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Há que reequilibrar o Brasil

 Ilan Goldfajn- O Globo

Todos nós precisamos nos reinventar de vez em quando para continuar evoluindo. Países também. Após dois anos de crescimento fraco, fica claro que o Brasil precisa reequilibrar sua economia. Não basta ter um crescimento forte do consumo numa economia com mercado de trabalho aquecido e mercado doméstico pujante. Para continuar crescendo, o Brasil terá de ser capaz de investir mais, educar mais. É necessário elevar a produtividade da economia para sustentar os salários altos e aumentar a competitividade das empresas. Conseguir reequilibrar a economia exige visão e planejamento, oferecendo segurança do caminho a seguir. O resultado seria a volta dos investimentos que traria tanto a tão desejada retomada da atividade no curto prazo quanto o crescimento sustentado nos próximos anos.

A divulgação do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre do Brasil na sexta passada decepcionou e confirmou uma tendência preocupante. O crescimento foi apenas metade do esperado pelo governo e por analistas (0,6% ao invés de 1,2%). Mais preocupante ainda foi a composição desse crescimento. Enquanto o consumo das famílias continuou crescendo forte, os investimentos caíram pelo quinto trimestre consecutivo e já acumulam queda de 5,9%, apesar dos diversos incentivos já adotados pelo governo. A ausência de uma reação dos investimentos (hoje em torno de 18,5% do PIB) mostra o desafio atual de reequilibrar a economia com vistas a manter o crescimento no país.

A necessidade de reequilíbrio não é exclusividade do Brasil. Já faz cinco anos da crise financeira internacional de 2007/8, e vários países tiveram que mudar seu trajeto. Nas economias maduras, não havia mais espaço para o crescimento baseado em crescente endividamento. As economias emergentes também precisaram se reinventar. A China é o caso mais emblemático dessa mudança necessária. A China, de certa forma, precisa do inverso do Brasil: consumir mais e investir menos. As razões para a falta de crescimento rápido do consumo são paradoxalmente parecidas com as razões daqui para a falta de investimento. Faltam perspectiva e segurança quanto ao futuro.

No Brasil, desta vez, a decepção não foi consequência da fraqueza da indústria, que cresceu 1,1% no trimestre, nem da agricultura, que avançou 2,5%, mostrando uma recuperação. Foi o setor de serviços que decepcionou, pois simplesmente não cresceu.

A falta de crescimento do setor de serviços não era esperada. Os setores de transporte e de intermediação financeira recuaram, e os serviços de administração, saúde e educação pública avançaram apenas 0,1%. O comércio, mesmo com o efeito positivo das vendas de veículos, cresceu somente 0,4%.

Ver o crescimento do PIB pela ótica dos gastos (consumo versus investimento) pode ser mais elucidativo que pela divisão dos setores (indústria versus serviços). O consumo parece que não precisa de estímulos adicionais. O mercado de trabalho em condições favoráveis, a confiança em patamar elevado e os estímulos à compra de bens duráveis mantiveram o consumo em alta.

O foco de atenção deve ser o investimento, que decepcionou novamente. Um recuo da taxa de investimento significa menor capacidade de crescer no futuro.

Com a decepção do terceiro trimestre e perspectivas de crescimento morno no quarto, o crescimento do ano de 2012 será mais baixo, ao redor de 1%. Como não está ocorrendo uma retomada no ritmo esperado, a confiança dos empresários sofre. O que há é uma desconfiança em relação ao futuro, o que enseja redução de investimentos. E isso pode impactar o crescimento de 2013, que deve se retomar, mas apenas de forma moderada.

Como resultado, espera-se que mais estímulos sejam anunciados pelo governo, como mais desonerações, juros menores e câmbio mais depreciado (o mesmo arsenal deste ano aplicado em 2013).

Esses estímulos podem até vir a contribuir para a retomada da economia, mas é fundamental diminuir as incertezas domésticas quanto ao futuro para potencializar os efeitos dos incentivos ao crescimento, especialmente quando o mundo continua incerto. A confiança no futuro, na estabilidade regulatória e um retorno adequado para projetos de longo prazo são fatores fundamentais para o crescimento sustentado da economia.

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