Descobertas sobre câncer

Biópsia mostra resultados de apenas uma parte do tumor, o que torna as análises mais complexas

 Ed Yong e Nature- Scientific American

Cientistas britânicos descobriram que um tumor pode ser muito diverso. Assim como diferentes tipos de tumores têm mutações genéticas distintas, o mesmo acontece com diferentes partes de um mesmo tumor. As conclusões são de um estudo publicado no New England Journal of Medicine e ajudam a explicar por que câncer é tão difícil de ser estudado e tratado.

A opinião de um médico sobre os prognóstico ou sobre o melhor tratamento pode ser contraditória, dependendo da região do tumor onde é realizada uma biópsia. “Isso aumenta a complexidade”, diz Charles Swanton, do London Research Institute, na Cancer Research UK, que liderou o estudo.

Como parte de um teste clínico, a equipe de Swanton realizou uma análise detalhada dos tumores de quatro pacientes com câncer renal. Eles coletaram amostras de várias regiões dos principais tumores em vários momentos durante os testes, bem como dos órgãos onde o câncer havia se disseminado. Em seguida, cada amostra foi analisada para verificar mutações, padrões de atividade genética e estrutura dos cromossomos.

“Nós usamos todas as técnicas genômicas disponíveis possíveis. Mesmo assim, estávamos apenas arranhando a superfície”, disse Swanton.

A equipe usou os resultados para reconstruir a história evolutiva de cada tumor. O do primeiro paciente, por exemplo, tinha se dividido em duas linhas evolutivas. Uma pequena parte tinha o dobro da contagem normal de cromossomos e havia semeado todos os tumores secundários no peito do paciente. O outro ramo tinha gerado o restante da massa do tumor original. Resultados semelhantes foram observados em outros pacientes.

O tumor principal revelou-se surpreendentemente variado. Apenas um terço das mutações revelaram-se comuns a todas as 14 amostras e um quarto delas foram encontradas em apenas uma amostra e em nenhuma outra. Apenas um gene de câncer renal (VHL) revelou uma mutação sistemática. Swanton e sua equipe chegaram a encontrar sinais de evolução convergente: os tumores tinham desativado o mesmo gene (SETD2) de três maneiras diferentes. “Há uma quantidade desconcertante de diversidade presente em cada tumor”, diz o pesquisador.

Esses resultados mostram que qualquer biópsia proporciona uma visão apenas muito local de uma paisagem muito mais ampla. “Creio que muitos pesquisadores sentem intuitivamente que essa heterogeneidade está presente, mas esse estudo fornece evidências sólidas”, diz Darryl Shibata, um geneticista da University of Southern California, Los Angeles, especializado no estudo de câncer.

A diversidade de um tumor poderia explicar por que os cientistas têm encontrado dificuldades para encontrar biomarcadores clinicamente úteis – substâncias produzidas pelo organismo que indicam a presença ou natureza de um tumor. Estudos de biomarcadores geralmente baseiam-se em biópsias simples, o que pode ser enganoso. Em diferentes regiões de um tumor, a equipe de Swanton descobriu assinaturas genéticas associadas a prognósticos bons e ruins.

As descobertas podem também explicar por que, após algum tempo, muitos tratamentos acabam parando de funcionar. As medicações muitas vezes atacam células com mutações específicas, e essas células podem existir apenas em áreas restritas de um tumor. Outras células, não afetadas, podem atuar como um “reservatório evolutivo” que permite ao tumor voltar a crescer.

Isso poderia explicar por que alguns pacientes com câncer renal evoluem melhor se os cirurgiões removem seu tumor principal, mesmo que o câncer tenha se disseminado. “Pode ser que a remoção do reservatório de diversidade evolutiva melhore a evolução do quadro de um paciente”, diz Swanton. “Há menos material para o tumor se adaptar a pressões ambientais”.

Agora, a equipe quer encontrar as mutações presentes em todas as regiões de um tumor. Elas evidenciarão os alvos mais convidativos para os medicamentos e os biomarcadores mais confiáveis. Para isso, porém, o estudo precisará ser repetido em dezenas ou centenas de tumores, diz Swanton.

Shibata diz que a queda do custo do sequenciamento de DNA tornará isso mais viável, mas Swanton comenta que a coleta de material suficiente para biópsias ainda seria caro, bem como a análise dos dados resultantes. “Nossos servidores ficarão congestionados de dois a três meses”, diz ele. “Vamos ter de fazer um grande investimento em capacitação nos campos computacional e de bioinformática”.

O estudo tem implicações imediatas para projetos como o The Cancer Genome Atlas, no National Institutes of Health, que estão tentando identificar o conjunto completo de mutações subjacentes a tumores individuais. Todos esses estudos têm se baseado em biópsias individuais e, em muitos casos, é difícil obter amostras com suficiente alastramento espacial.

Uma abordagem alternativa seria sequenciar uma única amostra várias vezes. Maiores profundidades podem revelar pequenas populações distintas de células que, de outro modo, poderiam ficar ocultas. “Essa é, provavelmente, a maneira trabalhosa de atacar o problema”, diz Andy Futreal, do Wellcome Trust Sanger Institute, em Hinxton, no Reino Unido, que participou do mais recente estudo. Mas o sequenciamento em profundidade é caro e Futreal suspeita que pode ser necessário fazer concessões, diminuindo o número de genomas a serem analisados.”Podemos ter que sacrificar números abrangentes para efetivamente entender qual a profundidade do problema, diz ele.

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