Coreia do Sul, em maio de 2005, mobilizou três aviões e 113 passageiros, sem contar as tripulações.

Em março, a presidenta Dilma Rousseff foi criticada por ter levado comitiva que ocupou 52 quartos de hotel, em Roma, para acompanhar a entronização do novo papa.

Em 2005, quando do velório do papa João Paulo II, a comitiva de Lula também foi grande, com 49 pessoas.

Em 2003, por ocasião da 58ª reunião da ONU, a comitiva de Lula ocupou 24 quartos no hotel Marriott Courtyard. Para a China, de 22 a 27 de maio de 2004, a comitiva presidencial contou com 58 pessoas.

OUTRO LADO

Procurado, o ex-presidente não comentou o assunto.

A Secretaria de Comunicação Social da Presidência informou que “a composição da lista de passageiros depende das circunstâncias e das agendas previstas”.

Documentos sobre as viagens do ex-presidente Lula no seu primeiro mandato revelam predileções pessoais, conversas de bastidor e agendas paralelas mantidas por quase uma década em sigilo.

Um papel descreve “almoço privado” realizado em São Paulo, em abril de 2003, no intervalo de viagem que Lula fez a São Bernardo do Campo.

O almoço reuniu Lula, o então tesoureiro do PT Delúbio Soares, que dois anos depois seria um dos pivôs do escândalo do mensalão, o consultor Antoninho Trevisan e outras sete pessoas.

Os nomes da primeira-dama, Marisa Letícia, da então assessora da Presidência em São Paulo, Rosemary Noronha, e do assessor José Carlos Espinoza aparecem como convidados, mas depois riscados a caneta.

Em 2012, Rosemary deixou o cargo na Presidência em meio a outro escândalo que atingiu o governo.

Em setembro de 2003, um funcionário da representação diplomática do Brasil na ONU disse ao Cerimonial do Planalto que teria que “encomendar correndo bebidas porque a adega da residência (oficial) está totalmente desfalcada”.

O então assessor do cerimonial do presidente, Renato Mosca de Souza disse que as bebidas prediletas de Lula eram o uísque Johnny Walker Black Label, o vinho Marquês de Riscal e a água San Pellegrino. O uísque sai por R$ 110 no mercado. O vinho oscila de R$ 80 a R$ 124. Cada garrafa de água custa R$ 7.

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