Capacitação sobre financiamento climático mira em lacuna de até US$ 6 trilhões por ano para transição da economia

Evento organizado por iCS, IFS e CASI discute financiamento climático e a necessidade de capacitação
Pesquisa realizada com gestores de investimentos brasileiros indica que a agenda climática ainda é desconhecida do setor financeiro. Apenas 0,15% do total da indústria de fundos do Brasil integra práticas socioambientais junto das econômicas, refletindo a agenda ESG. Os dados são da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA) e foram citados na abertura do evento “Financiando a transição verde: na direção de um futuro de baixo carbono e resiliência climática”, organizado por Instituto Clima e Sociedade (iCS), Institute of Finance and Sustainability (IFS) e Aliança de Capacitação para o Investimento Sustentável – CASI.

A necessidade de capacitação do setor financeiro mobilizou a criação da CASI, uma plataforma para letramento lançada na COP28, em Dubai. Nos dias 3 e 4 de abril, em São Paulo, a CASI marcou sua estreia na América Latina. O evento reuniu cerca de 200 representantes de bancos comerciais e de desenvolvimento, cooperativas de crédito, agências multilaterais de investimento e consultores especializados. Durante dois dias, foram debatidos com especialistas temas como os instrumentos de inovação financeira necessários para destravar o mercado e escalar os investimentos para estimular empresas, governos e sociedade na direção de uma economia de baixo carbono e as oportunidades da biodiversidade latino-americana para ampliar soluções baseadas na natureza.

‘Falta de capacitação é uma das principais barreiras’
“A lacuna de financiamento global é de pelo menos US$ 4 a 6 trilhões por ano para a transição para uma economia de baixo carbono e para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU”, destacou Ma Jun, principal executivo da CASI e presidente do IFS. “A falta de capacitação é uma das principais barreiras para acessar financiamento sustentável em mercados emergentes e economias em desenvolvimento”, afirmou. Segundo Ma Jun, o Brasil e vários países da América Latina, como Peru e México, podem se juntar ao esforço da CASI para discutir e compartilhar conhecimento e melhores práticas sobre finanças e investimentos sustentáveis.

Para Maria Netto, diretora executiva do iCS, o desafio é atrair investimento para países emergentes, onde estão as principais oportunidades relacionadas à bioeconomia, soluções baseadas na natureza, infraestrutura e agronegócio sustentáveis. “Uma das sugestões é investir em energia renovável não apenas para a transição, mas pensando na descarbonização da economia e em oportunidades para o Brasil”, afirmou. E com esse objetivo é necessário ter recursos financeiros e capacitação técnica do sistema financeiro, disse. “Para se desenvolver uma estratégia de combate às mudanças climáticas, garantir a adaptação dos setores e investir em infraestrutura sustentável é preciso mobilizar múltiplos atores e diferentes instrumentos financeiros, mecanismos regulatórios, incentivos”, completou. “O Brasil está em posição privilegiada para financiar o processo de descarbonização.”

“Houve avanço no fluxo financeiro para o desenvolvimento sustentável, mas é necessário o realinhamento e a reorganização do capital para a transição a uma economia de baixo carbono”, diz José Pugas, sócio da JPG, uma das apoiadoras do evento. Segundo ele, é preciso união de esforços e criatividade para construir uma nova estrutura econômica. “Temos grande responsabilidade, como setor financeiro, para fazer essa transição acontecer, e espero que essa discussão leve a um mundo melhor, conectando culturas como China, Brasil e América Latina, não apenas criando competição entre esses países”, disse. Pugas defendeu ainda a urgência de incluir o componente de justiça social. “Não há como pensar a natureza sem pessoas porque não há pessoas sem a natureza”, definiu.

