Com esposa grávida, boxeador lavou pratos para não desistir do seu sonho

Carlos Rocha tinha apenas 11 anos. Dava trabalho para a avó materna e tinha mau comportamento na escola em carlosrochaGandu, na Bahia. A mãe morava no Espírito Santo, para onde veio atrás de uma vida melhor. Não houve outra saída. De família humilde, ele pegou o ônibus ao lado de uma amiga de Marizete e desembarcou na rodoviária de Vitória.

“Na linha” e já adolescente, o baiano conheceu o boxe aos 16 anos. O que era um passatempo para manter a forma virou coisa séria.

O problema era a falta de dinheiro para treinar. Talentoso, Carlos não desistiu do sonho. Morou em uma academia em Vila Velha, lavou pratos, o chão, e hoje, aos 21, com a esposa Joyce esperando o primeiro filho do casal, vê no Canadá a chance não apenas de uma medalha, mas também de aumentar a renda da família, hoje de R$ 1,2 mil graças ao salário que recebe da Confederação Brasileira de Boxe (CBB).

– Essa é a minha única renda e me ajuda muito, já que não tenho patrocínio nenhum e não faço parte das Forças Armadas. Vim em busca de uma medalha para melhorar de vida e seguir em frente no esporte. Por isso que estou aqui nos Jogos Pan-Americanos. Um resultado aqui é importante para ajudar a minha família. Dá para buscar uma medalha aqui e isso pode mudar a minha vida. Era difícil quando comecei. Morei na academia. Ficava lá e também em casa. Tinha duas casas praticamente. As vezes não tinha dinheiro para voltar para casa e outras vezes ficava para me preparar para os campeonatos. Limpava, lavava prato. Foram uns dois anos assim.

Lutando no peso até 52kg e há um ano na seleção brasileira, Carlos dificilmente vai aos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, e também no Mundial deste ano, em outubro, no Catar. Robenílson de Jesus é o titular da categoria e só não veio ao Pan por lutar na liga semiprofissional da Aiba. O Pan, então, virou a Olimpíadas do baiano, que sofreu um duro golpe financeiro em dezembro passado, quando deixou de receber o Bolsa-Atleta pelo Espírito Santo.

– Ano passado recebi o Bolsa-Atleta pelo Espírito Santo, mas esse ano não consegui. Só recebi até dezembro, me ajudava muito com R$ 1.500 mensais. E eu represento o Espírito Santo nas competições nacionais. Dizem que é porque eu não nasci lá, então não posso receber. Me sinto triste. Agora mesmo falaram que sou capixaba. Qualquer matéria que sai é Carlos Rocha do Espírito Santo. Dá vontade de ir lá e falar que não sou capixaba. Não me ajudam e querem que eu ajude eles. Só querem venha nós – desabafa.

Depois que entrou na seleção brasileira, Carlos deixou a comunidade de São Conrado, em Terra Vermelha, bairro bem humilde no Espírito Santo e com alto índice de criminalidade. Não se envolveu com problemas, terminou o ensino médio, mas não busca uma faculdade. Quer abrir o próprio negócio ou quem sabe se profissionalizar caso o destino o leve por esse caminho. Para um menino que saiu sozinho de ônibus aos 11 anos da Bahia para Vitória, planejar o futuro não é fácil.

– Não quero fazer faculdade. Vou lutar, quero abrir uma academia, fazer alguma coisa depois da minha carreira. Uma loja, quem sabe. O dinheiro que ganho não dá para juntar, é para pagar as contas e se manter. Antes de me aposentar quero me profissionalizar. Pode ser depois, antes, tanto faz. Depende da proposta. Não tenho um planejamento, mas é no profissional que está o dinheiro. Você indo para uma equipe boa, bem conhecida, você vai se dar bem. O boxe agora é que está aparecendo. No Brasil ainda é outra coisa. Não é bem reconhecido ainda. Ainda falta muito – diz o boxeador.

A estreia nos Jogos Pan-Americanos será neste sábado, dia 18. Ter a medalha na parede de casa é importante, mas bacana mesmo seria levar a esposa para morar com ele em São Paulo, onde fica a seleção brasileira.

– Ela está grávida de dois meses, vai fazer três ainda. Estou há um ano na seleção, no meu primeiro Pan, e estar na seleção é a melhor sensação do mundo. Fazer parte de uma seleção brasileira é o mais alto onde você pode chegar. Por enquanto não posso levá-la. Quando as coisas melhorarem pretendo levá-la para lá.

Fonte: Globo Esporte

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