Ícone do site Repórter Nordeste

Desencantando o lobisomem social

Recordo as inúmeras histórias assustadoras que me contavam na infância, os adorados trancosos que hoje carrego na bagagem da vida, e compreendo a importância do medo para toda força ser mantida.

Sistemas que parecem simples de desmontar na conversa da esquina, engrossam estruturas seculares, com perfis inabalados, porque a ignorância os sustenta e o medo sustenta a ignorância.

Não falo do medo do escuro, é o medo de ficar sem sombra, pois os dias causticantes são inevitáveis, eles sempre aparecem. E o pau que dá sombra, é o político que trafica influências, e até para liberar a ambulância a autorização dele é pedida.

Há medo de perder o emprego por contrato, mesmo recebendo menos que o devido; e no caso dos professores, trabalhando de março a outubro, para a prefeitura burlar o décimo terceiro salário, anulando todo e qualquer direito. É como vender cocada na porta do colégio: toma lá dá cá! Direito nenhum, a não ser esse.

Mas ainda existem outros medos subterrâneos, que perpassam a psicologia das gentes, talvez os maiores responsáveis pela manutenção da força, justamente por ser mais difícil de acessar. Um estranho temor de não temer mais nada, e perder a referência de escolhido.

Sim, o oprimido se sente escolhido para compor a manada dos medrosos, recebendo algumas migalhas de coisas sociais por isso. Se fosse permitido avaliar, veriam que as migalhas não matam a fome, mas geram fomes cada vez mais maiores, levando o indivíduo a procurar cada vez mais se parecer com o opressor.

Parece não ter jeito.

Às vezes o próprio ato de saber gera desejo de desistir de entender, mas o mais forte trancoso que opera em mim é aquele que insiste em tirar o sangue do lobisomem, para enfim desencantar o feitiço, libertando o homem preso no lobo. Porque acredito em finais felizes.

Sair da versão mobile