Entre os presentes, esteve o ex-ministro da Fazenda e diretor do Banco Safra, Joaquim Levy, que destacou a necessidade de um mercado de carbono global. “Cada vez me convenço mais de que um mercado de carbono global, saudável e íntegro vai ser uma das principais ferramentas das finanças climáticas”, afirmou Levy.
As próximas atividades para capacitação do setor financeiro da CASI serão promovidas nos mesmos moldes em Hong Kong, em junho, na África e Oriente Médio, ainda em 2024. A CASI tem o objetivo de treinar 100 mil pessoas até 2030, com foco em mercados emergentes e economias em desenvolvimento.
Os vídeos dos dois dias dos eventos podem ser assistidos no canal do Youtube do iCS nestes links:
https://www.youtube.com/watch?v=z8oqX2phfTA
https://www.youtube.com/watch?v=rYlRMtMx_Po

Confira a síntese do que foi debatido:

>> Mercados Globais de Finanças Sustentáveis
As oportunidades para empresas, governos e indivíduos alinharem suas atividades financeiras com as metas previstas nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e promover uma transição para um futuro com baixa emissão de gases de efeito estufa foram temas de debate do primeiro painel. Com foco no papel das finanças sustentáveis para acelerar a descarbonização da economia e o cumprimento das exigências definidas no Acordo de Paris.

>> “Instrumentos Financeiros Sustentáveis – Práticas e Inovações”
As particularidades da América Latina, e do Brasil em especial, no mercado de investimento para projetos e ativos que abordam questões ambientais, como as mudanças climáticas, a perda de biodiversidade e o esgotamento dos recursos naturais foram o foco da segunda sessão do evento. Especialistas traçaram o perfil do setor de investimentos dentro da realidade local e discutiram propostas de como proporcionar recursos para promover projetos sustentáveis com o selo imposto pelas demandas e realidades brasileiras.

>> “Frameworks e políticas para a construção de um ambiente favorável para Finanças Sustentáveis
A elaboração de uma taxonomia com regras e parâmetros que se adequem à realidade brasileira foi debatida na terceira sessão. Com mediação de Ma Jun, o debate abordou entre outras questões da agenda de finanças sustentáveis, quais são as ferramentas que viabilizam e agilizam a transição para uma economia mais verde e mais resiliente. Educação, capacitação, suporte para projetos de longo prazo e uma regulamentação global que respeite as características de cada país/região foram alguns dos temas apontados como essenciais para uma solução multilateral.

>> Reportes de sustentabilidade – desafios, benefícios e soluções
Ao criar uma padronização global de metodologias para mensurar os impactos sociais e ambientais das atividades econômicas, os relatórios de sustentabilidade se apresentam como um dos pilares fundamentais de apoio aos mercados financeiros sustentáveis. Tema da quarta sessão de discussões, os relatórios de sustentabilidade podem criar uma régua única para diversos tipos de organização e podem ser usados para avaliar e mensurar os avanços na transição para a economia de baixo carbono.

>> “Escalando finanças para a transição verde: planos de transição e transição justa”
O financiamento da transição verde vem conquistando, em especial nos últimos dois ou três anos, progressos em todo o mundo, com uma gama de novos serviços inovadores. O painel alertou, no entanto, para a necessidade de um olhar mais atento para as pequenas e médias empresas, muitas vezes provedoras da grande indústria, e que precisam de auxílio para se adequarem às novas demandas e necessidades. Desafios como falta de infraestrutura, capacitação e acesso ao capital só serão superados, de acordo com os debatedores, pela união de todos os atores: setor financeiro, governos e grandes empresas.

>> Conservação e regeneração de biodiversidade
O desenvolvimento de uma bioeconomia pujante, com soluções baseadas na natureza, como a restauração de florestas e a promoção de atividades agropecuárias sustentáveis, é considerado uma das vantagens competitivas de países biodiversos como o Brasil. As oportunidades para desenvolver uma economia de baixo carbono com a conservação da biodiversidade foram debatidas durante o sexto painel.

Fonte: assessoria

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