Quando recebi das mãos do dr. Ricardo Jones três exemplares de livros autorais, sendo apenas um deles na vertente espírita, que em tese é aquela na qual mais tenho mergulhado nos últimos tempos, senti uma responsabilidade para com o mergulho na leitura dos outros livros também, e não receber por formalidade ou agradecer apenas por educação.
O médico obstetra que já tinha passado 21 dias em uma prisão de Porto Alegre como resultado de uma condenação pela morte de uma criança que nasceu com infecção congênita, portanto, não foi negligenciada por ele e sua equipe de assistência ao parto humanizado, indo a óbito em um hospital, sabia sobre a possibilidade de retornar ao cárcere.
Senti o gesto de entrega dos livros em minhas mãos como uma confiança na leitura posterior, no aprofundamento do meu interesse na questão.
Quando fiquei sabendo sobre a negativa para a permanência do Ric Jones com sua maravilhosa família, no auge dos seus 65 anos entre os quais 40 foram dedicados à prática de uma medicina obstétrica humanista e à homeopatia, confesso que entrei em tristeza. Contudo, ao ouvir o próprio Ricardo comentando sobre o processo de perseguição ao parto humanizado e sua esperança de que a prisão (que lhe retira do convívio amoroso e poético com a esposa, filhos, netos e demais parentes) deveria servir para ampliar a discussão e promover o debate sobre a causa à qual dedicou sua carreira, decidi colaborar.
Com dois exemplares distintos que trazem uma narrativa incrível sobre o nascimento e o corpo da mulher, em minhas mãos, inicio a partilha sobre as ideias e ideais do obstetra.
Comecei a leitura pelo último livro sobre a temática, Entre as Orelhas – Histórias de Parto, no qual a médica antropóloga americana Robbie Davis-Floyd que é PhD e especializada na antropologia da reprodução, entre outras frases fortes sobre a trajetória dos Jones (Ricardo e sua esposa, a enfermeira Zeza) afirma que ele é “pioneiro da obstetrícia humanista e integradora”.
A médica Ginecologista e Obstetra Melania Amorim, que é professora da UFCG e da Pós-Graduação em Saúde Materno-Infantil do IMIP, declara:
” Ricardo Herbert Jones não apenas dedicou-se com paixão à causa fascinante da humanização da assistência ao parto baseada em evidências, acolhendo e ajudando inúmeras mulheres que se aventuraram nesta fantástica aventura de resgate do próprio protagonismo, como veio a se tornar um baluarte do movimento, um nome reconhecido e respeitado internacionalmente”.
Tendo a honra de ter estado pessoalmente na sala da casa do médico, ouvindo sobre as práticas de assistência ao parto como uma vertente de respeito ao corpo da mulher, não poderia deixar de manifestar o quanto foi importante para minha experiência pessoal, após ter passado por quatro partos convencionais e conhecer de perto as violências que enxertam esse momento através de atitudes frias e impessoais em ambientes hospitalares, apontados como o único seguro para parirmos.
“A matriz cultural valorativa sobre a mulher, a vida, o dinheiro e o poder apareceram brutalmente à minha frente quando eu ainda era um menino, e esta violência acabou por determinar todo o meu futuro profissional” (p. 25) A declaração do obstetra sobre os fundamentos valorativos da experiência de parto na cultura tecnocrata traz detalhes sobre a sua própria conscientização no campo dos riscos de optar por uma cultura humanizada. Mas nós, enquanto sociedade, podemos repudiar a prática punitiva contra quem defende os direitos reprodutivos das mulheres com tanta paixão!
” A medicina contemporânea, mormente nos aspectos relacionados à assistência do parto, era apenas o modelo dominante , o paradigma hegemônico, e não a soma de todas a verdades! Havia propostas alternativas minoritárias que não podiam ser desveladas em função de interesses outros, de origem econômica, financeira e profissional”. (p. 26)
Como não perceber na prisão do obstetra Ricardo Jones um componente de combate a uma prática que descentraliza o controle do nascimento por hospitais e outras instituições financeiras?
Mas quem abre caminhos por certo não segue sozinho. O médico angaria apoios e simpatias importantes para a sua causa e para a necessidade de resgate da própria liberdade. Pois como afirma na página 29, “as lutas também são feitas através de laços de amizade, companheirismo e confiança”.
Que a justiça do Rio Grande do Sul possa rever a sentença e libertar o doutor Ricardo Herbert Jones, que ao invés de ser transformado em um condenado, merece ser reconhecido como parte necessária de uma expressão humana que o capitalismo e o status quo afasta cada vez mais do território da medicina.
O reconhecimento internacional de Jones é um orgulho estendido ao país que agora o aprisiona.
Mas são dele as palavras abaixo:
“Minha esperança é que o tempo será o Senhor da Verdade e que uma atenção mais digna ao nascimento prevalecerá”. (p.30)
Para ajudar nos custos de defesa de Ric Jones a família faz campanhas, e você pode participar com qualquer valor enviando para a chave pix: [email protected]