Alerta para os países emergentes

As economias de países emergentes apresentaram expansão sólida na década de 2000 e sobreviveram até mesmo à crise financeira mundial sem que o crescimento se desintegrasse

Eswar Prasad – professor de economia na Cornell  University e bolsista sênior na Brookings Institution. É coautor, junto  com M. Ayhan Kose, de “Emerging Markets: Resilience and Growth Amid  Global Turmoil” (algo como “Mercados Emergentes: Resiliência e  Crescimento em meio à Confusão Mundial”, em inglês). Copyright: Project  Syndicate 2012-Valor Econômico

Com 2012 a pleno vapor, vale a pena refletir como  dez anos de forte crescimento econômico nos países emergentes levaram  às retumbantes transformações vistas em 2011. Desde os dramáticos  acontecimentos no Oriente Médio até a gigantesca onda de apoio à cruzada  anticorrupção de Anna Hazare na Índia, os líderes dos países emergentes  vêm recebendo mensagem clara das ruas: apenas crescimento econômico não  basta. Os que ignorarem a mensagem o fazem por sua própria conta e  risco.

As economias de países emergentes apresentaram expansão  sólida na década de 2000 e sobreviveram até mesmo à crise financeira  mundial sem que o crescimento se desintegrasse. O espectro do aumento da  corrupção, no entanto, compromete a legitimidade de seus ganhos  econômicos e corrói o apoio às outras reformas necessárias para  sustentar o impulso de seu crescimento.

A corrupção assume muitas  formas, mas nos países emergentes, uma combinação de fatores a converteu  em um câncer que, no fim das contas, acaba derrubando regimes. A  incansável corrupção nas baixas esferas do poder é um grande estorvo  para a população mais pobre em muitos desses países; limita, de fato,  seu acesso a serviços sociais e a funções básicas do governo das quais  muitas vezes dependem para a própria sobrevivência.

Outro tipo de  corrupção é o que envolve o desvio de enormes quantias de dinheiro em  projetos de grande escala. Na Índia, por exemplo, o governo perdeu entre  US$ 30 bilhões e US$ 40 bilhões de uma arrecadação mais do que  necessária quando vendeu o cobiçado espectro de banda larga em leilão  manipulado.

Para as pessoas comuns, a corrupção em grande escala é  menos visível, porque embora as somas envolvidas sejam estarrecedoras,  os custos não são sentidos diretamente como nas negociatas em pequena  escala. A percepção desse tipo da “megacorrupção”, no entanto, mudou, à  medida que o alto crescimento elevou a desigualdade social.

Em  países como China e Índia, a expansão da economia tirou muitas pessoas  da pobreza. Os frutos da globalização e esse crescimento elevado,  entretanto, não foram compartilhados de maneira uniforme – os ricos  tornaram-se super-ricos enquanto uma grande parcela da população  continua muito pobre.

A crescente desigualdade de renda está longe  de ser algo limitado aos mercados emergentes, mas sua combinação com  corrupção escancarada e desigualdade generalizada cria uma mistura  tóxica que vem minando o apoio a reformas que poderiam fortalecer e  consolidar os ganhos econômicos vistos nesses países.

Em muitos  países emergentes, a falta de liberdade política soma-se a essa mistura  inflamável. A combinação de corrupção, desigualdade e repressão política  cria uma enorme pressão e não há canais institucionais para dar-lhe  vazão.

Regimes políticos mais livres, no entanto, não são uma  panaceia. Em uma democracia como a Índia, os que gozam de boas conexões  políticas beneficiam-se do crescimento distorcido, aumentando, portanto,  o ressentimento dos que são relegados. A oportunidade de “expulsar os  canalhas” em cada ciclo eleitoral ajuda a aliviar um pouco a pressão,  mas não resolve os problemas que a produzem.

É difícil prever o  que desencadeia os protestos populares, mas os fatores econômicos são  essenciais. Por exemplo, elevar o preço dos alimentos tende a prejudicar  os mais pobres, especialmente os de regiões urbanas, já que gastam uma  grande parcela de sua renda em alimentação; ao contrário dos  trabalhadores agrícolas, eles não recebem nenhum dos benefícios  decorrentes da alta do preço dos alimentos. Com o crescimento das  populações urbanas, ficará cada vez mais difícil controlar essas  pressões.

Alguns governos reagiram aos recentes acontecimentos com  repressão, restrição às informações, com medidas autoritárias. A China,  por exemplo, impediu a cobertura pela mídia do país dos protestos  egípcios. A Primavera Árabe, contudo, revela a fragilidade dos regimes  repressores que tentam manter sua legitimidade limitando os fluxos de  informação.

A principal lição para os países emergentes mais  dinâmicos é que concentrar-se exclusivamente no crescimento do Produto  Interno Bruto (PIB) pode acabar não sendo bom para a estabilidade  política e econômica. Mesmo com grandes elevações da renda nacional, se  os líderes dos países não distribuírem os benefícios de forma justa,  ficarão vulneráveis ao descontentamento popular. Derrubar a corrupção é  crucial para melhorar o crescimento de longo prazo e manter a  estabilidade social.

Esses países precisam de medidas que os  ajudem a manter os mais pobres fora das armadilhas da pobreza e lhes  deem oportunidades reais de melhorar seu bem-estar econômico. Entre  esses passos estão a ampliação dos mercados financeiros, de forma que as  pessoas tenham mais acesso a crédito e investimentos; o fortalecimento  das redes de segurança social para proteger os mais vulneráveis  economicamente; e a melhora do acesso à educação e de sua qualidade.

As  lições aplicam-se igualmente aos países avançados, que também sofrem  com o aumento da desigualdade e formas sutis de corrupção. Para essas  economias mais ricas, contudo, atualmente a prioridade é recuperar  níveis satisfatórios de crescimento.

Os países emergentes têm uma  oportunidade de ouro de aproveitar os ganhos econômicos e garantir o  crescimento e a estabilidade, se conseguirem resolver problemas  arraigados como o da corrupção. Como mostraram os acontecimentos de  2011, os custos da inação poderiam ser calamitosos. (Tradução de Sabino  Ahumada)

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