Ainda é a economia, estúpido!

Agostinho Vieira- O Globo

A expressão foi criada há 20 anos por James Carville, assessor da campanha de Bill Clinton, e continua atualíssima. Na época, ela serviu para derrotar o discurso patriótico de George Bush, o pai, baseado no fim da Guerra Fria e no sucesso da Guerra do Golfo. O bolso dos americanos gritou I mais alto e elegeu o candidato J democrata. Desta vez, .ela foi vista rondando as salas de reunião do Riocentro e outros eventos de empresários e políticos durante a Rio+20. Não foi usada como slogan, mas aparece nas entrelinhas de vários parágrafos do documento final da conferência.

A lamentável participação da delegação americana, por exemplo, foi toda baseada nisso. Transformar o Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) numa agência da ONU, como a Organização Mundial do Comércio (OMC) e a Organização Mundial da Saúde (OMS), representaria uma ameaça para a economia americana. Já basta perder ações importantes para países menos influentes na OMC. Os EUA são o segundo maior emissor de CO2 do planeta e o maior consumidor de recursos naturais. Uma agência ambiental forte poderia achar que isso é um problema.

O mesmo aconteceu nas discussões sobre oceanos, especialmente no item sobre exploração de recursos em alto-mar. A Europa e os EUA têm recursos e tecnologia para explorar economicamente essas riquezas e não querem regras internacionais atrapalhando isso. Quando o tema é acabar com os subsídios para a indústria pesqueira, com o nobre objetivo de preservar as espécies, quem esperneia são os japoneses. Eles ganham muito dinheiro com isso. Inclusive pescando baleias.

Já o lobby contra o fim dos subsídios para os combustíveis fósseis, cerca de US$ 100 bilhões anualmente, é bem mais democrático. Ele junta a poderosa indústria americana, os árabes e a república bolivariana de Hugo Chávez. Sem contar o Brasil e o Canadá, que apostam nas riquezas do pré-sal e das areias betuminosas, respectivamente. Até a índia tem interesse nisso, pois conta com o carvão barato para levar luz às casas de 400 milhões de pessoas. O j aquecimento global fica para depois.

A China tem uma posição curiosa nesse xadrez econômico-ambiental. Eles são os campeões em emissões de gases de efeito estufa. Ônus do crescimento elevado. Por isso, não aceitam metas obrigatórias de redução e defendem com unhas e dentes as responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Por outro lado, é o país que mais investe em energias limpas. Só no ano passado foram US$ 57 bilhões. Estão apostando que esse será o negócio do futuro e esperam vender patentes e equipamentos. Nada de transferência de tecnologia para país pobre. Negócio é negócio. Certo?

Se o documento aprovado na Rio+20 for posto em prática, e não há nenhuma garantia de que isso aconteça, nos próximos três anos serão discutidos e definidos os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Questões como financiamento, níveis de consumo, transferência de renda e patentes voltam para a mesa sem perspectiva de solução. Esperava-se que a crise mundial levasse os países a criar um novo modelo, mais sustentável. Não foi desta vez: é a economia, estúpido!

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