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Código da Educação: é uma solução?

Isaac Roitmann- Correio Braziliense

O termo código tem origem latina (codex) e significado, no âmbito do direito, como um conjunto de normas legais sistemáticas que regulam, de forma unitária, uma determinada matéria. Em 1804 foi introduzido na França o Código Civil, com a finalidade de regular a vida privada dos cidadãos. No Brasil, esse código foi introduzido em l916 (Lei nº 3.071), tendo sido atualizada em 2002 (Lei nº 10.406). Outros foram introduzidos no século passado, tais como o penal, o de trânsito, o da defesa do consumidor, o tributário e o eleitoral.

Recentemente, o Código Florestal Brasileiro, criado em 1934 e revisado em 1965, está sendo refeito, provocando discussões no parlamento, que têm como pano de fundo o enfrentamento do imediatismo versus o futuro. Esse código estabelece limites de uso da propriedade, que deve respeitar a vegetação, considerada bem de interesse comum de todos. Ninguém duvida que as políticas de conservação do meio ambiente serão os norteadores da qualidade de vida das futuras gerações. Da mesma forma, ninguém duvida que o destino da nação brasileira depende fundamentalmente da qualidade da educação.

O quadro atual do setor tem sido fartamente descrito como verdadeira tragédia. O ensino infantil é deficiente e só existe para poucos; o fundamental é uma fábrica de analfabetos plenos e funcionais; o médio não prepara para nada e é o ato final da extinção de atributos da infância, como a curiosidade e a criatividade. O ensino superior, tanto na graduação como na pós-graduação, não tem se modernizado e não exerce sua missão de vanguarda em um mundo em que é transformado diariamente pelo intenso desenvolvimento científico e tecnológico.

A gestão educacional tem sido considerada como um dos entraves que impedem a conquista da qualidade da educação brasileira. Por sua vez, as leis e numerosas normas impedem o gestor de cumprir adequadamente a sua missão. Como gerenciar uma creche pública, onde os profissionais da educação fazem greve? Como ter transporte escolar com veículos que têm manutenção precária, devido à necessidade de licitação de serviços? Como evitar a deterioração dos espaços escolares no ritmo lento da manutenção ditado pela legislação? Como tornar a escola prazerosa, com os professores do ensino básico tendo salário miserável? Como produzir conhecimentos nas universidades em que procedimentos lentos lembram o andar da tartaruga, aliados aos entraves na importação de insumos e equipamentos científicos?

Essas e outras inúmeras questões demandam profunda reflexão e a construção de normas que possam contribuir para a melhoria da educação brasileira. Ser gestor de uma instituição pública de ensino é um ato de sacrifícios e de tensões diante dos obstáculos de ordem legal que inviabilizam ou tornam lentos os procedimentos de rotina e emergenciais. Reitores de universidades públicas, mesmo depois de finalizarem os mandatos, são perseguidos como foras da lei para explicar procedimentos que tiveram sinal verde dos procuradores jurídicos.

É pertinente aqui revisitar o discurso de Darcy Ribeiro na ocasião em que recebeu a homenagem de doutor honoris causa da Universidade de Brasília: “As próximas décadas serão também de lutas, das gratas lutas dos florescimentos do renascer. Antevejo algumas dessas batalhas. A primeira delas é reconquistar a lei original, que criou a Universidade de Brasília como organização não governamental, livre e autoconstrutiva. Simultaneamente, cumpre libertar-nos da tutela ministerial, assumindo plenamente a responsabilidade na condução de nosso destino. Inclusive, e principalmente, seu caráter de universidade experimental, livre para reinventar o ensino superior de graduação e pós-graduação, fazendo deles instrumentos de liberação do Brasil”.

O que Darcy quis dizer é que a educação não pode e não deve se submeter às rédeas de pessoas ou instituições que não entendem a sua natureza e importância.

A pergunta no título deste texto precisa ser experimentada e respondida. A introdução de um conjunto de novas regras em um Código de Educação que tenha como principal objetivo remover os entraves jurídicos e burocráticos certamente será virtuosa. Esse novo código deverá ser construído por educadores, por especialistas em gestão educacional, por juristas consagrados e por parlamentares comprometidos com o futuro do Brasil. Vale a pena tentar. Nada fazer para reverter o atual quadro é uma omissão condenável e um silêncio irresponsável. É pertinente lembrar o pensamento de Martin Luther King: “O que mais preocupa não é nem o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem-caráter, dos sem-ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons”.

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