BLOG

Fake miracles em Milagres

São Miguel dos Milagres é, talvez, o resumo mais brasileiro das instituições crueis e mesquinhas que infestam a estrutura do Estado.

Lá, ricos e famosos assistirão às festas de final de ano mais queima de fogos. Jair Bolsonaro escolheu a pequena cidade do litoral norte para descanso e repasto. Impune após 700 mil mortos na pandemia, graças a decisões que adiaram a compra da vacina, Bolsonaro curtirá o seu baile macabro, amparado por tudo de bom e do melhor.

Na mesma São Miguel dos Milagres, o povo é chamado para trabalhar em hoteis e pousadas de luxo que, em alguns casos, pagam salários indignos, não assinam carteira de trabalho nem respeitam horários de descanso. São pessoas submetidas a um regime de escravidão moderna. Aliás, Milagres no passado recebia escravos traficados em navios negreiros, uma história escrita nas areias da praia e apagadas pelo mar.

O município também tem outra parcela do povo expulsa de seu chão. Assiste-se a um dos maiores etnocídios em curso porque “São Miguel dos Milagres” vem deixando, passo a passo, de existir. Agora é Milagres. I believe in Miracles, diz a propaganda entoada pelo setor produtivo, que quer tudo para si e nada para o resto: praias privadas, áreas proibidas, uma verdadeira higienização da pobreza.

É como se Milagres não tivesse juiz nem promotor ou prefeito e vereadores. E não tem porque a voracidade da especulação imobiliária e a corrupção generalizada levam a uma falsa crença de que o desenvolvimento é para todos.

Fake Miracles, ora pois.

Carlos Madeiro, no UOL, mostra que o turismo descortina a desigualdade social e econômica de Milagres. É um registro triste de uma história que é alegre apenas aos vips. É como se a riqueza fosse uma eterna promessa de um bolo crescendo e crescendo e nunca repartido, em pedaços, aos demais convidados da festa.

E que festa terão os desabrigados, desalojados?

2024 é ano de eleição e isso renova o olhar do povo. Notas de R$ 50 desfilarão de mão em mão descaradamente, numa compra de votos explícita e pornográfica. Quem recusa o dinheiro é punido; quem aceita não pode cobrar nada depois. É um regime bruto e canalha. Milagres é mesmo para poucos.

Uma resposta

  1. Parabéns Odilon por sua coragem e clareza,infelizmente essa realidade que deveria nos indignar toma ar de normalidade o que a torna monstruosa e altamente vergonhosa.

SOBRE O AUTOR

..