Coaracy Fonseca: Dalva e Herivelto, uma história sem fim

Coaracy Fonseca- É promotor de Justiça

Sem réstia de dúvida esses dois grandes artistas da historiografia musical brasileira ainda são merecedores de estudos mais agudos, que muito servirão para a compreensão da alma humana.

Outra certeza é que os talentos se completavam. Onde termina o amor (se é que se esvai), esse sentimento etéreo, e onde começa o ressentimento entre um homem e uma mulher? A série da Globo que assisti há pouco levanta muitas questões sobre o modo de sentir dos vocacionados para a arte.

A convencionalidade não produz uma obra superior. O pensamento comum não consegue extrair do balouçar de folhas um poema ou uma canção: “quando piso em folhas secas caídas de uma mangueira penso na minha escola e nos poetas da minha estação primeira…”

Parece simples, mas não é. “O peixe é pro fundo das redes, segredo para quatro paredes”. Niall Ferguson traz um conceito interessante de civilização, ao tempo em que abrange várias nuances da existência humana, gregária.

Assusta por algumas de suas conclusões, ao pôr em relevo a importância das instituições no modo agir, nos hábitos e sentimentos das pessoas.

Mas o que isso tem a ver com o tema desta crônica? Tudo. Os brasileiros, sem qualquer crítica ao pragmatismo, a mim me parece que estão se “norte-americanizando”. As letras das músicas são construídas de modo direto e superficial, fato que leva o indivíduo a não pensar, refletir, mas apenas deglutir uma espécie de ração.

Será que não estamos sendo levados a um processo de emburrecimento inconsciente? Os dramas humanos são perenes, mas o modo de senti-los tornou-se insípido, como o ritmo muito apreciado por boa parte da juventude chamado “sofrência”. Surge de chofre e desaparece de súbito, pois nada acrescenta além do fugaz.

Mas qual a relação de tudo isso com Dalva e Herivelto? Sem entrar no âmago da conturbada relação conjugal – “é preciso julgar, para depois condenar” -, eles conseguiram fotografar as emoções e sentimentos humanos em estado de flagrância próprio e revelá-los através de metáforas imortais.

Finalmente, talvez meu mal seja comentar o passado: “Quando o infortúnio nos bate à porta / E o amor nos foge pela janela / A felicidade para nós está morta / E não se pode viver sem ela / Para o nosso mal / Não há remédio / Coração…”

Enfim, a série lançou uma dúvida cruel: será que realmente eles deixaram de se amar? Nunca iremos saber. Mas há um indício expresso numa frase: “não falem desta mulher perto de mim…”

Será amor ou ressentimento? Fica ao gosto do leitor.

Eu não sei.

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