Como os novos conjuntos habitacionais no Vergel aumentam casos de abandono animal em Maceió?

A Prefeitura de Maceió investiga o abandono de cães e gatos por seus donos em áreas onde a população foi realocada para conjuntos habitacionais erguidos pelo poder público.

Um dos bairros que mais preocupa é o Vergel do Lago. Uma parte das famílias que morava à beira da lagoa Mundaú ganhou um apartamento e se mudou para a parte baixa ou alta da capital, sem levar cães ou gatos, por vários motivos, entre eles: falta de espaço ou ausência de quintal na nova morada.

Resultado: os pets acabam na rua. Muitos são atropelados. Outros não sobrevivem às zoonoses, contagiados por outros animais.

A relação entre abandono de animais domésticos e realocação de moradores já havia sido detectada em estudo da UFAL nos bairros atingidos pelo afundamento do solo, causado pela mineração do sal-gema via Braskem.

Só que no caso do Vergel, fora da área de risco da fábrica, o problema é outro: os novos lares das famílias realocadas, muitas vezes, não comportam ou não são projetados para aqueles amigos ou parentes de quatro patas.

Por isso, moradores denunciam a prática criminosa. Eles dizem que pessoas de outros bairros descartam pets na orla lagunar.

A Comissão de Bem Estar animal da OAB também procura alternativas.

O abandono de animais domésticos é enquadrado como maus-tratos e configura crime previsto na Lei de Crimes Ambientais (Lei Federal n° 9.605 de 1998).

“Muitos desses animais eram de moradores que foram realocados para apartamentos da Prefeitura e os antigos donos acabaram abandonando os bichos. São muitos filhotes. Alguns deles estavam mortos, inclusive. Outros já foram atropelados. Conversando com os moradores, também recebi a informação de que pessoas de outros bairros estão abandonando os bichos por lá”, explicou a vice-presidente da Comissão Walma Emanuelle.

A Prefeitura e a União erguem na região o residencial Parque da Lagoa, com 1.776 apartamentos. Orçado em R$ 140 milhões, este residencial é bancado com recursos do programa Casa Verde e Amarela, do Ministério do Desenvolvimento Regional.

Outras famílias da região estão sendo realocadas para os conjuntos habitacionais  Oiticica 1, Oiticica 2 e nos Alamedas, no Benedito Bentes.

Estudo

Para entender como se associa o abandono de animais com a realocação habitacional, a reportagem procurou o professor de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) Pierre Barnabé que também é coordenador do projeto Integra Animal BRASKEM-UFAL.

“Existem alguns pontos que levam a esse abandono: o imóvel que o cidadão vai às vezes é um apartamento e ele morava em uma casa, então não tem mais o quintal”, analisa.

No bairro do Pinheiro, atingido pela mineração do sal-gema que afunda o solo da região, um primeiro levantamento indica que 53% dos gatos tinham acesso à rua e tinham contato com animais de rua. “Então esses animais, principalmente felinos, aumentam esta taxa de abandono durante a realocação. Neste processo, principalmente em relação a apartamentos populares, a Prefeitura ou órgão público não vai acompanhar a mudança deste animal. O acompanhamento da realocação com foco no animal é importante para se administrar o abandono, mas para isso tem que dar caixa de transporte, os órgãos públicos vão ter que dar condições para que esses animais possam ser realocados*, analisa.

Um estudo desenvolvido pelo Projeto e apresentado na X Conferência Internacional de Medicina Veterinária do Coletivo em 2021 com o título “Impactos da implantação do monitoramento de realocações com animais em bairros acometidos por acidente geológico na cidade de Maceió-Alagoas, Brasil” revela dados importantes:

“Segundo dados da Braskem, durante a primeira realocação das famílias no bairro do Mutange havia cerca de 567 animais cadastrados, porém, somente 245 foram realocados. Isso significa que 43, 20 % foram abandonados ou fugiram no processo de mudança”, diz o estudo.

A pesquisa conclui ainda que o monitoramento e acompanhamento de mudanças diminui de forma drástica o abandono de animais no primeiro mês de execução.

Segundo a Comissão de Bem-Estar Animal da OAB/AL, após a constatação do problema, a instituição entrou em contato com o Gabinete da Causa Animal da Prefeitura de Maceió. Foi solicitada uma ação de emergência com o intuito de castrar os animais em situação abandono e colocá-los em feiras de adoção que são realizadas pelo Gabinete. A Comissão informou que seguirá acompanhando o caso.

Em nota, o Gabinete informou ao Repórter Nordeste que não possui um relatório técnico sobre a situação. Mas que “o Gabinete de Gestão Integrada de Políticas Públicas para Causa Animal (GGI-CA) da Prefeitura de Maceió tomou ciência do fato e está realizando articulações para fazer visitas ao local junto com a Unidade de Vigilância de Zoonoses (UVZ) para adotar as ações em relação ao caso.”

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